tag:blogger.com,1999:blog-298833242024-02-07T05:45:20.009-03:00Acheronta Movebo!Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.comBlogger175125tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-87633589422692417322016-05-23T20:16:00.002-03:002016-05-24T00:21:59.617-03:00Não empoderemos Rihanna!: sobre os riscos de entender o significante arbitrariamente<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"> Não é tão polêmico assim, como parece. Começo trazendo Lacan para me justificar e, mais que, isso, me embasar:</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><i><span style="color: #999999;">O que, com efeito, constitui o fundo da vida, é que, para tudo que diz respeito à relação entre os homens e as mulheres, o que chamamos de coletividade, a coisa não vai, e todo mundo fala disto, e uma grande parte de nossa atividade se passa a dizer isto.<o:p></o:p></span></i></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Lacan , Encore, p.46<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgQQUOaNSUrzG5MqjW46YFRFpessL-qcr23Zc0FR5YiPKbDgTxvIVVmXK7XtQmifSncB7uJZtzVrGNkjhWWe88G0C4AnMKoZ6meLBaH4gfv3xk-IXWTSfA3vYW8HfB4S62dHr13/s1600/_85952638_rihannabrownafp.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="179" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgQQUOaNSUrzG5MqjW46YFRFpessL-qcr23Zc0FR5YiPKbDgTxvIVVmXK7XtQmifSncB7uJZtzVrGNkjhWWe88G0C4AnMKoZ6meLBaH4gfv3xk-IXWTSfA3vYW8HfB4S62dHr13/s320/_85952638_rihannabrownafp.jpg" width="320"></a></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br>Em tempos em que palavras como "empoderamento" e "coletividade" são proferidas por todos os cantos, cabe ressaltar que dentro de um discurso específico, esse discurso analítico que alerta sobre a equivocidade da linguagem, para o deslizamento que caracteriza o campo dos significantes, não faz sentido algum falar em coletividade quando se trata de homens e de mulheres, especificamente sobre relações entre ambos os sexos, entendidos aqui como efeitos de um discurso, como posições discursivas.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br>Isso me faz lembrar de uma entrevista que vi com a ótima autora que estuda o feminismo, Camile Paglia, quando ela desconfia de que existe <i>um algo além</i> no discurso de uma vítima de violência. Ela cita o caso de Rihanna, cantora famosa, bem sucedida, representação contemporânea do que "deveria ser uma mulher de sucesso” que se justificou em rede de televisão por ter perdoado seu agressor, seu controverso par, Chris Brown, dizendo apenas que ele precisava de alguém, que ele precisava ser cuidado.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br>Como explicar Rihanna? Acredito que não devemos tentar explicá-la, não devemos nem tentar absolvê-la por tê-lo perdoado, nem vitimizá-la apenas, vamos tentar ficar longe de qualquer resposta apressada, mesmo que hoje em dia isso seja quase impossível.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Como empoderar Rihanna? Como fazê-la a diva de si mesma? Como torná-la alguém liberta dessa relação opressora como alguns poderiam definir sua relação com o antigo namorado? Como enxergar Rihanna nesse caso de completa subserviência ao agressor? <o:p></o:p></span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Penso que devemos ir além da simples e muitas vezes despreocupada menção de termos da moda para que possamos entender "coletividade" e "empoderamento" como aquilo que de fato são: nada mais, nada menos do que significantes, estes que são causadores de efeitos de significado. </span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Sendo assim, coletividade e empoderamento ou seja qual for a palavra, ela não significa nada sozinha. Coletivizar noções e fazê-las caber num lugar que não é capaz de comportar nenhum “ideal” é fazer nada, é ficar batendo a cabeça na parede, ininterruptamente. Coletivizar as mulheres não diz nada sobre A mulher. A correspondência entre o individual e o coletivo é bizarra sob o ponto de vista que trazemos aqui.</span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Partindo do que diz Lacan, é estranho dizer que se pode empoderar a mulher por muitos motivos, um deles seria que dar poder a alguém significa lhes dizer o que fazer, torná-la protagonista de sua própria história, torná-la “multiplicadora de si mesma” – outro dia ouvi isso de uma pessoa, o que me assustou. <o:p></o:p></span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Dar poder a alguém não diz nada sobre entendimento de um discurso que é liame social, dar poder a uma, a duas mulheres, não significa nada porque isso significa desconsiderar as tramas específicas de um discurso que marca lugares próprios para cada homem, para cada mulher. </span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Não se pode dar poder a alguém tentando fixar modelos ou imperativos que são alheios ao que o sujeito é, ou seja, alheio ao que funciona em seu discurso.</span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"> E isso quer dizer que ninguém jamais pode receber uma fórmula pronta, um “como ser” ou um poder que venha de um outro lugar, isso é quase perverso, arrisco. </span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Curioso é que há uma necessidade de “fazer ver” “fazer o outro enxergar”. Não sei se isso é possível, não parece ser, não do ponto de vista psicanalítico, mas esse é somente mais um discurso, como tantos outros que vigoram por aí....logo, nada o torna aparentado ao que possa ser uma “verdade”, pois esta é democrática: a verdade não se mostra toda para ninguém, por isso que a gente tenta tanto explicar, dizer, empoderar...<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Voltando à Rihanna, cabe também pensar o que significa esse “cuidado” do qual Chris Brown não pode prescindir, o que é isso que torna essa mulher tão emocionalmente </span></span><span style="color: #999999; font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 14px; line-height: 13.5pt;"> </span><span style="color: #999999; font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 14px; line-height: 13.5pt;">vulnerável</span><span style="color: #999999; font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 14px; line-height: 13.5pt;"> </span><span style="color: #999999; font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt; line-height: 13.5pt;">a um espancador?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">A quem cabe significar o que existe entre Rihanna e Brown? Ao coletivo? A mim, a você? Aos psicanalistas? Aos feministas? Não, não cabe a ninguém. Os jargões midiáticos da vez podem ser fortes e cheios de impacto social, mas não podem alcançar nenhum lugar além do qual ele realmente pertence: o campo da linguagem.<o:p></o:p></span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div><div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;"><font color="#999999" face="helvetica, sans-serif"><span style="font-size: 14px;">Nada apaga a ideia de que o único lugar em que o significante se presta a ser alistado é o dicionário. No discurso dos sujeitos o significante é convocante, causa efeitos, causa significados polissêmicos. O significante não é pedra, ele é lodo e é feito pra escorregar. Para nos fazer escorregar e com isso revelar a banalidade que nos constitui. </span></font></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;"><br></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">“Coletividade”, “Empoderamento” “Protagonismo”, <i>you name it</i>, são apenas significantes que, sozinhos, não querem dizer absolutamente nada, pois só fazem sentido dentro de um discurso representante de um liame social, essa ligação, esse liame com o outro não é outra coisa que a relação que cada mulher mantém com um homem dentro de uma realidade que também não pode ser outra que não discursiva.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">O problema está justamente encrustado na fácil solução da receita do bolo, em tomar o significante como algo totalmente desencadeado de um discurso, é tornar o significante pedra, quando na verdade ele é líquido, escorradio e por isso, perigoso, pois é na sua queda que podemos pensar em talvez entender certas relações que se fundam em violência, em abusos. Tomar o significante como significado é erro, e desse erro podem nascer as mais terríveis soluções. Ser mulher é ser qualquer coisa dentro de um discurso que só faz sentido para aquela mulher, por isso o significante não é arbitrário, mas, ao contrário disso, é perfeitamente encadeado dentro de uma rede de sentidos que só fazem sentido para uma mulher, eis outro império que cai: o do significado unívoco. O singular jamais será definido pela invasão coletiva, por mais boa vontade que haja entre aqueles que desejam empoderar. Não é tão simples assim.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">Portanto, penso que não vamos conseguir empoderar Rihanna, também não devemos julgar “a mulher sem açúcar” que apanha dia útil e que é alisada em dia santo, tal como Chico a descreveu. E nada disso que estou dizendo significa ser conivente com qualquer violência – se você entendeu isso, leia de novo, sugiro recomeçar a leitura agora. Não seremos nós as testemunhas silentes diante do apedrejamento de Geni. O que estou dizendo tem a marca de um discurso que não ignora o inconsciente.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div class="MsoNormal" style="background: white; line-height: 13.5pt; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "helvetica" , sans-serif; font-size: 10.5pt;"><span style="color: #999999;">A mulher não existe e qualquer tentativa de empoderá-la que ignore o discurso que tece seu lugar em uma relação com o masculino se transforma num redundante fracasso.</span></span></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-47922277293985181642015-11-11T01:23:00.001-02:002015-11-11T01:54:37.049-02:00Vergänglichkeit ou o relato verdadeiro de um péssimo passeio numa paisagem de verão<span style="color: #999999;"><br /></span>
<span style="color: #999999;"><br /></span>
<span style="color: #999999;"><br /></span>
<i><span style="color: #999999;">"Tudo o mais que, de outro modo, ele teria amado e admirado, lhe parecia</span></i><br />
<i><span style="color: #999999;">despojado de valor pela transitoriedade que era o destino de tudo"</span></i><br />
<span style="color: #999999;"><br /></span>
<span style="color: #999999;"><br /></span>
<br />
<div style="text-align: justify;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjwHnSYZkWjYT4D-f_A8SnQgPFi59N3WNIoVUsUM1uZvdyg3DPicDKgDKwEB1qm-c-rb87j3sbtO5vnq5ZgBvNa-OnwUABXLmXu-nwVUOm8khonPWCKqgSCXDSsru649YlLwdyR/s1600/fotoflor.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="200" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjwHnSYZkWjYT4D-f_A8SnQgPFi59N3WNIoVUsUM1uZvdyg3DPicDKgDKwEB1qm-c-rb87j3sbtO5vnq5ZgBvNa-OnwUABXLmXu-nwVUOm8khonPWCKqgSCXDSsru649YlLwdyR/s320/fotoflor.jpg" width="320" /></a><span style="color: #999999;">O passeio de Freud e seus amigos serviu para fazer a humanidade entender sobre luto e sobre perda. O pretexto para a argumentação freudiana foi um episódio ocorrido num dia que se imagina ensolarado e tranquilo ao qual facilmente podemos atrelar imaginariamente as melhores paisagens e os mais ricos vestígios da obra divina, transposta para o que seria a mais maravilhosa das telas, se não fossem as tintas da própria realidade, se não fosse real o azul do céu e, portanto, se não estivéssemos a caminhar sobre a relva verde, quase pedindo-lhe licença a cada passo em busca de novas descobertas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Não, a essa altura não estamos mais imaginando. Peço-lhes, inclusive, que não imaginem mais, imaginar é quase pecado, apenas ouçam o meu relato, com a mesma atenção que ouviram o texto de Freud que continua ecoando em vossos ouvidos, sendo celebrado e reverenciado por tantos outros ouvidos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"> Sei que a autoria célebre torna o texto imortal, mas há que se fazer justiça a quem o originou, quero dizer, há que se intuir a importância das demais personagens só brevemente mencionadas no mais famoso relato que se tem notícia sobre a transitoriedade das coisas em tempos de guerra. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">E digo mais: personagens só brevemente mencionadas e com o único propósito de validar os argumentos e desdobramentos teóricos daquele que veio a se tornar o cientista do século, aquele que roubou o fogo de Zeus e lho deu aos homens, a este, todas as reverências; aos outros, o esquecimento mais cruel, à descoberta prometeica, todos os louros, à realidade, as sombras do inferno. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Pois eis que chego a meu intento. Até agora não entendo, verdadeiramente, como a curiosidade humana não buscou saber mais sobre mim e sobre "o jovem poeta já famoso" (FREUD, 1916, p. 186). </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Somos como sombras dispostas exatamente onde <i>herr professor</i> nos colocou, tal como marionetes, a tornar seu relato mais belo, mais profundo, mais verossímil. E quanto a nós, o que nós temos a dizer sobre esse dia? Alguém já indagou sobre quem somos?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Aguço a curiosidade do leitor atento no intuito de saber se, de fato, existe qualquer traço de incômodo, qualquer fagulha de interesse em saber sobre nós, os outros, os esquecidos, as marionetes de Freud, aqueles seres quase anônimos que foram um dia acompanhar o grande homem em um passeio despretensioso em uma "rica paisagem num dia de verão"(FREUD, 1916, p. 186). </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Sobre nós pouco foi dito, a não ser que éramos " um jovem poeta e "um amigo taciturno". Creio não ser segredo a identidade do então jovem poeta "já famoso" , o homem sensível inspirou o texto do homem da ciência - e todos nós sabemos o quanto a invenção freudiana deve às almas sensíveis, aos caracteres mais nobres que,de tão nobres, por vezes não suportam a crueza da vida e suas atribulações.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Sim, todo leitor atual sabe o quanto <i>herr professor</i> foi beber em homens como Goethe, como Dostoievsky, como Jensen, nobres e distintos cavalheiros que possuíam em comum a característica de se admirarem com as coisas terrenas e delas intuir as coisas etéreas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">É inquestionável, é mesmo impensável a descoberta freudiana sem os poetas, sem os músicos, sem, enfim, as almas mais elevadas que a existência já conheceu. E Rilke, esse poderia cobrar seus préstimos a hora que assim desejasse, era ele o jovem e já famoso poeta, isso não é segredo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Mas, e quanto ao outro personagem, o outro a errar pelas pradarias? E o que foi feito daquela personagem obscura somente reconhecida no texto famoso como "amigo taciturno"?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Eis quem vos fala. Sou eu o amigo "taciturno", não tendo habilidade para a poesia, sempre gostei das coisas mundanas. Confesso que nunca fui pessoa das letras, nunca me comovi com os dramas santos, e nunca acreditei verdadeiramente em uma existência superior, também o fazer científico nunca me atraiu e a isso devo o fato de ter tido uma infância em que não me foi dado o direito à curiosidade comum às crianças, especialmente às crianças do sexo masculino - se me mostrei alguma vez curioso em relação a algum relógio-cuco, ou tive a mais pura intenção de destruir um brinquedo para saber sobre seu mecanismo disso logo foi demovido pela minha mãe e por suas engenhosas técnicas de me infligir os castigos mais cruéis, foi por amor à vida que desisti da curiosidade e essas experiências infantis me fizeram alheio a qualquer interesse que se tornasse científico - minha alma preferia manter o corpo livre de beliscões e pontapés.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Se nunca fui aquilo que podem chamar de caráter alegre, fanfarrão, também não foi por causa de nenhuma disposição interna que lembre qualquer sensibilidade, qualquer volubilidade romântica, tão comum ao <i>zeitgest</i> ao qual pertenci eu e meus amigos, hoje todos tão mortos como eu. Nunca fui alegre, mas também não acho que isso se devesse a qualquer coisa byroniana correndo em minhas veias. Também não era triste, era apenas indiferente a qualquer esforço humano para rir ou chorar.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Sou sim, "o amigo taciturno" a caminhar pelas pradarias e no dia fatídico de verão eu tinha ao meu lado direito o homem das ciências, o distinto professor fadado ao sucesso, e junto a meu lado esquerdo vinha o jovem poeta famoso e promissor. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">O que seria eu, o que poderia ser eu ao lado de tanto brilhantismo? Apenas isso, o amigo taciturno que nem direito a maiores menções teve no texto que poder-me-ia ter tornado célebre, tanto ou mais que meus amigos. Mas isso não houve, e morri no anonimato, da mesma forma que nasci, sendo aquele passeio a única situação da vida em que estive próximo a qualquer sombra de gênio, no caso, dois.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Digo-lhes que não era de todo um indigno de reconhecimento, escrevia algumas coisas, não muitas, mas nada que soasse poético ou sensível, nada que apontasse o caminho do céu ou que indicasse os meandros dos acherontes, por isso morri como vivi, no mais completo e compreensível anonimato. me faltou interesse para ir além e para me tornar qualquer coisa de vulto.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">O que escrevo agora, em tom de carta além túmulo a la Brás Cubas, é o meu direito inalienável de dar a versão dos fatos. Ei-los, sem as tintas coloridas do poeta, sem o rigor empírico do cientista. Apresento-lhes o meu relato, o meu <i>Verganglichkeit!</i></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Ouça quem quiser, não será depois de morto que irão me laurear com o Goethe, faço isso pelo simples direito de fazê-lo, visto que a morte não me impôs maior silêncio do que aquele que gozei por toda a minha existência. Serei breve, qualquer prolixidade me irrita.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Pois bem, disse-nos Freud que o jovem e já famoso poeta se compadecia com as flores que logo morreriam, em seus arroubos sensíveis pensava mesmo que de nada adiantaria a mais linda rosa florescer como as tantas que testemunhamos naquele dia se o seu destino seria a inevitável morte. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Penso que Freud construiu sua argumentação lógica a partir daí, então toda a teorização acerca do luto e do que perdemos, tudo sobre a tendência da nossa <i>psychê</i> a se afastar da dor, tudo ali está, naquelas linhas em que o magnânimo cientista nos utilizou, a mim e ao meu amigo sofredor, como meras testemunhas complementares para aquele passeio. Não me diverti nesse papel, confesso.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">A partir das lamúrias do poeta se construiu uma teoria sobre luto e sobre perda - e quão conveniente! </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Mas, o que pensou o "amigo taciturno"? O amigo não poderia pensar outra coisa, eu era calado, alguns poderiam dizer que carrancudo, sofria de uma espécie de tédio em relação a tudo que não fosse relacionado aos pequenos prazeres da vida: comer, beber e dormir. Eu não era taciturno por vocação.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Era ocupado entre esses três deveres que vivia a vida, e confesso que somente depois de muito esforço da parte do eminente professor, que me dispus a calçar as botas e a ir ver borboletas e "pássaros gorjeando livremente". Assim me foi feito o convite, e foi num tom convocatório que Freud o fez: "Vamos aproveitar esse belo dia de verão!" - disse-me, com exclamação e tudo o mais que soasse convidativo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Ao ouvir aquela frase ser proferida virei para o lado e recostei a cabeça no travesseiro, pensei em dispensar o meu amigo cientista, e entre um bocejo e outro, fui convencido de que o passeio seria curto e apenas um pretexto para conversarmos sobre questões importantes, como as que se provaram de fato urgentes - estávamos vivendo em um período estranho em que tudo soava bélico e ameaçador. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Nem isso me animava, mas um pouco de socialização não me era de um todo desagradável. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Foi apenas no caminho para os bosques que Freud me disse que Rilke iria nos acompanhar - e eu, sabendo antecipadamente desse fato não iria me dignar a calçar as botas, sequer levantaria da cama, pois sabia que o que me aguardaria seria uma série de lamentações e soluços infindáveis, o que, de fato, ocorreu.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Se Freud a tudo analisava e rascunhava em seu caderno a que poucos podiam ter acesso - e eu não era um deles, Rilke se deixava comover pela mínima mariposa que cruzasse com seu olhar, o vento parecia exercer sobre aquela atormentada alma uma espécie de fascínio e tudo parecia caber em suas rimas e estrofes. Quanto a mim...eu estava cansado, mais "taciturno do que nunca", Freud diria, mas, na verdade, mais desejoso do que nunca que aquele dia terminasse. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Da pena de Freud podemos ler:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<i><span style="color: #999999;"> "O poeta admirava a beleza do cenário que nos rodeava, porém não se alegrava</span></i></div>
<div style="text-align: justify;">
<i><span style="color: #999999;">com ela. Perturbava-o o pensamento de que toda aquela beleza estava condenada</span></i></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><i>à extinção, pois desapareceria no inverno, e assim também toda a beleza humana e tudo de belo e nobre que os homens criaram ou poderiam criar"</i> (FREUD, 1916, p.186).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Chamo atenção ao jovem leitor para o fato de que Freud nunca foi merecedor de um prêmio científico por sua obra, embora tenha sido merecedor de uma prêmio por sua...Literatura! Daí não precisa ser um gênio para deduzir que a seara a qual pertencia <i>herr professor</i> era, na verdade, o domínio dos imortais, dos homens das letras, e eu não sei porque insistia em fazer ciência.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"> Por algum motivo alheio a seus maiores desejos, Freud não convenceu por sua ciência, não convenceu o mundo acadêmico, mas nem por isso foi menos célebre.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Sobre o sensível poeta, todos já sabem, o que me faz pensar que eu sou a verdadeira sombra nesse passeio, dos três, o menos célebre, o menos capaz - talvez - mas uma coisa talvez não possam me tirar agora: a sinceridade e a objetividade com a qual narro os fatos - isso falta à pena dos meus amigos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Já estando eu morto há muito tempo, não tenho interesse em reconhecimento póstumo, nem nisso acredito. Como alguém que nada tem a perder, tendo já perdido o fundamental, tenho o único compromisso com a realidade e com a verdade dos fatos, sou um embaixador da Verdade. E nela vou me fiar para que saibam um pouco sobre aquele dia, aquele passeio, meus amigos e, sobre mim.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">A bem da verdade, o poeta não admirava a beleza no cenário de maneira inerte, ao contrário do que pensava Freud, ele se alegrava sim, apesar da transitoriedade das flores, das plantas, dos pássaros a nos visitar de quando em quando, o que Rilke mais fazia era se admirar e exaltar a natureza, numa alegria quase incontida, ouso dizer que uma alegria bizarra que logo se transformava em lamúria e em choro - sobre essas terríveis oscilações de humor do poeta não ficamos sabendo por meio do relato oficial.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Se àquela época já houvesse tal coisa como uma Neurociência, diria que Rilke sofria de transtorno bipolar: seus arroubos de felicidade histérica me irritavam em elevado grau e eu já me sentia compelido a me tornar cada vez mais "taciturno", e , repito, não por uma disposição romântica qualquer, mas pela simples intenção de me retirar daquele lugar e não ouvir mais um ser tão volúvel como aquele a quem a mesma cotovia poderia fazer rolar na grama numa espécie de alegria pueril para, logo em seguida, provocar os maiores soluços que somente alguém que sofre em demasia poderia experimentar - era um louco, um delirante e estar em sua companhia seria a maior das torturas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Demovê-lo da ideia de perseguir passarinhos e de cumprimentar o sol era impossível, tão impossível como conter suas lágrimas, o seu convulsionar diante do despetalar de uma margarida me provocou a mais profunda ira e isso foi a gota d'água. Vê-lo soluçar e a repetir blasfêmias diante da flor despetalada me fez saber que àquele lugar eu não pertencia, e foi assim que o passeio acabou: fui embora para não mais me atormentar diante de um patético ser infantil e de um inerte e frio cientista.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Agora sabemos que fidelidade aos fatos nunca fora o forte de Freud. O homem nasceu para a Literatura, mesmo que tenha insistido na Ciência.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Poderia lhes dar toda uma nova versão, mais objetiva e fiel aos fatos do que as do meu amigo cientista, mas por falta de interesse não o faço, quero me recolher logo ao sono sepulcral e, de fato, nada lucrarei com isso. Ou irão publicar a minha versão dos fatos ocorridos naquela paisagem de verão? Irão, por acaso, apagar dos registros o tal <i>Vergänglichkeit </i>freudiano para dar razão ao meu relato? Inocente não sou, e não me interesso em fazer de Freud meu rival, sem dúvida ele merece repousar em seu leito célebre, deixem-me aqui no esquecimento que sofro menos ataques - ninguém zomba de um defundo desconhecido.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Com isso, limito-me a dizer o meu lado, apenas. Estava eu taciturno pensando em tudo que deixara na cidade e que não poderia rever naquele dia, naquela ocasião?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">O espetáculo patético de Rilke me irritava tanto ou mais do que o calor infernal que fazia naquele dia. Os rumores de guerra me tiravam o sono, apesar de sono ser algo essencial em minha vida, pois nunca fugi ao encontro de Morfeu. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Toda aquela ideia de passear, sob aquelas condições climáticas me tornavam cada vez mais impaciente e o único motivo disso era uma mistura de tédio, irritação (calor insuportável somado à histeria alheia) medo diante da ameaça da guerra que viria a destruir tudo que a civilização havia construído, enfim, aquele não seria um bom dia para passear. No entanto, esse turbilhão de sentimentos guardava para mim, pois nunca fui homem de transparecer os sentimentos através da face, isso deixo para Rilke.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Não estava taciturno por conta da flor que nascia para morrer, não estava encastelado em mim por conta de qualquer vocação para o <i>Sturm und Drang</i>, tédio era meu nome, e eu não desejaria outra coisa do que fugir daquele lugar bucólico que me dava ânsia de vômito.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Da transitoriedade nada penso porque não me foi dado o direito de pensar, ao menos no texto de Freud. Se Rilke não se encantava totalmente com a flor que brotava e com o espetáculo do sol se pondo, eu de mim sei apenas que o que muitos julgavam como ensimesmamento eu julgava por preguiça, talvez a minha mais verdadeira vocação.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Cansado de não fazer nada eu estava, indisposto me tornei a cada vez que um raio de sol penetrava os poros da minha pele tão fustigada pelos pequenos prazeres aos quais me dedicava com afinco. A companhia de Freud já não me era agradável naquele dia, imaginem a de um bebê chorão a questionar sobre a beleza, sobre a efemeridade das coisas que nasceram para morrer. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Se ainda tenho direito a algo dizer, digo que não tenho problemas com o luto e com a substituição de objetos libidinais - para usar o jargão do célebre professor. Acho bom que tudo que vive um dia morra, pois assim os mesmos pássaros não nos irritariam todos os dias, as mesmas flores nasceriam em nossos quintais, sem surpresa, sem novidade. Tudo que é vivo morre, e da morte só restará o pó. Se a guerra nos destruiu foi com o propósito de nos fazer deter, e se a ela não podemos resistir, melhor mesmo será sucumbir. Não, não tenho grandes questões com a morte, e a beleza sempre me soou enfadonha,a feiura, com seus espetáculos e bizarrices é genial por quase tocar o impossível e é por isso que o feio sempre me atraiu mais do que a beleza que fazia meu amigo poeta suspirar e chorar, e chorar...</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Não é necessário chorar porque o choro nada resolveu na História da humanidade, porque não foi chorando que o homem se viu na obrigação de inventar a roda, há a necessidade e isso basta para que se construa algo diante do que já morreu. Chorar o morto não o traz de volta; a flor que morre hoje já vai tarde.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Se Freud dizia que depois da guerra haveria de nascer uma nova nação mais forte, mais sólida, eu mesmo penso que se a destruição não fosse impulso suficiente para nos manter de pé, que nos deixasse viver entre as sombras, porque, certamente não seríamos um povo digno de viver, portanto, aos mais fortes, a vitória, ao vencedor, as batatas, meu amigo de além túmulo diria.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Sendo assim, encerro por aqui minhas considerações, sobre o episódio romanticamente narrado por Freud, dizendo-lhes uma única coisa: tudo que é vivo morre e ainda bem, pois a morte me parece muito mais interessante do que aqueles odiosos momentos que vivi entre dois amigos, um patético demais para ser capaz de narrar com clareza o que se passou, outro pretensioso demais para entender que a pérola das coisas mora na concha da objetividade e nada deve ao subjetivismo maldito.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #999999;">Para mim, aquele foi apenas um dia terrivelmente quente em que tive a malograda ideia de aceitar um convite para passear.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-2867744878743681372015-06-29T02:37:00.001-03:002015-06-29T03:39:11.787-03:0012 provas inquestionáveis de que Los Hermanos foram influenciados pela Psicanálise<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace;">Q</span><span style="color: #666666; font-family: inherit;">uem é fã de Los Hermanos
certamente se identifica muito com as letras da banda. Segundo Maria Ribeiro,
diretora do documentário “Esse é só o começo do fim das nossas vidas” (2014), a
banda foi responsável por espalhar um discurso amoroso entre as pessoas, há
toda uma <i>vibe</i> “all you need is love”
nas músicas dos quatro rapazes de...enfim, dos quatro rapazes barbudos e isso
não poderia passar despercebido.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Há um fato desconhecido por
muitos e aqui o revelo para quem não saiba: há uma grande inspiração por trás
das letras de grande repercussão da banda -
e não estamos falando de Beatles.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Nesse momento alguém poderá se remeter à
figura mítica de Anna Júlia, figura que se tornou conhecida em todo território
nacional por volta dos já longínquos anos 2000. Engana-se, caro leitor e amante
de Los Hermanos. Não é Anna Júlia, nem Aline, nem Bárbara, nem Melissa, não é
nenhuma dessas.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjBWrmfzoS69gy9eiKU5twVoskDWm_lz21ctMViE2epcrfoPkqTOQwv-W8u9EnoPz2VfC2UNiiZV9V535mFu0GAyAUjgSbpoybhqpzThNt3Q6K5p0Fqt8_SUm_W2j4LB8Zyb7nO/s1600/4d4fec1a49dc4.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><span style="font-family: inherit;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjBWrmfzoS69gy9eiKU5twVoskDWm_lz21ctMViE2epcrfoPkqTOQwv-W8u9EnoPz2VfC2UNiiZV9V535mFu0GAyAUjgSbpoybhqpzThNt3Q6K5p0Fqt8_SUm_W2j4LB8Zyb7nO/s1600/4d4fec1a49dc4.jpg" /></span></a><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">A grande inspiração de Camelo
e Amarante em suas composições é o discurso psicanalítico. Pasme você.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se você ignorava o fato da
dupla mais famosa da <i>indie music</i>
brasileira ter compartilhado suas mazelas com analistas, jorrado lágrimas
sofridas em tantos divãs por aí, acompanhe atento algumas provas cabais que não
vão deixar dúvidas de que as letras da banda têm sim muito de Psicanálise, sobretudo
no que tange aos desenvolvimentos freudianos e lacanianos. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">As pistas estão em muitas das
letras e talvez o querido leitor, tomado pelo arrebatamento típico de quem é
fã, não tenha percebido o recado nas linhas e nas entrelinhas, pois muito
tomado estava de um afeto indomável: A peste freudiana estava à solta e Camelo
e Amarante foram responsáveis por traduzi-la em música, nos seus acordes
chorosos, e até mesmo nas melodias mais bonitas, há um pouco de castração, sim,
inevitalmente. Mas há um alento: somos todos falasser, somos seres de
linguagem, e que bom que existe a música! <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se você não está convencido
disso, duas palavras talvez te tragam alguma iluminação: Cara estranho. Não há
retrato mais digno da castração do que nessa composição que narra uma pessoa
desalojada em seu ser, desassossegada em seu corpo-carne à mercê do gozo
alheio. Cara estranho é sujeito castrado, e Miller concordaria com isso (Vale
dizer que também o tal “Cara valente” é tão castrado quanto, mas talvez, por
encenar tão bem possuir o falo, possa parecer um homem mais viril, na verdade,
o cara valente é o mesmo cara estranho).<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Nesse momento talvez você
esteja cantarolando as canções em sua mente, e quem sabe até concorde comigo.
Não se tratando do caso, trago mais algumas evidências que esclarecem o
argumento que venho sustentando até então: rolou muito divã e a <i>indie</i> music deve muito à Psicanálise. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Iniciemos pelo começo de tudo,
com a famosa <i>Traumdeutung</i> lançada ao
mundo em 1900. Poucos devem lembrar de algo anterior ao famigerado sétimo
capítulo desta bíblia psicanalítica, mas cabe aqui uma alusão ao prólogo tirada
de “A divina Comédia”: “<i>Flectere si
nequeo Superos, Acheronta movebo</i>”, que nada mais significa do que “Se não
posso comover os deuses de cima, moverei o Acheronte”.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">À
frente de tudo e de todos, Freud entendia que havia um sentido no sonho que
precisava ser descoberto, e isso era polêmico, era necessária uma dose de
coragem para falar de tal assunto devido ao </span><i style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">zeitgest</i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">
da época, Freud mexeu e remexeu o Acheronte e lá achou muita coisa que falava à
alma e que hoje vemos musicada.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Tal
como uma escrita hieroglífica, o sonho se mostra confuso e desconexo, cabendo
ao analisante amarrar os fios que podem fazer da experiência onírica um
relato inteligível. Como Freud já dizia que os poetas e artistas o precederam
na descoberta do inconsciente, deixá-los-ei apenas com as sábias palavras
“loshermânicas”. Seguem minhas provas, são apenas doze, e a leitura do que vem
abaixo requer coragem e uma dose de empenho:</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 18.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 18.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(1)</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 18.0pt; text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“[...]O
que é um sonho ruim,<br />
E o que é um sonho bom.<br />
Que diferença? a vida é igual,<br />
assim e eu não sei<br />
Eu não sei...Quem bate aí?<br />
Se é pra eu te ver então deixa eu dormir.”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Como se nota facilmente, “Os Pássaros” parece relatar a
confusão do sonhado diante do sonhador, a pérola virgem na ostra do mar
psicanalítico. A confusão, o pesadelo, a realização do desejo parecem tomar
conta de Amarante – será que não podemos notar em sua voz esse mesmo tom
perdido, angustiado? <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Conte, amigo, conte as vezes em que se nota nas composições
do autor o mesmo tom desconsolado - e frequentemente blasé – restos de
imaginário não analisado? <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Dificuldade em remexer o próprio <i>Acheronte</i>, Amarante? “Não sei mais e é um sonho bom ou ruim, sei
apenas que isso fala de mim” – poderia complementar Amarante (inclusive, há
rumores que essa parte da letra foi censurada, como uma espécie de censura
onírica, jamais saberemos, mas já podemos antecipar aí um trabalhinho que sem
dúvida foi executado com a ajuda dos nossos velhos conhecidos mecanismos
“deslocamento” e “condensação”, não sejamos tolos, todos vocês já devem saber
disso...)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Não sabemos de fato se a letra
passou pela censura onírica, podemos imaginar, pelo tom de desencanto e
dúvida que há uma elaboração nesse material, estamos diante do discurso
manifesto que não lembra mais o sonho sonhado; eu poderia apostar que é fruto
dos percalços que um analisante encontra em seu percurso...</span></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;">O desencanto pela
vida, o não saber, e, por fim, a certeza/clichê freudiana: que em sonhos poder-se-á
realizar o desejo por tanto tempo acalentado: a musa de Amarante aparece em
seus sonhos, então, o melhor momento será mesmo a hora de dormir. <o:p></o:p></span></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se isso não for uma licença
poética da célebre frase freudiana “O sono é o guardião do sonho” eu não sei
mais o que é. <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se você tem alguma dúvida,
peço que prossiga nessa leitura:</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(2)</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpFirst">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“Como
pode alguém sonhar<br />
O que é impossível saber”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Diante de tão impactante lição que a
canção psicanalítica “O vento” nos traz, precisei reparti-la em dois segmentos,
para melhor fundamentar meus argumentos. Sinta o choque, e a presença viva de
Freud no trecho acima referido:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"> “Como alguém pode sonhar o que é impossível
saber”.<o:p></o:p></span></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Fico
estupefata e creio que também o <i>indie </i>leitor
ficará ao analisar essa frase com lentes de aumento. Veja se não há um quê de <i>Traumdeutung </i>novamente? Vejo, inclusive,
menções à Lacan, nesse pequeno, porém tão profundo trecho poético. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se
estamos já tão acostumados com a virada cartesiana que Lacan faz ao promover o
clichezão “sou aonde não me penso”, podemos também nos lembrar do tão famoso “o
sujeito não é senhor em sua própria casa” – e Tania Rivera ainda diria não
saber nem se o sujeito tem casa. </span></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;">Ora, se o sujeito tem casa ou não, não nos é
importante nesse momento, pense apenas nessa pérola que promove o
antagonismo entre o que se sonha <i>versus</i> o que se sabe. <o:p></o:p></span></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Los
Hermanos já parece deixar clara a influência psicanalítica ao fazer isso, ao
nos colocar diante desse antagonismo que ilustra o que é a Psicanálise em geral.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Sonho
aonde não me penso, portanto, sonho o impossível de ser sabido, estamos falando
de lógicas diferentes, portanto, isso já nos levaria, de graça, à Lacan e toda a noção que está implicada na Psicanálise: há um saber inconsciente, um saber não sabido, disso Amarante já sabe há tempos.</span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Perceba
a genialidade da banda ao trazer esses conceitos tão profundos para a simplicidade
da canção. Lembre-se sempre que o sonho é a loucura do homem são.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">*
Bônus: “Eu sei que ainda vou voltar, mas eu quem será” (O velho e o moço)<br />
<!--[if !supportLineBreakNewLine]--><br />
<!--[endif]--><o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(3)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“Não
te dizer o que eu penso<br />
Já é pensar em dizer”<br />
[...]<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpLast">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Sinto
que é como sonhar<br />
Que o esforço pra lembrar<br />
É a vontade de esquecer”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"> Está ficando chato, não é verdade? Toda essa preocupação
de Amarante com o conteúdo onírico, me parece claro como um dia de sol que essa
canção foi pensada – e quem sabe até composta – em um divã. Amarante aqui faz
novamente alusão à divergência entre desejo e o querer consciente, porém, se
ainda não se tornou claro o suficiente, à guisa de compreensão, didaticamente
explicarei:<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"> Esforça-se para lembrar (consciente), porém há
algo que se opõe a isso: há uma vontade de esquecer (mecanismo inconsciente).<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"> Vejamos aí outra coisa ou vemos mesmo o <i>Verdrängung </i>freudiano? A vontade de
esquecer, Amarante, diga logo, nada mais é do que o mecanismo de recalcamento,
que sabemos que não é necessariamente o mesmo que esquecer. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Todo vivente que assistiu ao
menos uma aula de Psicanálise na faculdade saberá que existe uma grande
diferença entre recalcamento e esquecido. Amarante apenas nos revela que existe
um jogo de opostos: ora se esforça para lembrar, ora se entrega ao
recalcamento. Cena primária, lembranças infantis , o caso Emma e a loja de
roupas (presente na carta 52 e no Projeto de 1895). <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Todos nós já estamos cientes
de que as lembranças encobridoras tomam o lugar de algo maior,
infantil e de origem sexual que fora convenientemente recalcado. As lembranças
foram postas aí porque há algo recalcado. <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Em palavras mais rasteiras: a
lembrança encobridora é o esforço para lembrar; a vontade de esquecer é o
mecanismo do recalcamento operando sobre o material mais antigo e, portanto,
mais revelador do inconsciente. Gostaria de saber o sexual traumático de Amarante,
e por que tanto apelo ao mundo onírico...<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"> (4)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpFirst">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“De
onde vem a calma daquele cara?<br />
Ele não sabe ser melhor, viu?<br />
Como não entende de ser valente?<br />
Ele não sabe ser mais viril<br />
Ele não sabe não, viu?” <o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se não
me engano esta letra é de Camelo, uma criatura que, por suas letras, podemos
pensar que vive às voltas com a castração. Aceitá-la, negá-la, ignorá-la? Tudo
isso parece ecoar na cabeça do exímio compositor que, perdido diante da barra
originária, entrega-se às suas canções. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Vejamos
em “De onde vem a calma” o sujeito castrado e barrado diante de seu gozo
quimérico, detido em seu desejo. O que resta a esse cara cuja angústia de
castração tomou conta, a calma? <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Recomendo
um retorno à Freud, tal como o fez Lacan, para que possamos analisar melhor
essa canção. Um sujeito castrado diante de um mundo hostil; não lhe sobrou
dignidade, não lhe sobrou muita coisa, porém, para aquele que irá agora ter acesso
à música completa, lhe digo que há esperança no que Camelo escreve, pois apesar
do mundo ser hostil, o sujeito parece não desistir, nem ceder.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Vemos
aí uma esperança de reaver a Coisa freudiana, <i>Das ding</i> reencontrada? Gozo não mais interditado?
Mamãe? Sim! O sujeito, que não é viril (Quer algo mais claro que isso para
chamar de desfalicizado?) irá, um dia, ser coroado rei de si mesmo – Cai o
pano, lembra uma tragédia, hein? <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Recuperar
o trono, se apossar de mamãe, é isso que você quer nos dizer, Camelo? Recuperar
mamãe depois de ter matado papai? <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Ser
coroado rei de si não seria uma óbvia e ululante alusão à <i>Oedipux rex</i>? Deixo essa com você...<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(5)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">“Hoje
estou tão sozinho<br />
Não sei mas o que fazer<br />
A minha vida se acabou<br />
Você se foi e agora não sei mais”<br />
<!--[if !supportLineBreakNewLine]--><br />
<!--[endif]--></span></i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(6) <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><i>“</i><span style="background: white;">Faz tanta falta o teu amor...</span><br />
<span style="background: white;">Te esperar...</span><br />
<span style="background: white;">Não sei viver</span><br />
<span style="background: white;">Sem te ter não dá mais pra ser...</span><br />
<span style="background: white;">Assim”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(7)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<i><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“<span style="background: white;">Deus por
onde você foi?</span><br />
<span style="background: white;">Cansei de procurar</span><br />
<span style="background: white;">Não posso mais te dar o pouco que sobrou</span><br />
<span style="background: white;">Eu tinha algum amor</span><br />
<span style="background: white;">Eu era bem melhor</span><br />
<span style="background: white;">Mas tudo deu um nó</span><br />
<span style="background: white;">e a vida se perdeu</span><br />
<span style="background: white;">Se existe Deus em agonia</span><br />
<span style="background: white;">manda essa cavalaria</span><br />
<span style="background: white;">que hoje a fé me abandonou”</span><br />
<br />
<!--[if !supportLineBreakNewLine]--><br />
<!--[endif]--><o:p></o:p></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Estamos agora diante de três canções que
querem nos dizer algo especial: o que “Tão Sozinho”, “O pouco que sobrou” e
“Quem sabe” têm em comum? O leitor desavisado diria “Sofrência”. Porém quero
que você vá além de modismos musicais. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Para
acompanhar a genialidade de Amarante/Camelo eu só sugiro ao <i>indie</i> leitor que recorra à letra
freudiana mais uma vez, pegue lá em seu armário o volume XIV da edição
Standard e busque o texto de 1915 chamado “Luto e Melancolia”.</span></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="color: #666666; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Seu
esforço será recompensado, pois nas primeiras laudas encontrarás o que foi
dito, de formas diversas, nas três músicas. Diz Freud: “Os traços mentais
distintivos da melancolia são um desânimo profundamente penoso, a cessação de
interesse pelo mundo externo, a perda da capacidade de amar, a inibição de toda
e qualquer atividade, e uma diminuição dos sentimentos de autoestima” (Freud,
1996/1917[1915], p.250).</span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Sobre
o luto, Freud nos ensina: “O luto profundo, a reação à perda de alguém – a
mesma perda da capacidade de adotar um novo objeto de amor (o que significa
substituí-lo) e o mesmo afastamento de toda e qualquer atividade que não seja
ligada a pensamentos sobre ele” (Freud, 1996/1917[1915], p.250).<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se
você ficou confuso e não sabe diferenciar se Amarante e Camelo estão falando de
Luto ou Melancolia, dou-lhe novamente a palavra de Freud: “No luto, é o mundo
que se torna pobre e vazio; na melancolia, é o próprio ego” (Freud,
1996/1917[1915], p.251).<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpLast">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Quando alguém diz que não sabe
viver, que a fé o abandonou, estamos tratando aqui de um desinteresse total
pelo mundo, não porque o mundo é vazio, mas o ego que foi apequenado,
esvaziado. <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">O trecho “eu era bem melhor”
nada mais é do que a prova cabal de que há um sentimento forte de baixa autoestima
e isso tudo está no ego, o mundo está lá, eu apenas não tenho força porque já
fui bem melhor, num outro tempo, quando tinha um amor – diria o restante da
letra, mas nós já sabemos do que se trata. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Canções melancólicas que
envolvem egos fragilizados, isso é mais do que dizer “Sofrência”, não é
verdade?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Nas canções de “sofrência”
existe algo relacionado ao corpo como palco do sintoma; há um apelo ao álcool
para fazer frente a um sofrimento ou a uma situação penosa - é puro Lacan do Real.</span></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"> Vemos aí a toxicomania
e a pulsão de morte enlaçadas, basicamente o sujeito goza em seu corpo e busca
aplacar o sofrimento se entregando a subterfúgios. <o:p></o:p></span></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Em Los Hermanos é a frustração
sóbria que está presente, é o aguentar a frustração e a ferida narcísica, sem
álcool, sem nada. Haja divã, haja lencinho de papel.</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%; text-indent: 35.4pt;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%; text-indent: 35.4pt;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(8)</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%; text-indent: 35.4pt;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“Pois
eu, eu só penso em você</span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Já não sei mais por que</span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Em ti eu consigo encontrar</span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Um caminho, um motivo, um lugar</span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Pra eu poder repousar meu amor”</span></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpFirst">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpLast" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Aqui vemos uma
bela oportunidade de anunciar como Los Hermanos fugiram do lugar comum, pois ao
conceber “Fingi na hora rir”, os compositores foram muito além da letra
“água-com açúcar”, a melodia aprazível, que agrada aos ouvidos e que deve ter
sido tema de muitos romances, revela algo muito mais profundo e de
inspiração psicanalítica. Vamos subir um degrau no nível de dificuldade agora.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpLast" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Em Lacan, sabemos que há todo um jogo encenado entre as
posições masculina e feminina, um jogo intermediado pelo falo, que não é o
pênis, mas sim, esse objeto imponente e majestoso, revestido de grande poder
social mas que é totalmente quimérico. <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Camelo encontra "um caminho,
um motivo, um lugar”, e poderíamos dizer...”Um falo”? Se você duvida, basta abrir
em qualquer página de “O Seminário livro 20” e verá que tudo
não passa de uma falácia, um engodo: a posição masculina acha estar na posição
feminina o falo que lhe falta e que supõe completá-lo: O feminino <i>É</i> o falo. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(9)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“Ouvi dizer<br />
Que o teu olhar ao ver a flor<br />
Não sei por que<br />
Achou ser de um outro rapaz<br />
Foi capaz de se entregar<br />
Eu fiz de tudo pra ganhar você pra mim<br />
Mas mesmo assim”<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Se está me acompanhando e já
está quase convencido de que as letras de Los Hermanos foram escritas atrás das
páginas dos seminários de Lacan, eu só tenho que tornar isso cada vez mais evidente, com
esse belíssimo argumento em favor do que foi dito em relação ao falo e à
posição masculina diante do feminino: “A flor”.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Digo mais: desafio o leitor a
substituir a palavra “flor” por “falo”. Há fortes rumores que as palavras foram
trocadas propositalmente, e como as duas palavras servem como significantes
relacionados ao sexual, deixaram “flor” para parecer poético e menos polêmico.
A flor é, descaradamente, uma ode ao falo sempre buscado e nunca encontrado por ambas as posições. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;">Também em "A flor" ingressamos
no enigma feminino e sua busca pelo falo que lhe fora negado pela mãe tão má
que é a mãe da menininha castrada (</span></span><span style="color: #666666; font-size: 15.3333330154419px; line-height: 16.406665802002px;">e que achou ser de um outro rapaz!).</span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Em suma: masculino e feminino
se relacionam como se num palco estivessem, uma comédia, diria Lacan em
“Televisão”: uma busca incessante no Outro masculino detentor do falo (a flor) perdido; a mulher busca no masculino o falo que lhe falta. Sendo,
que...SPOILER! <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraph" style="mso-list: l0 level1 lfo1; text-align: justify; text-indent: -18.0pt;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span>
<br />
<ul>
<li><span style="color: #666666; font-family: inherit; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Ninguém
tem ou é o falo que falta a ninguém...tudo é engodo. Desilusão!</span></li>
</ul>
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Apesar dessa descoberta,
lembremos que Camelo pensa um dia recuperar <i>das
Ding; </i>é, portanto, mais do que um romântico incorrigível, é alguém que tem
esperança em se tornar rei de si próprio (toda a onipotência da majestade o
bebê aí presente, pense no alerta de Freud!).<o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: inherit; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Sendo assim, fica fácil entender que esse
endereçamento ao Outro que seja “seu caminho, seu motivo e seu lugar” poderia
ser, na verdade, seu falo. Será Malu? Fica aí a questão, se quiser saber,
recorra ao cego Tirésias, recorra à
esfinge se não quiser ser devorado. </span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="color: #666666; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">QUEM ÉDIPO É NUNCA PERDE A MAJESTADE.</span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpFirst">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpFirst">
<span style="color: #666666;"><span style="font-family: inherit; font-size: 15.3333330154419px; line-height: 16.406665802002px;">(10)</span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“De
perto eu não quis ver<br />
Que toda a anunciação era vã<br />
Fui saber tão longe<br />
Mesmo você viu antes de mim<br />
Que eu te olhando via uma outra mulher”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"> Talvez esta seja a prova que faltava para o cético entender que há
Psicanálise em todo repertório de Los Hermanos. Veja com seus próprios olhos e
pense, sem algum esforço, se você já não sabe quem é essa outra mulher - ideal -
que Amarante diz ver na mulher atual.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;">Uma
dica? Mulher atual imagem da mulher atemporal, <i>das ding</i>, não há ainda um terceiro ursupador...<o:p></o:p></span></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Ficou fácil, né?<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Vou dar mais uma dica, essa mais
específica ainda: “Identificação anaclítica”. Mais fácil que isso só se eu
dissesse que a primeira letra do nome dessa mulher é M – Evitarei dizer mais.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(11)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><i><span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;">“Dei pra ti as estrelas os peixinhos e as aves</span></i><i><span style="font-size: 13.5pt; line-height: 107%;"><br />
</span></i><i><span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;">Todas as
montanhas nas escalas dei as claves</span></i><i><span style="font-size: 13.5pt; line-height: 107%;"><br />
</span></i><i><span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;">Todas as
cancões que eu fiz, eu fiz pra ti princesa</span></i><i><span style="font-size: 13.5pt; line-height: 107%;"><br />
</span></i><i><span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;">Tudo de mais
belo que encontrei na natureza”<o:p></o:p></span></i></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Essa canção profundíssima do primeiro álbum, você deve dela
lembrar, chama-se “Lágrimas sofridas” é por muitos cantada com uma gota de ódio
e decepção, um certo azedume (para voltarmos ainda mais no tempo...) e deve ser
considerada como uma canção raivosa, muito diferente das canções do último
álbum, considerado “maduro” pelos fãs. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Veja você que essa divisão entre o que é maduro e o que é <i>pop</i> não parece corresponder ao
conhecimento intelectual que a banda já demonstrava ali, no começo de sua
estrada, ao menos não é o que parece.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“Lágrimas sofridas” nos apresenta talvez o mais belo clichê
lacaniano “Amar é dar o que não se tem”. É verdadeiramente isto que está em
jogo nessa música que fala direto ao coração: um sujeito que deu a sua bem
amada coisas materiais, tais como seu sapato, seu vestido, mas não esqueceu de
lhe presentear com o intangível: "as estrelas, os peixinhos e as aves”. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“O dar o que não se tem” fica ainda mais claro na estrofe
seguinte:</span></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;">"TODAS as montanhas, nas escalas dei as claves; TODAS as canções que
eu fiz [...] TUDO de mais belo que encontrei na natureza". <o:p></o:p></span></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Vejamos que muito embora se trate de coisas conhecidas e
apreciáveis, é evidente que o narrador/cantor não possui todas as montanhas, os
peixinhos, as aves; é patético, inclusive, pensar que alguém seria dono das
estrelas. No máximo, todas as canções que ele fez, porque na verdade, ele quis
dizer TODAS as canções do mundo e toda a beleza da natureza – porque o amor é
hiperbólico mesmo. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><span style="background: white; font-size: 10.5pt; line-height: 107%;">Ou seja, dar o que não se tem a alguém que não o pediu. O resultado
disso é melancolia, já vimos aqui e parece coincidir com a ordem cronológica dos
álbuns: primeiro o amor desmesurado, louco e infantil, e depois a melancolia
(praticamente todo último álbum).</span><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">(12)<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpLast">
<i><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">“Quem
te vê passar assim por mim<br />
Não sabe o que é sofrer<br />
Ter que ver você, assim, sempre tão linda<br />
Contemplar o sol do teu olhar, perder você no ar<br />
Na certeza de um amor<br />
Me achar um nada<br />
Pois sem ter teu carinho<br />
Eu me sinto sozinho<br />
Eu me afogo em solidão”<o:p></o:p></span></span></i></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Por último, mas não menos
importante, eu não poderia deixar de citar a linda “Anna Julia” para trazer à
baila aquela que foi considerada a única contribuição original de Lacan à
teoria psicanalítica: ele mesmo, o brilhoso e comovente <i>petit a</i>. O objeto pequeno a ou simplesmente (<i>a</i>).<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Lacan, em seu seminário da Angústia trata do
objeto <i>a</i> como o que resta da relação
entre sujeito e Outro (lê-se grande Outro), porém o conceito ganha vida e
outras significações ao longo dos outros textos de Lacan e só podemos dizer que
o objeto <i>a</i> é tudo aquilo que cai do
Outro, sempre inacessível. <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Como é muito provável que
Camelo e Amarante andem por aí com os seminários de Lacan debaixo do braço, na fila do pão, eu sei que também
devem ter lido Miller, Nasio, etc (nunca subestime a intelectualidade de uma
banda <i>indie</i>). <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Irei recorrer à Nasio, porque
tenho certeza que as folhas de “Um psicanalista no divã” serviram de rascunho
para as primeiras estrofes de Anna Julia, esse clássico contemporâneo. <o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;">Vamos à Nasio:</span> <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 4.0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;">O amante apaixonado se sente subitamente
arrancado de si mesmo, despojado de sua liberdade e submetido ao sortilégio do
amado. Ora, como explicar o mistério do charme? Pois bem, somos incapazes
disso. [...]O objeto <i>a</i> é portanto o
nome dado à presença indizível e inebriante do amado, aquele que, em meu
coração, o torna insubstituível (Nasio, 2003, p.138-139)<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="margin-left: 4.0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">É, eu não tenho muito a dizer,
mas quem quiser se certificar de que em Anna Júlia se trata do objeto <i>a</i>, volte à letra, parece pueril,
infantilóide, cansativa, alguns dirão que não representa toda a sonoridade
a maturidade da banda, mas, aí onde
pensas haver apenas um <i>hit pop</i>,
encontrarás uma grande ode à invenção lacaniana. <o:p></o:p></span></span><br />
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Anna Julia é o objeto a, é a
mulher fetichizada na fantasia masculina, cantada e retalhada, eu seu olhar e
em seu charme magnético. Isso é pura poesia e todo aquele que maldiz
essa canção não sabe o que está fazendo.<o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666; font-family: inherit;">Essas são apenas 12 provas que
elenquei para que fique claro ao público que Los Hermanos não é apenas uma
banda cujo compromisso foi espalhar sua melancolia e seus acordes nostálgicos aos
nossos ouvidos. </span></span><br />
<span style="font-family: inherit;"><span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;"><br /></span></span>
<span style="font-size: 11.5pt; line-height: 107%;"><span style="color: #666666;">Há muito mais do que melodrama e corações partidos por Alines e
Bárbaras em suas canções, há muito mais do que os significantes “mar”, “barco” e
“morena” (os três valem uma análise); há muito édipo, muito Outro, muito objeto
<i>a</i>, muita <i>das Ding</i> e quem disso ainda duvidar, aconselho ouvir a discografia
completa com mais atenção, quem sabe em companhia de Freud e Lacan. <o:p></o:p></span></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><span style="font-family: inherit; font-size: 15.3333330154419px; line-height: 16.406665802002px;">Só lhe digo mais uma coisa: as barbas, estas não são por acaso (vide os judeus vitorianos...).</span></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpFirst">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpMiddle">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<div class="MsoListParagraphCxSpLast">
<span style="font-family: inherit;"><br /></span></div>
<span style="font-family: inherit;"><br /></span>
<br />
<div class="MsoNormal">
<h2>
</h2>
</div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-4530077192973904822015-02-19T18:37:00.000-02:002015-02-19T18:39:41.100-02:00As Solteironas (por Carmen da Silva, fevereiro de 1974)<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">Solteirona é uma palavra pesada, com uma conotação precisa, às vezes
amarga, às vezes maliciosa, que ecoa socialmente como uma punição à mulher que
vive sozinha. Carmem traça três perfis distintos, três maneiras de uma mulher
enfrentar esta situação: aceitando, e se tornando uma solteirona irrecuperável;
ou mulher realizada, ligada à vida e às coisas; ou o tipo solteirona por
atitude</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<table cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="float: right; margin-left: 1em; text-align: right;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj5fzsbTFPhu-TFqOEWMTwfI8kP_ZuGH3v39VXavEhlf1qpuegiKebfPdUCBw0GsPU0qlIqoqVBkieoO_jk8AQ2MDcAhgeWkt7XWDnfiv1QYMBnUX1uR-iy6ElgmPLQK3Cs-QyX/s1600/foto.JPG" style="clear: right; margin-bottom: 1em; margin-left: auto; margin-right: auto;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj5fzsbTFPhu-TFqOEWMTwfI8kP_ZuGH3v39VXavEhlf1qpuegiKebfPdUCBw0GsPU0qlIqoqVBkieoO_jk8AQ2MDcAhgeWkt7XWDnfiv1QYMBnUX1uR-iy6ElgmPLQK3Cs-QyX/s1600/foto.JPG" height="320" width="258" /></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;">Matéria original</td></tr>
</tbody></table>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">“</i> Todas vocês seguramente conhecem alguma solteirona. Talvez ela
não tenha mais de 30 anos (às vezes nem isso) e seu aspecto seja excelente;
mas, mesmo assim, ela já mostra as características da solteirona. Aliás, se
vocês forem boas observadoras, já terão descoberto esses traços desde que ela
tinha 18 anos. Ela é uma pessoa cheia de pudores e medos; tem tendência a achar
que tudo está mal, abstém-se de mil coisas por causa da possível opinião dos
outros ( que nem estão reparando no que ela faz) e critica com mal disfarçada
acritude os modos das que são <i style="mso-bidi-font-style: normal;">sexy</i>,
espontâneas, flertadoras, admiradas, populares. Às vezes posa de indulgente:
‘Não é que eu reprove, mas eu não tenho temperamento para agir assim’ – e seu
tom está insinuando quem está certa é ela, ou melhor, que as outras estão muito
erradas e são ‘salientes’ demais. Nossa solteirona é um pouco beata, bastante
piegas e muitíssimo apegada aos pais, sobretudo à mãe; basta um gesto meio
displicente desta para afundá-la na fossa; ela fica deprimida como uma criancinha
cujo universo ainda girasse exclusivamente em torno das atitudes maternas; se
os pais são mortos, ela cultua a memória deles; não é apenas o carinho e a
gratidão normais, senão a dedicação fundamental que os transforma em eixo da
vida dela. Exigente demais com as amigas, nunca dá tanto quanto recebe, nunca
se considera obrigada a tomar uma iniciativa, a dar o primeiro passo: fecha-se
em copas e espera que a outra se aproxime, chame, convide, insista. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Ciumenta e absorvente, sente-se
traída quando a amiga tem outros interesses, outras relações afetivas, de
amizade ou de amor, que absolutamente não a excluem, mas que ela, em sua
hipersensibilidade, considera como uma escolha que a desfavorece, uma exclusão:
quer ser a única importante na vida dos outros – e nada faz para conquistar
esse lugar. Amargurada, só sorri com meio lado da boca; parece estar sempre
insinuando: ‘Claro, para você é muito fácil: com um marido ao lado...’ – como o
pobre faminto que olhasse de fora o banquete alheio. Nunca pensa em marido em
termos de compartilhar a vida, as responsabilidades, os prazeres e as
vicissitudes: pensa só em termos de proteção e apoio, de jogar-se como um fardo
nas mãos de alguém.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Convidada para uma festa ou
reunião, logo esquece que se divertiu, conversou, brincou: a única coisa que
lembra é que na hora de ir embora cada um pegou seu par e ela não tinha par;
foi levada em casa ( com toda a gentileza, com toda a consideração) por um
casal amigo que lhe deu carona e isso envenena retrospectivamente a noitada. Ela
tem inveja da felicidade – real ou suposta – dos outros e essa inveja lhe
estraga todos os bons momentos; não desfruta do que tem e passa o tempo
lamentando o que não tem.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">A solteirona triunfante, a casada</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Se nossa solteirona é mulher de
sucesso em seu trabalho, em seus negócios, o mais provável é que ela e torne
masculinizada, da forma mais crua: voz áspera, gestos abruptos, atitudes de
quem não admite brincadeiras, conversas puramente intelectuais ou comerciais,
impaciência com os interesses, que ela acha frívolos, das outras mulheres; será
a amiga dos maridos, que só tolera as esposas com<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>um grau visível de desdém. Mas talvez vocês
conheçam uma solteirona <i style="mso-bidi-font-style: normal;">casada</i>: ela
existe, responde ao tipo descrito e o erro não é da natureza, e sim, do
Registro Civil. Por assim dizer, ocorreu uma mancada, e a solteirona foi parar
onde não tinha nenhuma vocação de estar. Tem infinitas queixas contra o marido:
nenhum homem está em condições de dar – ou suportar – o que ela espera dele.
Sua atitude é de dependência viscosa ou de dominação castradora. Para o olho
sagaz, a coisa é clara: ela continua sendo a ‘filhinha de mamãe’ com relação ao
marido, ou é para ele a mamãe de um ‘filhinho’ irresponsável e imaturo – nos
dois casos se sente frustrada, pois nenhum homem, por mais neurótico que seja,
consegue cumprir totalmente suas exigências regressivas. Ela não se casou para
ser feliz ao lado de um homem, senão para repetir com ele, na forma passiva ou
ativa, uma relação materno-filial em moldes infantis: a única relação de que
ela é capaz.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Quando uma mulher, com vocação de
solteirona, se casa, é comum que acabe se desquitando; e aí todos os amigos
sagazes têm a impressão de que ela encontrou seu verdadeiro caminho; apesar de
todos seus ressentimentos, está mais tranquila, mais ‘normal’, sem um homem.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">A celibatária</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Vocês conhecem uma celibatária?
Uma mulher que é solteira além da idade, sem ser solteirona. Talvez não, pois o
tipo é bem mais raro entre nós: os preconceitos de nossa sociedade não são
propícios ao seu desenvolvimento. Mas ela existe e é uma personalidade bem
definida. Vive de seu trabalho e tem a sorte de adorar seu trabalho – ou então,
se esse for o caso, consegue suficiente tempo livre para fazer algo que adora
e, com isso, se sente realizada. Mora num apartamentinho cheio de bossa e
repleto de<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>amigos que se sentem bem aí.
As outras mulheres, casadas ou solteiras, correm para ela para contar-lhes seus
problemas e serem confortadas, tendo ouvido a palavra cordial e compreensiva de
que necessitavam. As crianças são vidradas nela: a tia que todas desejariam
ter. </span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Os homens procuram sua companhia,
acham-na estimulante, divertida, generosa, sempre pronta a ouvir com simpatia
uma confidência difícil, a dar o conselho sincero e desinteressado ou, se for o
caso, a debater opiniões com altura e objetividade. Dela dizem os maridos das
amigas: ‘Puxa, não compreendo como<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>é que
Fulana continua solteirona: será que os homens não têm olhos?’ – e as
respectivas esposas aprovam, sem o menor ciúme. Ela pode ter ou não ter um
amor: isso depende de sua escolha. E não é raro que, já bem avançada nos 40,
ela ainda tenha um bom número de candidatos na fila de espera. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Se chega a decidir-se por algum
deles, não é por medo de terminar sua vida sozinha: ela sempre ‘se virou’ e
nunca sofreu de solidão; é porque achou que dá pé. Isto é, que sua vidinha
feliz será ainda mais feliz com ele. E o escolhido vai esfregar as mãos de
contente, sentindo-se um privilegiado. Nunca pensará: ‘Peguei alguém que
ninguém mais quis’, mas sim: ‘Ela passou anor recusando uns e outros para
finalmente se decidir por mim: sou o maior’</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">A vidinha pedida a Deus</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Confesso que fico profundamente penalizada ao
ler cartas de mulheres solteiras que já estão acima da considerada ‘idade
casadoura’, morando sós ou com os pais e me escrevem queixando-se de solidão,
vazio, necessidade de amor, frustração por não ter ao lado marido e filhos,
falta de objetivos, vontade de morrer. </span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Elas me fazem pensar no mendigo
que tem milhões escondidos no colchão e vive uma existência miserável,
alimentando-se de sobras e abrigando-se com farrapos. Pessoalmente, casei tarde
e antes morava sozinha; sei por experiência própria o que é a vida de
celibatária, curtindo seu apartamentinho, seus amigos incondicionais, seus bons
papos, sua turma sempre disponível, seu telefone sempre chamando – enfim, uma
vida plena de afetividade, comunicação, diálogo.</span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Posso garantir que desfrutei cada
minuto dessa existência. E se bem não a lamento, agora que entrei em outra, não
é sem saudades que relembro minha vidinha de celibatária. Eu trabalhava fora e
a empregada vinha fazer a limpeza durante as horas em que eu não estava em
casa; assim, eu encontrava tudo em ordem sem ter preocupações domésticas e sem
ver minha intimidade invadida por uma estranha.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Fazia minhas refeições em
restaurante e não tinha de pensar em compras, cardápios, etc.</span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Às vezes o dinheiro ficava curto
e eu rondava pelas redações, oferecendo matérias <i style="mso-bidi-font-style: normal;">freelance</i> para desapertar o orçamento. Amigos dos dois sexos vinham
todas as noites, e juntos discutíamos a arte, o futuro do mundo. Quem quiser um
panorama mais completo desse estímulo de vida, leia <i style="mso-bidi-font-style: normal;">A força da Idade, </i>de Simone de Beauvoir; aí poderá ver o que<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>é uma existência baseada em objetivos
próprios, mas sem carências afetivas; livre de amarras convencionais e aberta
aos acontecimentos, aos contatos, às surpresas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">É certo que nem todas podem ter
ao lado um Sartre: mas quantas o desejam? Nem sempre é preciso tanto para
satisfazer – e satisfazer plenamente – o nível das próprias aspirações.</span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Enfim, ao ler uma dessas inúmeras
cartas que dizem: ‘Tenho xis anos, sou solteira, vivo do meu trabalho e não me
conformo por não ter ao lado marido e filhos, sofro uma solidão horrorosa,
sinto-me diminuída, inferiorizada, vazia, infeliz’, é com muito de reação pessoal
que penso: Puxa, essa moça tem a vidinha que qualquer uma pediria a Deus – e
ainda se queixa?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">A diferença</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">As circunstâncias externas são
praticamente as mesmas nos dois casos. O que as distingue é a atitude emocional
de cada uma. A celibatária não tem pressa de casar e nem sequer decidiu <i style="mso-bidi-font-style: normal;">a priori</i> se um dia chegará ao casamento:
optará por ele ou não, de acordo com suas inclinações, quando chegar o momento
oportuno. Não está pensando que suas amigas casaram e ela não; imagina que, se
as outras já casaram, é porque tinham para isso boas razões que ela ainda não
tem. Não olha o par com inveja ou ciúme; ao contrário: se a amiga ou o amigo
casou, seu parceiro (ou parceira) é mais uma amizade que lhe vem ‘ de quebra’.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Frustração dos instintos
maternais? Isso é relativo, muito fomentado: a sociedade <i style="mso-bidi-font-style: normal;">espera </i>que a mulher que não tenha tido filhos na idade convencional
seja infeliz e frustrada. Os homens saltam muito rápida e arbitrariamente à conclusão
de que assim é – a tal ponto que, às vezes, fico pensando se eles não projetam
nela sua própria frustração pela <i style="mso-bidi-font-style: normal;">incapacidade
biológica </i>de procriar. A verdade é que a vida oferece muitíssimas outras
satisfações além da maternidade: o amor, a tarefa, a realização, a
criatividade, a amizade: e essas tradições se substituem entre, si, umas
compensam a ausência de outras. O único que não é possível é viver sem <i style="mso-bidi-font-style: normal;">nenhum </i>tipo de gratificação: mas quando
vários são possíveis, a pessoa bem integrada não tem nada a lamentar. A celibatária
não se sente incomodada pela falta de filhos ou de um homem a seu lado,
assumindo a vida por ela, responsabilizando-se por ela: é mais do que capaz de
assumir-se e responsabilizar-se sozinha.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Enfim, a celibatária é uma mulher
que resolveu construir sua própria existência, ser uma pessoa por si mesma. Isso
de nenhum modo exclui o amor de um companheiro, mesmo que ele não seja o
definitivo; e também não exclui a escolha de um companheiro definitivo, em
qualquer etapa: o casamento não está eliminado de suas cogitações, sem ser,
entretanto, a finalidade primordial de sua vida. A celibatária se organiza a
partir de<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>dados reais: o que ela é, o
que ela tem em si, o conjunto de<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>sua
situação, as potencialidades que ela pode desenvolver – sem idealizar o que
poderia ter sido. Em resumo, ela possui suficiente maturidade emocional para
enfrentar o desafio.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">As limitações do casamento</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">O casamento não é nenhuma prisão.
Mas a verdade é que, nas condições vigentes na sociedade patriarcal, mesmo um
casamento feliz e harmonioso cerceia em muito a liberdade o desenvolvimento da
mulher. Por mais que numa união desse tipo não haja ciuminhos tolos nem
restrições absurdas à liberdade de ação da esposa, os próprios preconceitos
sociais pautam sua conduta em moldes rígidos, privando-a de seguir certos
impulsos, tomar atitudes espontâneas, permitir-se gestos e modos menos
circunspectos, que só seriam tolerados numa solteira. Ela se submete a essas imposições
em atenção ao bom nome do marido, pois, se a mulher não se conduz conforme as
convenções, todo mundo passa a chamá-lo de ‘coitado’ ou ‘boboca’.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Por outro lado, recai sobre ela a
carga da rotina doméstica, com o peso das preocupações materiais, miúdas,
rotineiras embrutecedoras, embotando-lhe o cérebro e absorvendo-lhe o tempo e
as energias que assim são desviados de finalidades mais criativas.</span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">E não me digam que a solteira que
mora só, numa pensão ou apartamentinho, tem os mesmos problemas: todo mundo
sabe que seu estilo de vida, no que tange às tarefas domésticas, é
infinitamente mais simplificado. E nem poderia ser de outro modo, pois ela tem
de trabalhar para sustentar-se.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Tudo isso sem falar nos filhos. Aqui
nem vale a pena pormenorizar: qualquer mãe de família sabe das milhares de
obrigações de seu dia-a-dia, da impossibilidade de dispor de suas noites, da
atenção constante e dos inúmeros cuidados materiais – não falo dos outros – que
ela tem de dispensar às crianças.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Nessas condições, eu me pergunto:
se uma mulher não está apaixonada por ninguém em particular – uma pessoa cuja
companhia lhe pareça compensação mais do que suficiente por tudo de que ela
deverá abdicar – , se ela se mantém sozinha com seus próprios recursos: se ela
tem um vasto campo de possibilidades de realização, afetiva e social, por que é
que ela não desfruta dessa maravilhosa liberdade e vive amargurada pela falta
de marido, pela falta de amor?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">O cárcere interior</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Em realidade, quando falo de
liberdade, refiro-me somente à celibatária. A solteirona, embora com as circunstâncias
a seu favor, não a tem, porque vive <i style="mso-bidi-font-style: normal;">encarcerada
dentro de si mesma</i>. Dentro de sua neurose, de sua própria incapacidade de
dar amor.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Sei que as atingidas vão
protestar. Pois se elas não fazem mais do que pensar em amor, o amor é sua
ideia fixa, seu desejo obsessivo; sentem-se asfixiadas de amor sem objeto.</span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Quem tem amor <i style="mso-bidi-font-style: normal;">de verdade</i> para dar, sempre recebe amor
em troca. Pode haver um intervalo, uma pausa, um período em que essa pessoa não
esteja apaixonada por ninguém em especial; mesmo assim, mesmo assim, ela
continua dando amor aos parentes, aos amigos, à tarefa que realiza, às
atividades que lhe agradam, às ideias ou causas em que crê. E por fazer tudo
isso com amor, ela se sente fundamentalmente feliz, mesmo que o lugarzinho
privilegiado em seu coração esteja temporariamente desocupado. Essa momentânea
ausência de um objeto específico de amor não a angustia: segura de suas
disponibilidades, de suas reservas afetivas, não precisa estar sempre provando a
si e aos outros que as possui.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">No caso da solteirona, esse amor
encruado, sem extravasão, só lhe traz frustração, rancor contra os homens que
não a procuram, inveja das mulheres que tiveram mais ‘sorte’, ressentimento
pela felicidade alheia, senso de exclusão injusta, de barreira que as separa do
resto do mundo. Vê-se, pois, que esse chamado ‘amor’ só se traduz em sentimentos
negativos: em realidade, ele não é senão o disfarce de um profundo ódio
recalcado, isso se torna particularmente evidente quando um homem se aproxima
da solteirona com intenções eróticas. Em geral, ela começa por afastá-lo: com
sua frieza camuflada de recato, sua agressividade dissimulada em ‘nervosismo’,
suas atitudes pouco cordiais, seus intensos receios de que possa ‘não dar certo’,
seu medo de comprometer-se numa ligação que talvez venha a fazê-la sofrer, ela
encontrará meios e modos de estragar tudo. E só quando ele tiver ido embora
definitivamente, ela começará a alimentar a fantasia de amá-lo: adora-o, sofre
por ele, está desesperada, tem vontade de morrer – mas tudo isso quando ele já
se tornou inalcançável. É óbvio que ela não se atreve a amar um homem <i style="mso-bidi-font-style: normal;">real</i>. O que ela fez, no caso, é tomar um
homem real como modelo físico para sua própria fantasia: ama um objeto criado e
idealizado em sua imaginação; esse objeto pode ter as feições de Fulano ou
Sicrano, mas isso é tudo: como pessoa concreta, Fulano ou Sicrano não consegue
ter acesso ao mundo interior narcisista.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Muitas vezes esse amado ideal nem
tem rosto; em outras ocasiões, a solteirona cultua a memória de um ex-namorado
da adolescência, de um noivo morto há vinte ou mais anos atrás.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><i style="mso-bidi-font-style: normal;">Em busca de uma saída</i></span></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">As solteironas se revoltam quando
me escrevem pedindo ajuda, e eu respondo ‘Psicoterapia, psicoterapia!” Não se
consideram doentes, e sim, infelizes. Acham-me dura, insensível, incapaz de
compreender as infinitas riquezas de amor que elas têm no íntimo, de simpatizar
com seu sofrimento. Neste último ponto estão redondamente enganadas: posso
avaliar, talvez melhor do que elas próprias ( pois há muita coisa que elas
reprimem, negam, escondem de si mesmas), a extensão de sua dor, o caráter
absorvente e esmagador de sua depressão. O que não posso é dar cumplicidade ao
seu sistema de autoengano: elas não sofrem de amor – aliás, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">ninguém</i> sofre de amor; sofrem é de ódio
que não ousa assumir seu nome; e por essa distorção, isto é, por não estar
conscientizado, ele neutraliza todo o <i style="mso-bidi-font-style: normal;">amor
real</i> que elas possam ter em si.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">A solteirona é uma pessoa que, não
tendo sido suficientemente amada, ou tendo tido exigências excessivas de amor,
na sua infância, ficou fixada a essa fase da vida, om um senso de reivindicações.
Ela cresceu em anos, mas não em estrutura psicológica: já adulta, continua
querendo vingar-se daquela mãe que não a amou o bastante, daquele pai
indiferente ou severo demais. Ou recuperá-los, se, ao contrário, eles abafaram
sua personalidade com excesso de mimos e proteção. É a eles, os pais, que está
referido seu desejo de dar e receber amor; mas esse intercâmbio é concebido em
termos infantis: mamar, ser levada ao colo, paparicada, dirigida, dependente;
portanto, ele é impossível, mesmo que haja pais vivos e dedicados. Ela está
situada fora do tempo real: não quer um amor aqui e agora, que, como todo o
amor normal, se projete no futuro: ela quer amor <i style="mso-bidi-font-style: normal;">ontem</i>. E isso, sendo irrealizável, deixa-a permanentemente
frustrada e, em consequência, permanentemente raivosa – e culpada por essa
raiva, punindo-se por ela através da solidão e da depressão. Ela também não quer
o amor do <i style="mso-bidi-font-style: normal;">outro</i>: para o bebê, os pais
não são “outros”, são partes de<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>si
mesmo; o que a solteirona deseja é o vínculo narcisista com sua imagem no
espelho, a simbiose com os pais, que lhe permitirá amar-se.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Enfim, ser celibatária é ser
madura de idade e de estrutura psíquica, e não estar casada, <i style="mso-bidi-font-style: normal;">agora, no momento</i>; ser solteirona é ser
madura de idade, imatura de estrutura psíquica, sofrer com sua condição e não
ter dentro de si os recursos para modificá-la. Não ridicularizemos, como fazem
alguns, os tormentos da solteirona: ela sofre a carência instintiva e afetiva mais
radical, que é a de quem vive voltada para uma satisfação impossível, porque
baseada em fantasias regressivas, reivindicações arcaicas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<span style="color: #666666;">
</span><br />
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">A tomada de consciência do
verdadeiro núcleo do problema (através da psicoterapia como método ideal; ou,
quando esta for impossível, mediante uma honesta e corajosa auto-análise, até
chegar às raízes) daria à solteirona sua oportunidade de transformar-se numa
celibatária e viver uma vidinha invejável, com todas as perspectivas –
inclusive matrimoniais – da celibatária. Uma mulher – feia ou bonita, não vem
ao caso – tão cordial, tão generosa, tão <i style="mso-bidi-font-style: normal;">gente</i>
que todo mundo que a conhece diz: “Puxa, será que os homens não têm olhos?” E
vai ver<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>que eles têm – e estão lá: quem
fala é porque não sabe.</span></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-22528531125493469362014-08-19T00:01:00.000-03:002014-08-19T02:26:02.839-03:00Je suis lacanianne-fajute, mon amour!<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Em seu texto "Lacan elucidado" Jacques-Alain Miller nos relembra do fato de que o desejo neurótico equivale à felicidade, uma felicidade nunca atingida, e por isso mesmo, tão almejada. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">A questão central do neurótico, nos relembra Miller, será sempre o "Che vouir?" Ou "O que quer?". Portanto, ao neurótico cabem as perguntas, cabe a interrogação do desejo. E para o perverso? Ora, a questão não é uma questão. Em última análise, a interrogação não consta na máquina de escrever do perverso, pois, nada do seu desejo corresponde a uma dúvida, o perverso é aquele que, de repente, sabe.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Segundo Miller, seria esta a base da arrogância perversa. Meu complemento: o gozo do perverso é ser aquele que goza enquanto o outro pergunta. O perverso não questiona, ele sabe, ele sabe que é. E, no caso que ilustro aqui ele sabe que é francês. Desdobremos melhor esse argumento, pois será útil no que pretendo desenvolver.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg-MSk4k_AZbTNo0dkhiJZSKm8ya6-kd5krsYnzDAm7JsDln_tvCjAIAxjyElg4ykLRCoapz_ZSNz-u4Xy5Y7x4btywSAUyNYw6II2iQioeUf1kq3a-t3510TvKZVuft8EL3Jd0/s1600/lacan.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg-MSk4k_AZbTNo0dkhiJZSKm8ya6-kd5krsYnzDAm7JsDln_tvCjAIAxjyElg4ykLRCoapz_ZSNz-u4Xy5Y7x4btywSAUyNYw6II2iQioeUf1kq3a-t3510TvKZVuft8EL3Jd0/s1600/lacan.jpg" height="211" width="320" /></a></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Se o perverso detém a chave do mistério, se ele possui o código capaz de abrir qualquer cofre, ele não é dado à elocubrações ou reflexões, pois a Verdade está posta e ela não pode duvidar daquilo que simplesmente é. O perverso tudo sabe e nada desconhece. E se nada questiona, cabe dizer que ele se coloca como aquele que é o caminho, a Verdade e a vida, assim sendo, não haveria de duvidar de sua própria identidade, pois a Verdade é uma: ele é, e completo: Ele não apenas é, mas também é francês.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Além de ser aquele que é, le subject psicanalitique frequentemente é francês, não se sabe ao certo se oriundo da parte leste, um verdadeiro francês da região da Alsácia, ou da região da Normandia. A origem aqui não é tão importante como a nacionalidade, que é certa: ele é inevitavelmente francês, como o são as baguetes, os croissants e o molho bechamel.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Estamos agora falando de um perverso típico, estereotipado e clichê: estamos falando do psicanalista français-version, candidato ou membro da afamada " Eccole Fajute-version de Psychanalyse". Vejamos o motivo que o torna tão especial, tão-todo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">(1) Je parlais français, et vous?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Sabemos que estamos diante de um psicanalista da "Eccole Fajute-version de Psychanalyse" quando a primeira pergunta que ele nos dirige está relacionada à idiomas, mesmo que seu vocabulário se restrinja a algumas expressões idiomáticas decoradas à força e pronunciadas com um acento ou sotaque que quase sempre não é compreensível para o próprio francês, o verdadeiro. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">O membro da Eccole se regozija ao dizer a quantidade de verbos que aprende semestralmente em seu curso do SENAC e costuma fazer jus ao que aprende tentando aplicar em frases aleatórias algumas das expressões que a duras penas conseguiu memorizar. Há ainda os que logram mais êxito ao conseguir pronunciar frases-clichês que muito servem ao ofício de qualquer psicanalista da Eccole. São elas:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">a) La vérité a structure de fiction.</span><br />
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;">Essa é fundamental para todo aquele que deseja tornar-se referência no campo psicanalítico, especialmente aqueles que se nomeiam seguidores de Lacan. Para o iniciante, convém memorizar - et aplicar - sempre que possível.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">b) "La femme n'existe pas"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Essa talvez seja uma opção viável apenas àqueles psicanalistas que se considerem iniciados, pois seu uso requer um domínio maior acerca das concepções lacanianas das relações entre as posições masculina e feminina.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"> Para seu uso é recomendável a leitura dos Seminários 19 e 20, além, lógico, do dicionário de Psicanálise de autoria de Madame Roudinesco ( não preciso dizer que para os membros da Eccole fajute-version, essa leitura pode ser feita en passant, comece e termine pelas "oreilles " dos livros).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Seu uso é recomendado em uma roda de amigos igualmente integrantes e praticantes da Eccole.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">c) "Le désir de l'homme est le désir de l' Autre"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"> Essa expressão é indiscutivelmente a chave para a sua entrada na Eccole e requer ser bem pronunciada, para tanto, convém aulas semanais e mesmo reforço escolar para que nenhum traço ou vestígio de um idioma incoveniente sobrevenha e atrapalhe seu ingresso na Eccole. Já diriam os mais antigos fundadores dessa instituição, quem não conhece "l'Autre" n'existe ( vejam que algumas das expressões podem ser usadas em combinação, e isto é o que torna tão mágico o idioma francês". Insisto: convém mais aulas no SENAC para uma pronúncia impecável, não arrisque seu passaporte para uma instituição tão renomada).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">É mister ressaltar que para se candidatar a uma vaga na Eccole Fajute-version de Psychanalyse é necessário preencher uma série de outros requisitos aqui apontados à guisa de esclarecimento. Por isso, prosseguiremos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">(2) Les cigarettes dans l'obscuritè:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Para todo aquele imberbe psicanalista que acreditou que seu ingresso na Eccole dependeria única e exclusivamente de seu traquejo no idioma de Napoleão, trago más notícias: não pense que algumas expressões idiomáticas fazem de você um membro de uma instituição como esta. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Reza a lenda que outras características próprias da personalidade do candidato serão avaliadas, isto é, sua capacidade de encarnar o sujeito do gozo e de manejar de maneira irrepreensível o discurso do mestre. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Para tanto, convém entender de Topologia ( en passant) e, mas, acima de tudo: convém assegurar-se de que, de fato, não se é um estranho no ninho: a banda de Moebius deve ser um conceito não apenas a ser aprendido, mas divulgado e massivamente repassado aos outros membros da Eccole, sempre se observando o obscurantismo da linguagem - não esqueçam de que estamos falando da "Eccole de Fajute-version de Psychanalyse" e quanto mais as pessoas franzirem o cenho para cada frase sua, tanto melhor, é isso que lhe oferecerá a certeza de que você está perante acéfalos, será o seu conhecimento avec seu mis-en-scene o responsável por retirar o ignóbil das garras de sua vacuidade. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Serás o Napoleão, serás o general, e marcharás rumo às terras da ignorância alheia, serás o mestre profanador e o senhor de todas as coisas. Além disso, preze pela imagem intocável que é conveniente à imagem que você deseja transmitir para toda a plateia, cigarettes são bem vindos, pois contribuem para a cena noir , o que muito eleva o poder de suas palavras. Caso domine a arte elegante do tabagismo, considera-se oportuno variar os produtos para charutos e cachimbos, mas lembre-se:</span><br />
<span style="color: #444444;"> Narguilé não é bem visto pelos membros da Eccole.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Para melhor fixação, reitero: abuse dos obscurantismos na linguagem ( aí entra a necessidade de dominar o que foi exposto no tópico 1). O resto faz parte da mis en scene que você construirá. Seu nome está em jogo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">3) Croissant et Chandon:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"> Diante do que foi exposto até então, você já deve ter percebido o grau de exigências que são impostas aos candidatos a uma vaga na Eccole. Portanto, se você conseguiu dominar os dois tópicos anteriores, já é capaz de preencher facilmente os requisitos relacionados a este ponto, pois já deve ter adqurido um paladar refinado condizente ao de uma pessoa francesa e adepta à Psicanálise lacaniana-lacanóide. No entanto, caso este não seja seu caso, algumas advertências são cabíveis:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"> Todo bom membro da Eccole consegue adequar seu paladar ao que estuda e o que parece bobo e sem sentido, torna-se um dos requisitos mais importantes para sua aceitação. Portanto, papel e caneta na mão, attención!</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">a) Não é apropriado o gosto por cerveja, objetivamente falando, troque a cevada por um bom vinho Merlot (no caso dos vinhos, quanto mais envelhecido melhor). E, como estamos falando dos interesses enológicos, cabe mesclar, entre um gole e outro, comentários relacionados à safra do vinho que deve ser sorvido delicadamente. Anote algumas expressões que podem interessar:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">1. "Sinto o gosto de carvalho envelhecido tocar minhas papilas gustativas num frenesi de sabor! É quase o gozo Outro!" ( risadas baixas são permitidas).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">2. "Nada como uma boa taça de ________". (complete com o nome do vinho, e não esqueça da safra)</span><br />
<span style="color: #444444;"> para esquentar uma boa discussão.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Observação: Há ainda uma melhor opção: quando você consegue unir seus conhecimentos enológicos ao linguajar lacanês típico da Eccole, como na frase abaixo:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Exemple: "Nada como um bom Merlot da Alsácia, com esse gosto acarvalhado indefectível e uma discussão sobre Le desirè!"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Exemple 2: l'infer est la mère. Le Merlot est le femme du desire!" (Risadas)</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Para um ou outro intervalo no vinho, para quem é mais jocoso, utilize os coringas:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">"Le vin n'existe pas!"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">"Le vin suis lacanianne!"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">"Bacco est italien mais le merlot est le Français!" (Sempre cai bem para os fanfarrões)</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Outras opções de bebida: Não existem, seu paladar deve ser pedagogicamente levado a ignorar as demais bebidas, pois estas não são clichês o suficiente, salvo os espumantes, prefira os Chandon e Veuve Clicquot. Ah, também não é preciso dizer que todos os vinhos devem ser rigorosamente secos, pois tudo que seja suave serve apenas para cozinhar carnes e aves.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Opções gastronômicas: queijo brie, queijo gouda, queijo holandês (única exceção à comida de outro país), coq au vin, crepe suzete (clássico), aves: codorna, pato e ganso. Frutos do mar: ostras, lagostas e camarões ( tentar harmonizar com um bom Merlot acarvalhado, se possível com notas de baunilha ou frutas vermelhas, também conhecidas como "Fruits de la forêt").</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Sessão Pâtisserie: Macarrons, Madalaines, Croque Monsieur, Croissant, Brioches, Petit Gateau (em baixa ultimamente devido à crescente vulgarização) , Profteroles (mesmo caso do Petit gateau, mas ainda assim uma ótima opção nos dias de inverno, evite Foundue - igualmente vulgarizado e abrasileirado!). </span><br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">4) Godard est mieux que Pelé!</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">É desnecessário dizer que conversações sobre esportes ou qualquer outra manifestação corporal é terminantemente mal vista pelos membros da escola (as únicas exceções são Lacrosse, Badminton, Golfe e Tênis). </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Todo o resto, inútil dizer, não deve existir para você. Trabalha-se com a linguagem, o inconsciente é estruturado como "language, non come le corps!"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Futebol? Nem pensar! Somente são permitidos comentários sobre as finais de Roland Garros ou algo do gênero, lembre-se que se trata aqui de responder positivamente a tudo que for clichê no tocante à cultura e hábitos franceses.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"> Às vezes flagramos um membro da Eccole gritando aos quatro cantos algo como "Alle, le bleu!". Isso constitui grave crime, e como todo crime, está passível de punição. Futebol não é um esporte lacaniano, muito menos francês. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Sempre prefira discussões sobre filmes, daí seu gosto de cinéfilo dever contemplar os idealizadores de tudo que representar a Nouvelle Vague, caso não conheça o movimento, estude no Wikipedia para não decepcionar os seus ouvintes. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Aqui vão dicas de cinema:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">1- Audrey Hepburn pode ser a bonequinha de luxo, mas B.B (Brigitte Bardot) será sempre a "femme fatale" do cinema. Filmes interessantes a se citar: " E Deus criou a mulher ", "Acossado", "Uma mulher é uma mulher", "A bela da tarde".</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">2- Não acho necessário, mas irei ressaltar: pesquise os títulos originais dos filmes e dos diretores. Não precisa conhecer todos os representantes da "nova onda" ( Nouvelle Vague!) basta uma pitada de Godard, que é o principal mesmo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">3- Não esqueça de citar os mais recentes: "Azul é a cor mais quente" (hit-hot do momento!) "A trilogia das cores", "Os sonhadores", para os modernosos: "O fabuloso destino de Amelie Poulain" (fortemente vulgarizado, mas ainda surte efeito nas rodinhas de amigos da Eccole. Não esqueça que a frase "Les temps sont durs pour les rêveurs" sempre abre portas!)</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">5) Les femmes, echarpe, les hommes, brettelles!</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Aqui umas dicas de vestimenta para você que já se sente tão francês. Se a candidata for mulher: echarpes, chales e meias-calça. Boinas são opções deveras arriscadas e só combinam com candidatas jovens, se você aceitar o risco, arque com as consequencias. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Para os homens: Suspensórios ( item de primeira necessidade) e gravata borboleta (para os mais ousados, combina muito com charuto, e orna se seu look for Lacan-inspired, vide item 2) Pret-a-porter é a bola da vez. Um ou outro acessório Channel é essencial (lembre-se da pontinha de mascarada!).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Não pretendo me alongar nesse ponto, mas é interessante notar que a vestimenta, a maquiagem , o empunhar de um cigarro, a mexida suave nos cabelos bem tratados é essencial para le spetacle majestic e sem o pacote completo dificilmente você deixará a sua marca na Eccole, em uma frase: o homem é o estilo, invista no seu!, seja original!, seu grand finale deve ser explêndido, inesquecível.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">6) Elegance avec Arrogance</span></div>
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<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Esse tópico quase foi excluído da lista, achei que estaria dizendo o óbvio. Todo e qualquer membro da Eccole deve se assegurar de que está cultivando apropriadamente sua arrogância , e para que não se tenha dúvidas de que se está sendo arrogante o suficiente , todo o check list abaixo deve ser feito. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Portanto, para efeitos de checagem, resumamos tudo que foi dito até então em algumas perguntas objetivas:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">1) Estou dominando o suficiente as expressões idiomáticas francesas?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">2) Meu sotaque é de que região da França? Há traços de regionalismo?se sim, quais?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">3) Minha postura é adequada a de um membro da Eccole Fajute-version de Psychanalyse?Utilizo as roupas adequadas?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">4) Rebato críticas com veemência e prepotência suficientes para esconder minha vacuidade?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">5) Utilizo o lacanês nível avançado para esconder minha ignorância?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">6) Decorei suficientemente os matemas lacanianos e os traduzi de forma correta para o lacanês mais obscuro?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">7) Ignorei o suficiente as atividades de supervisão diante das necessidades da "fajute clinique"?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">8) Mantenho vivo em mim o necessário narcisismo primário que me ajudará a nunca esquecer os preceitos norteadores da Eccole?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">9) Continuo desconsiderando qualquer possibilidade de deitar num divã?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">10) Confio plenamente em tudo que produzo em termos de teoriazação?</span><br />
<span style="color: #444444;"><br /></span>
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Ao responder esse check list positivamente você estará a um passo de se tornar um membro efetivo da Eccole Fajute-Version de Psychanalyse" , comemore, suas chances de ser aceito crescem assustadoramente! Lembre-se que as questões são meramente ilustrativas e aqui elencadas com fins exclusivamente didáticos, pois o membro da Eccole nunca se questiona.</span><br />
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Adendo:</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Questions fréquemment posées ( Questões frequentemente feitas)</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">-- Ser acadêmico faz de mim um membro da Eccole?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Pergunta repetitiva, mas, volto a dizer que o fato do candidato exercer a atividade docente não o torna automaticamente membro da Eccole, é preciso manter a chama dos princípios-base acesa. Apesar disso, alguns membros da academia constituem presença marcante na Eccole, isso não é segredo para ninguém.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">-- Ser histérica é condição básica para fazer parte da Eccole?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Pergunta capciosa e frequente. Costumo respondê-la de maneira didática: Não era porque Anna O. era a histérica preferida de Freud e de Breuer que ela seria, automaticamente, membro da Eccole Fajute-version de Psychanalyse. Na verdade, a moça virou assistente social. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Vejamos: é lógico que uma certa encenação, maneirismos e trejeitos da histérica são facilmente compreendidos como condições para sua entrada na Eccole. Mas, é preciso cautela nestes casos: não basta ser histérica, é preciso ter um pezinho na perversão, pois máscara sozinha não faz semblante, se você é histérica se espelhe em outras histéricas que conseguiram, ao fim de muito esforço, transparecer conhecimento e eloquencia em sua fala. Ajuda muito dominar os tópicos 1 e 5 (lembre-se, aqui se trata de aparência, e a aparência é tudo!)</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">-- Quando um psicótico se torna apto a se candidatar à Eccole?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Fácil. Quando ele consegue manter um nível básico de integração egóica que o torne quase perverso ( na Eccole achamos isso possível, sim!), então o que é na verdade delírio pode se transformar em eloquência. A verborragia do psicótico pode nos ser muito úteis em seminários e palestras. Já vi belíssimos casos em colóquios sobre Topologia lacaniana.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Bem, eu espero ter chegado ao fim dessa explicação. Sei que me estendi, mas tornou-se fundamental esclarecer aqui os requisitos básicos. para ingresso na Eccole Fajute-version de Psychanalyse. Acredito que falei tudo e que não há mais nada a dizer. Nem por mim, nem por ninguém.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Agradecimentos especiais: wikipedia, dicionário babylon 10 português-francês</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
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<span style="color: #444444;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-67488760851102546352014-07-15T16:45:00.000-03:002014-07-15T16:45:12.951-03:00E nos começos era o amor , de antes?<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">" Passadista, indiferente ao novo, alguém que perdeu toda a capacidade de se admirar, eu protesto: não, nem tudo era agradável <i>antes</i>, nem tudo é abominável hoje. Isso não me impede de comparar, e toda comparação implica sempre o risco de contrapor o bom ao mau, o melhor ao nem tão bom"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">J-B. Pontalis</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Essa é uma das muitas passagens marcantes de <i>Quando</i> ( Primavera Editoral, 2013) da autoria de J-B. Pontalis. Esse livro faz parte de uma série de outros escritos em que o autor se aventura em uma nova empreitada: não se trata de um livro técnico, também não se pode dizer que seja uma autobiografia.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Na verdade se trata de uma espécie de reunião de textos esparsos que o autor produziu durante sua vida e que em algum momento traz um ou outro relato sobre sua forma particular de ver o mundo, mostra um pouco de suas experiências pessoais. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Pontalis fala de alguns amigos, de Psicanálise e de seu país, revela suas impressões acerca do mundo e, claro, seu interesse em revisitar o passado, mas não com um intuito saudosista, escrito com a pena da melancolia, longe disso, ao julgar pela frase que lhes trouxe no início desse texto, <i>Antes</i> não pode ser considerado uma ode ao passado motivado por um tolo sentimento nostálgico qualquer.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Para o leitor ocasional, <i>Antes </i>parece um passeio pelas reminiscências de uma cidade que não existe mais, por encontros com pessoas que foram parte da vida do autor, em especial. É quase, como disse, um relato autobiográfico, mas não se trata somente disso, veremos que o que une os textos escritos em uma linha cronológica tão irregular é justamente o interesse do autor em não fazer do passado um tempo findo, do mesmo modo, o futuro não daria todas as respostas que se procura. A solução seria justamente o que propõe em uma dos textos desse livro: não retalhar o tempo, vivê-lo assim, todo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Pensando desse modo, o cronômetro, a linha cronológica, o caléndario e o relógio nada mais fazem do que nos mostrar isso: que o tempo possui esta inexorável função de ser passado, esses objetos que a humanidade criou servem apenas ao corte, ao retalhamento da experiência. A areia da ampulheta lentamente se esvai para o compartimento inferior e isto é, desde os tempos mais antigos, sinal de que o tempo não espera por ninguém, o tempo tem em si mesmo o trabalho de correr.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Pontalis nos apresenta em "Quando", a crônica que abre <i>Antes</i>, um tempo em que tudo parecia mais fácil, menos politicamente correto, um tempo em que ia " a Rolland Garros assistir às partidas de tênis e os jogadores se vestiam de branco, não exibiam os punhos como se fossem atingir o adversário, e os espectadores, atentos e silenciosos, não vociferavam do alto das arquibancadas" (p.9), ou mesmo um tempo em que " meu pai estava ao meu lado, quando todos os meus amigos, todos aqueles que eu amava, estavam vivos" (p.11). Esse texto talvez seja um dos mais nostálgicos de todos presentes nesse livro, na minha opinião o mais bonito, desses que a gente leva com a vida, como um belo presente que somente a gente pode abrir, não importa quantas vezes eu o leia, para mim parecerá sempre muito bonito. No entanto, não se trata apenas de nostalgia.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Muito embora o autor conceba a memória como uma "bolsa de mulher", onde cabe de tudo, desde itens indispensáveis à itens fúteis,os relatos não marcam essa posição de que o tempo de antes era melhor, não se trata disso. Trata-se de conter todas as idades, em esquecer o que marca o tempo, portanto, quebrem ampulhetas, destruam o calendário, porque quando se trata de uma existência, a linha cronológica não é suficiente.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Não seria por acaso essa recusa de Pontalis em retalhar o tempo. Vejamos o que é típico da experiência analítica: passado, presente e futuro se confudem e não obedecem a nenhuma lógica temporal.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Freud nos ensinou que somos todos neuróticos, psicóticos e perversos, todos, sem exceção, marcados pela ferida desse tempo que insiste em cristalizar nossas esperanças. Sofremos de excesso de passado e de ânsias de futuro. Sofremos, porque o tempo não passa no inconsciente, o tempo é essa ferida sempre aberta que nos revela o quanto podemos ser ilógicos. Tomemos a experiência do sonho como um protótipo do funcionamento do inconsciente.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Desde <i>Traumdeutung</i> sabemos que o funcionamento do inconsciente não se submete às leis que criamos para contar o tempo. Dito de outro modo, o inconsciente não responde ao retalhamento do tempo, ao movimento da areia dentro da ampulheta. No sonho o passado volta como esse fantasma que nos espreita e nos atinge a cada vez que dormimos. Somos guardados pelo sonho, mas, ao mesmo tempo, somos assombrados pelo tempo que não parece varrer o que é mais importante.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">"E o agora é agora. E agora é hoje, ontem e amanhã. Nós, os humanos, sentimos e acreditamos que o tempo passa, alegamos que ele corre e, quanto mais envelhecemos, mais depressa ele se vai. Mas o Tempo (assim, com maiúscula) ignora que passa, é imóvel, não tem idade"(p.18)</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Esse pequeno trecho de "Quando" nos mostra a premissa básica que temos diante dos olhos e com a qual devemos ler todo o restante dos textos reunidos no livro. Em outra crônica, "Travessia", o autor nos relembra a saga de Ulisses e de sua eterna Penélope, a espera, a fiar e desfiar um tecido para enganar o tempo, para matá-lo. Isso me lembra Machado de Assis, e o seu "Matamos o tempo, e o tempo nos enterra". </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">A vida como travessia, parece não existir metáfora mais bela do que esta, estamos a atravessar mares, a vencer monstros, a resistir às sereias de belas vozes para, enfim, nos reencontrarmos, de volta à Ítaca particular de cada um.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">No texto "Origens", Pontalis nos guia pela mão e tenta explicar o antes onde não há antes, onde havia uma certa origem. Voltando à história da teoria psicanalítica, o autor nos lembra que Freud era um entusiasta da arqueologia e faz da própria invenção uma empreitada arqueológica, "sem regressão, nenhum avanço é possível" (p.71). Também faz uma breve alusão à Etiologia como o ramo da ciência que se debruça sobre as causas. Seria causa o mesmo que origem? Talvez esse seja um dos questionamentos mais interessantes desse texto.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Segundo o autor, causa e origem diferem entre si, uma vez que a primeira pode estar afastada do evento que ocorre, por exemplo, causas de uma guerra, de uma revolução não precisam estar alinhadas no mesmo tempo, podem configurar épocas diferentes. Já a segunda, esta seria a causa das causas, ou a origem que escapa ao retalhamento do tempo. Para Pontalis, assim, a origem seria um antes que não tem antes. Mas, e antes? A angústia?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Não sabemos o que o tempo quer de nós, mas sabemos que é próprio da vida passar. E é isso que temos, tudo o mais está na origem e está na angústia. Não foi isso que aprendemos com os fenomenólogos? Com Russerl e Heidegger, quando estes concebem que o verdadeiro propósito da vida é a morte em si e isto seria a maior das angústias?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #444444;">Sabendo disso</span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="color: #444444;"><a href="http://staging.printeccomunicacao.com.br/wp-content/uploads/2013/12/1Antes.png" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" src="http://staging.printeccomunicacao.com.br/wp-content/uploads/2013/12/1Antes.png" height="182" width="320" /></a></span></div>
<span style="color: #444444;">, portanto, parece que a angústia prenuncia uma vida que fatalmente irá passar, mas podemos nos recusar a retalhá-la, podemos rechaçar as idades e vivê-las todas em uma só, essa é a proposta de Pontalis. Apesar disso, fica a dúvida, sem o retalho do tempo, das idades, dos relógios, estaríamos imunes à angústia?</span><br />
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">"Nossas vidas, uma agonia adiada" (p.72). Parece que o prognóstico não é bom, não há como escapar à angústia ou ao tempo que se retalha, mas há, há sim como buscá-lo nos começos. O que há, então, nos começos?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br />Nos começos há olhares, há mãos que se entrelaçam, há pôr-do-sol, há belas canções. Para Pontalis, nos começos, há o amor. O amor é isto que adia a agonia, é isto que ao invés de paralisar o tempo, brinca com ele, diverte o tempo. O amor dos começos é o que nos permite sonhar e viver o tempo todo ele em várias idades. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">E nos começos é o amor de todas as idades em uma só. Eis aí o que Pontalis nos ensina, portanto, vivamos todo o tempo, sonhemos que podemos contê-lo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<br />Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-8167949778523796772014-06-02T22:56:00.001-03:002014-06-03T01:31:15.468-03:00Luc Ferry e o amor aonde não se pensa<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://thumbs.buscape.com.br/livros/do-amor-uma-filosofia-para-o-seculo-xxi-luc-ferry-8574321303_200x200-PU6eb62a42_1.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" src="http://thumbs.buscape.com.br/livros/do-amor-uma-filosofia-para-o-seculo-xxi-luc-ferry-8574321303_200x200-PU6eb62a42_1.jpg" /></a></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Ultimamente não são raras as abordagens sobre como a contemporaneidade tem destruído e solapado os ideais e tradições pelos quais o homem tanto lutou e dos quais a História vem a ser o discurso testemunhal mais verossímil.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Podemos dizer que os tempos de hoje são tempos sombrios, tempos em que a humanidade deu as costas, ou minimamente deu de ombros para o sofrimento do outro homem. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Sim, sem dúvidas, não existe menos egoísmo e maldade hoje do que existiu em outros tempo. Devemos ser justos, e também cuidadosos para não cair na armadilha frequente em que muitos caem: a de entender a contemporaneidade como tempos terríveis, tempos apocalípticos nos quais não é possível vislumbrar nenhuma fagulha de empatia, de interesse pelo próximo, de esperança. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><i><b>O amor aonde não se supõe</b></i></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">É a isto que se presta Luc Ferry em seu "Do amor: uma filosofia para o século XXI", o autor, que já foi ministro da Educação na França, é filósofo e extremamente cuidadoso em apontar o que considera um segundo humanismo, uma época em que há, mais do que em qualquer momento histórico, um interesse genuíno, um amor verdadeiro pelo outro que chega a transcender ao alcançar as esferas políticas em que os homens estão engajados e nas quais se entrosam publicamente.</span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">Seria a tese de Ferry absurda? Incoerente? ingênua? Precaução e cuidado é o que o leitor mais atento e curioso encontrará nesse livro, pois o humanismo de que fala Ferry não é ingênuo, inclusive bate de frente com a hipocrisia que caracterizou a Idade Média, por exemplo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">A questão a que se detém Ferry é que o amor é a verdadeira revolução - Inclusive, "A revolução do amor", é o título de outro livro do mesmo autor - que permite as pessoas se colocarem no </span><span style="color: #666666; font-size: large;">lugar do outro, a lutarem pelos ideais do outro, esse outro assume o lugar de amado, em todos os níveis, amado como amante, amigo, </span><span style="color: #666666; font-size: large;">como aquele com quem eu evidentemente simpatizo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Ou seja, o outro, esse meu íntimo me inspira a um amor que é tudo isso junto: amor-carnal, amizade, caridade - philia, ágape e eros - e este modelo irá nortear as relações que teremos e que vivenciaremos em sociedade.</span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">Para alguns essa tese parece absurda, dirão os mais catastróficos que essa visão de Ferry é completamente incompatível com o que vemos, com o que acompanhamos nas notícias de jornal. Afinal,</span><span style="color: #666666; font-size: large;"> somos diariamente levados a crer justamente no oposto do que Ferry defende: os novos tempos são tempos difįceis, sombrios em que a violência e a maldade estão institucionalizadas. </span><br />
<br />
<span style="color: #666666; font-size: large;">Outro dia ouvi justamente isso de uma pessoa na rua:) "hoje em dia </span><span style="color: #666666; font-size: large;">é assim, a violência comendo solta, antigamente ninguém via filho matar pai e mãe!"</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Luc Ferry antecipa as críticas que certamente foram e serão endereçadas a ele ao inclusive não negar que vivemos tempos violentos. No entanto, se o autor corrobora a ideia de que estamos vendo cair diante de nossos olhos os ideais tradicionais, também nos relembra a maldade e a violência que marcaram os tempos antigos, imemoriáveis? Alguém esqueceu dos massacres ocorridos na Idade Média?</span><br />
<br />
<span style="color: #666666; font-size: large;">Por isso, cabe a lembrança:</span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">" É fácil denunciar as mazelas do tempo atual, as desigualdades, a crise econômica, mas é infinitamentr mais difícil arriscar-se a evocar alguma época de ouro. [...] digam o que quiserem, nossas democracias oferecem espaços de liberdade até então inauditos, além de um permanente cuidado com o outro [...]" </span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">O trecho é claro e as ideias que evoca são mais ainda. O que devemos fazer é desconfiar de todo um discurso pré-fabricado que muitos assumem meio com pressa, tomando-o como verdade e como justificativa para repetir o que se expressa com o mais ingênuo</span><span style="color: #666666; font-size: large;"> senso-comum: "É, hoje em dia tá demais!".</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">O que esse "tá demais" imediatamente provoca é justamente isso: será que as outras eras experimentaram menos violência, menos crueldade? Ao contrário, e na verdade, na contramão do que muitos dizem, Ferry sugere que o humanismo concretamente situado em ações humanitárias nunca foi tão grande.</span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Mas, o que leva a essas ações humanitárias, senão o amor, arduamente construido entre duas pessoas? É esse o próximo tema que interessa ao autor.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Como nos ensina Ferry, foi na família que o amor passou a ser central, acabando com o casamento escolhido para manter as linhagens da nobreza. </span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">O casamento na modernidade vai ser profanado, vai esquecer do sagrado no sentido cristão ao assumir sua face erótica e vai, surpreendentemente, marcar as relações políticas ao escapar da esfera privada. O amor</span><span style="color: #666666; font-size: large;"> reinventado não é cristão e subverte a noção de sagrado como puro, medroso do corpo. O amor erótico assume esse corpo e se legitima</span><span style="color: #666666; font-size: large;"> a partir dele.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><b><i>O amor erotizado</i></b></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">O amor, assim repaginado, não prescinde do eros e legitima o corpo como lugar em que será sacralizado. O sagrado recupera a significação de ser " aquilo pelo qual se pode morrer". Ora, se não se morre mais pelos ideais antigos - Pátria, Revolução e Deus - morre-se por amor, por amor aos que nos são caros, por amor aos que nos são íntimos.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Morre-se e se sacrifica pelos filhos, inclusive, esse amor filial é um amor que é recente, pois não é novidade que na Idade Média, não havia muita diferença entre a morte de uma criança e a morte de um cavalo. Falaremos mais disso adiante.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Sendo assim, esse amor, sai dos limites do privado e adquire uma substância pública a qual podemos ver representada nas ações comunitárias ou no sentimento mesmo que faz nosso coração apertar diante do sofrimento alheio, diante da dor do outro.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Essa é mais ou menos o cerne das ideias que nos são apresentadas em "Do Amor" , explícita alusão à Stendhal. Esse amor que nos faz perceber aquela característica específica do objeto amado, aquilo que nos faz percebê-lo como único: " Isso é tão seu!" se torna o elogio mais sincero que alguém pode receber.</span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">É isso que faz o ser amado ser amado: ser ele. Ferry lembra Montaigne " porque era ela, porque era eu". Obviamente, eu lembro de Chico Buarque: </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Eu não sabia explicar nós dois</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Ela mais eu</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Porque eu e ela</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Não conhecia poemas</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Nem muitas palavras belas</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Mas ela foi me levando pela mão</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Íamos todos os dois</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Assim ao léu</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Ríamos, choravamos sem razão</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Hoje lembrando-me dela</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Me vendo nos olhos dela</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Sei que o que tinha de ser se deu</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Porque era ela</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Porque era eu</span><br />
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><i><b>O amor pelo qual se mata e morre</b></i></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">O que me parece interessante na visão de Ferry é justamente como as pessoas fazem essa transposição ou mesmo tradução, não sei se os termos são válidos, como as pessoas trazem esse amor antes destinado ao privado ( e somente depois de muito tempo isso ocorreu como amor erótico) para as ruas e se tornar argumento pelo qual se sacraliza o humano. Dito de outra forma, o amor é o único motivo pelo qual se vale a pena morrer. Talvez nisso é que precisamos nos concentrar.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Penso agora nas grandes tragédias, nos linchamentos em via pública tão irremediavelmente relacionados aos tempos das fogueiras da Inquisição. Eu mesma pensei e associei prontamente um episódio recente de linchamento em via pública no Brasil com a condenação das bruxas medievais.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"> Hoje não penso mais assim, há vários indícios de que essas eras mais se afastam do que se relacionam entre si, medievalismo e contemporaneidade estão afastadas por quilômetros de distância. É outra coisa que está em jogo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Quando se espancou uma mulher, mãe de dois filhos, em praça pública, viu-se claramente o argumento de muitos envolvidos na cena triste, abominável , que se desenrolou se repetir: " eu espanquei porque estavam dizendo que ela sacrificava crianças em rituais de magia negra". </span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">Não seria a identificação com o pai que teve o filho morto, um dos motores para que houvesse o engajamento nessa cena bárbara que foi exaustivamente reproduzida pelos noticiários há um mês atrás?</span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">Com isso não quero me esquecer do lado dionisíaco que vive no sujeito desde que o mundo é mundo, não é essa proposta, não estou esquecendo aqui da catarse perversa que ocorre quando alguém se lança a espancar uma pessoa no chão, a chutar cachorro morto.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">A questão é: o amor, levado ao extremo, pode, sim, servir de argumento para ações que paradoxalmente nada tem que ver com o amor? Estranho? Não acho, pois não é de hoje que se mata por Deus, mas, será que Deus aprovaria a matança feita em seu nome?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Será que Deus separaria os seres entre os que amam pessoas de sexo oposto ao seu e faria uma fila diferenciada destinada àqueles que amam pessoas do seu mesmo sexo? Não. Mas esse é um argumento bastante propagado por aí.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Morre-se e mata-se por amor, lincha-se por amor, por simplesmente pensar que alguém possa ter feito algo tão cruel com uma criança. Eu , linchador, sou , portanto, idêntico àquele que lincho, só que, neste caso, a mulher espancada até a morte era inocente e também tinha filhos, que hoje choram por não terem sua mãe.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">A leitura do amor a que nos apresenta Ferry é chamada por ele de segundo humanismo, um humanismo que estaria , por assim dizer, livre das ilusões metafísicas, pois a única transcedência pela qual se interessa é a transcendência sem Deus, uma transcendência levada à baila por conta da imanência humana. É pelo que grita de mais humano em nós que podemos amar o outro - e também odiá-lo.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><b>O amor, afinal</b></span><br />
<span style="color: #666666; font-size: large;"><b><br /></b></span>
<span style="color: #666666; font-size: large;">O amor é isso, mais do que o tal do fogo que arde sem se ver. O amor é alçado a argumento e legitimado nas regras do bem viver, no ethos contemporâneo e isto pode nos levar ao mesmo tempo a uma existência mais amorosa, como também a uma guerra sem precedentes. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Ferry prefere a esperança ao pensamento catastrófico. Eu também, e se nunca chegaremos a uma sociedade que viva plenamente o amor ao próximo, ao menos podemos viver numa sociedade menos hipócrita que convive , tanto com o aumento dos números de casamento, como com o igual aumento de número de divórcios.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;">Um exemplo de como a contemporaneidade nos promete várias possibilidades simples e notório: Hoje nos permitimos nos divorciar quando o amor acaba, nos outros tempos, dos casamentos arranjados, as pessoas se aturavam eternamente.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"><br /></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-size: large;"> Vamos pensar mais nisso, vamos ao menos considerar as vantagens da contemporaneidade ao invés de tacar-lhe pedras nostálgicas vindas de um "tempo bom" que nunca existiu.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-23735965285107050342014-05-26T20:43:00.002-03:002014-05-26T23:54:41.477-03:00Merleau-Ponty e ressonâncias na clínica psicanalítica: um barco, a arte e um mundo velho sem porteira<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">O mundo é mais velho do que a nossa consciência que dele temos. Assim deve ser apresentado a nós um dos mais importantes filósofos do século XX.</span></div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">O que começou pra mim como uma disciplina do programa de pós-graduação que faço, acaba como uma surpresa que em muito me auxilia a pensar o meu fazer como curiosa sobre as questões que atravessam o humano.</span></div>
</div>
<div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Merleau-Ponty (1908-1961), como se percebe, morreu cedo, morreu ainda com muita coisa a dizer, e por isso mesmo, pelo que não disse, é que vem sendo redescoberto hoje em dia. Seu discurso reverbera na Psicologia, na Psicanálise, na Antropologia, ultrapassando os limites do filosófico por sua capacidade de se relacionar ao que é próprio da contemporaneidade e ao que é inerente ao humano.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Faço um recorte aqui de coisas que muito me interessam na filosofia merleau-pontyniana, a saber, a repercussão de sua concepção de linguagem e a incapacidade da palavra de conter o significado, o fazer da análise e o papel do artista como quem promove o novo.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Sobre a Palavra, para o filósofo, ela é um compartimento limitado que aponta para sua vulnerabilidade. A fala, nesse sentido, seria um tecido imenso dobrado pela linguagem, e o que seriam essa linguagem senão o próprio jogo relaciona pelo qual apreendemos o significado das coisas?</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"> Para entender melhor o que diz Merleau-Ponty: contrário às ideias típicas do idealismo, ele vai além, e entende que o mundo não necessita da representação, que dele fazemos, as ideias e os conceitos não seriam a maneira correta de viver o mundo. É aí que pensamos a linguagem, como possibilidades infinitas de dizer e , ainda assim, não dizer tudo, porque nunca existirá uma linguagem completa, uma r</span><br />
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">r</span><span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">epresentação nunca valerá mais que a própria coisa, por isso esse jogo é eterno, o jogo dos significantes.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">O sentido de uma palavra seria sempre ultrapassado pelo próximo sentido para aquele que dela faz uso. Sendo assim, não nos cabe saber o mundo e cobri-lo de palavras, o que nos interessa - aí notamos a influência de Husserl - é como vivê-lo e experienciá-lo. Mas ainda assim, estamos presos à linguagem, dela é preciso fazer brotar algo.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">A linguagem é ambígua, notívaga, a linguagem é misteriosa e provocadora, ela nos incita a vivermos o mundo e vivermos na originalidade, dispensando o constituído, nos entregando a experiência única do constituinte.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Toda essa noção acerca da linguagem descortina o que é a visão de mundo de Merleau-Ponty, uma visão fenomenológica, husserliana, disposta ao encontro, à busca </span><br />
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">da originalidade, parceira do advento como encontro com a alteridade. </span><br />
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span>
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Merleau-Ponty, em suma, é o desvelamento da verdade como surpresa. E isso é o que a linguagem nos providencia: uma surpresa, por ser polissemia. A clínica parece deixar tudo mais claro.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Sinceramente essas ideias me parecem claras quando nos voltamos novamente para a clínica, não como uma tentativa de fazer uma coisa como "clínica filosófica", visto que o filósofo não pensou um modelo de clínica. O que podemos pensar é a visão de mundo, uma proposta de filosofia que ressoe no que fazemos na clínica, na escuta mesmo do que diz um analisante, estamos inundados de palavras e linguagem.</span></div>
</div>
<div>
<table align="center" cellpadding="0" cellspacing="0" class="tr-caption-container" style="margin-left: auto; margin-right: auto; text-align: center;"><tbody>
<tr><td style="text-align: center;"><a href="http://vejabh.abril.com.br/imagem/2315_rot_expo01_dest.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: auto; margin-right: auto;"><span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><img border="0" src="http://vejabh.abril.com.br/imagem/2315_rot_expo01_dest.jpg" height="228" width="400" /></span></a></td></tr>
<tr><td class="tr-caption" style="text-align: center;"><i><span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Educação para adultos (Jonathas de Andrade)</span></i></td></tr>
</tbody></table>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Para pensar a clínica e sua relação com essa linguagem parcial, não-toda, eu penso em uma metáfora.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">A figura do analista e do analisante como os dois ocupantes de um barco, a remo, cercado de um mar de linguagem em busca de uma espécie de ilha paradisíaca (Verdade?). É essa a imagem mental que tenho quando conecto Merleau-Ponty à Clínica Psicanalítica, ou a noção lacaniana de clínica.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Estamos os dois perdidos nesse imenso mar de linguagem, molhando-nos constantemente e sem qualquer garantia que alcançaremos um pedaço de chão, um território seco. O que temos pela frente é só imensidão e ondas, e dobras, e palavras, e corpos que remam.</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Se essa imagem é por vezes aterradora, ela não deixa de ser, de alguma forma, potencialidade, possibilidade. Nos lembramos facilmente de Lacan quando se pensa seu clichê mais famoso: o inconsciente é estruturado como linguagem. Há aí Merleau-Ponty, evidentemente.</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Ainda fazendo uso da metáfora que propus: o tesouro de significantes, do qual Lacan nos fala, é o trabalho, é o mar que navegamos, é o que temos para chegar - ou não - em algum lugar, e como nosso barco é frágil!</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">A linguagem, esse mar de palavras que necessita ser navegado -Navegar é preciso! Nos coloca frente a frente ao mistério do qual nos lembra Merleau-Ponty: o significante é metonímico, ele desliza, derrapa, muda e nos muda. A palavra deixa evidente que ela é menos do que parece, a palavra é o que habita essa mar que incessantemente navegamos privados de bússola, nós, analista e analisantes.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Portanto, dizemos muito e ainda deixamos claro que dizemos muito pouco, mas ainda assim, é o que o analista tem como meio de se chegar a algum lugar. Pois, como se chegaria a uma ilha desconhecida sem nos aventurar ao mar do "tudo é possível"?</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Como o mar, a linguagem é imprevisível. Muita coisa ocorre em seu universo subaquático: peixes, perigos, movimentos tectônicos. E lá estamos nós, na superfície, imbuídos num trabalho hercúleo de navegar, sempre, mas nunca precisamente!</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Deixando um pouco o mar de lado, e voltando à terra...</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Descolar palavra de sentido e oferecer ao signo a possibilidade de tudo ser parece ser a riqueza de relacionar a filosofia merleau-pontyniana à clínica psicanalítica, que tanto ouve, que tanto se interessa pela plasticidade do significante.</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Ora, não seria esse o papel da análise? Possibilitar outras saídas, um mundo sem porteiras, para que a cristalização e a patologia não encontre espaço? Promover uma abertura ao mundo para que nele possamos criar? Para que dele possamos nos apropriar, povoando-o com linguagem, sempre abertos à experiência?</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Uma última consideração gostaria de fazer aqui. O interesse de Merleau-Ponty pela arte também é algo que o une à Psicanálise, parece que a arte sempre tem um estatuto de a priori no tocante à concepção de mundo. E isso é </span><br />
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">revigorante, seja na Filosofia, seja na Psicanálise.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Para Merleau-Ponty, o artista é aquele que promove o novo, que sai do instituído e promove uma torção, uma promiscuidade da linguagem, da palavra, da coisa em si mesma. O artista, esse privilegiado, seja na visão do filósofo, seja na concepção freudiana, promove essa prostituição das "coisas como elas são" ao romper com o que está aí. Ele é a promiscuidade.</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Aqui um ponto que quero acrescentar, na esteira do que venho desenvolvendo. Ao ler Merleau-Ponty e sua concepção de linguagem como o ambíguo, me foi possível lembrar de uma obra de arte intitulada "Educação para adultos", em que percebemos claramente o papel do artista como o aquele que age sobre as "máquinas infernais de significação" (termo de Merleau-Ponty para descrever o que seria um livro). </span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Nessa obra, o artista propõe trinta cartazes utilizados na alfabetização de adultos ( impressos entre as décadas de 70 e 80 do século passado) e sugere que haja a confeção de novos cartazes em busca da produção de sentidos, de novos sentidos que não os que foram instituídos pela relação, pronta e acabada, impressa nos cartazes, entre imagem e signo, que alguém disse que seria importante para alguém que quer aprender a ler.</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Não pretendo aqui discorrer sobre alienação e opressão social, apesar da obra fazer essa discussão e de se utilizar Paulo Freire como referencial. Aqui, por questão de tempo e afinidade, prefiro centrar minha reflexão na questão do artista como o que promove o novo e seu compromisso com a torção da linguagem.</span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">A obra consiste na apresentação de um painel de sessenta imagens, uma tentativa de tabela de correspondência "Imagem-Signo", dispostas não aleatoriamente, o que nos revela a polissemia de sentidos ( por vezes irônico) produzidos pelos novos analfabetos que produziram os trinta cartazes restantes na construção do painel. </span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Constituído e Constituinte se entrelaçam e nos mostram duas coisas: a promiscuidade da palavra, como ela pode servir a diversos usos, e a possibilidade de descontruir o mundo, o mundo como representação pela visada de um novo mundo, em eterno processo de redescoberta.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Ao fim de tudo isso, paro pra pensar que somos tudo isso, navegantes e artistas, psicanalistas, </span><span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">dispostos a navegar, a promover o que reverbere no Outro. </span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;">Se chegaremos a algum lugar, isso é o que menos importa. O que importa é abrir esse mundo e deixá-lo escancarado. Obrigada, Merleau-Ponty, por abrir as porteiras desse mundo velho!</span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: large;"><br /></span></div>
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Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-90234801861453592892014-04-28T21:08:00.002-03:002014-04-29T00:11:23.614-03:00O filósofo, esse inocente, não sabe de nada.<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-size: large;"><b style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace;">" Não mais que qualquer um, o filósofo não sabe muita coisa do mundo</b><span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace;">"</span></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Essa frase foi proferida por Charles Melman e eu só a conheci hoje, quando busquei na biblioteca seu livro sobre as novas formas clínicas de patologia mental. Até aí tudo bem, nada de novo no front.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Como eu persigo a ideia de que nada que me chega aos olhos me chega por acaso, conheci esse texto horas antes de ter a oportunidade de assistir em aula um seminário preparado por colegas de sala sobre a Filosofia de Nietzsche e, mais precisamente, uma acalourada discussão sobre como juntar seu pensamento niilista às formas de se fazer e inventar a clínica na contemporaneidade. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: large;">Um desafio em potencial, mas tanto Melman, como a aula de hoje me fizeram pensar muito sobre as possibilidades que estamos usando para re-significar nossa existência, sobre como vivemos nossa vida. Enfim, muitas questões efervescem em minha mente.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: large;">Eu vim caminhando para o albergue em que toda segunda-feira me instalo na companhia de várias interrogações as quais insistiam em apertar o passo, e eu digo, demorei para alcançá-las, até que fui surpreendida pelo advento, pela assertiva em forma de insght que assustou os meus ouvidos e que fez tudo se transformar.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Logo tudo fez sentido, e esse texto é uma tentativa de unir, o que fala Melman sobre o sujeito da ciência e a filosofia nietzscheana que foi discutida na aula de hoje ( e nisso não há pretensão, pois não me coloco aqui como profunda entendedora do autor alemão, mas apenas como alguém que o toma como interessante pensador que me auxilia a refletir sobre a clínica), isso tudo é devido ao encontro com a surpreendente lição que ouvi de um guardador de carros que cruzou meu caminho.</span><br>
<br></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Vejamos então como as questões se articulam.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Já há algum tempo que discutimos em sala os principais pensadores da Filosofia do século XIX e seu papel para repensarmos a clínica. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Já passamos por Wittgenstein e hoje foi a vez de Nietzsche, na verdade, em outras aulas pudemos compreender melhor a linha de pensamento do filósofo, mas é a atividade de seminário que torna possível e palpável a relação entre Filosofia e Clínica. </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: start;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Claro que Nietzsche é um mundo e eu não tenho a pretensão de aprofundar aqui uma crítica sobre seu pensamento, minha leitura é pouca, isso eu deixo para os filósofos e para os entendedores especialistas, comentadores de sua obra. </span></div>
<div style="text-align: start;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: start;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Mas há um ponto discutido hoje que me chama atenção entre tantos outros: a ideia de que Nietzsche não fora um filósofo do trágico, mas sim, um filósofo trágico, a ideia da tragédia perpassa sua obra e nos permite uma aproximação com a clínica e, claro, a meu ver, possibilita uma grata ressonância na clínica psicanalítica.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: large;">Em um texto interessante chamado "Nietzsche e o trágico: abertura para a valorização da diferença", eu li que ele tinha certa adoração por duas figuras: Wagner e Schopenhauer, apesar de romper com algumas ideias desses ídolos posteriormente, os dois nomes foram fundamentais para o pensamento nietzscheano e merecem menção. </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
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<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"></span><br>
<div class="separator" style="clear: both;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhVJY9l5_S2e0_4IMUK9upwCs5Xc_s7Yj7lAKnP5TMnvMYf-ey2eszcz_9yu0ZxaCDV7-8N1epnBl_BktN072T-0dsA4X-jPeqSiCx1n6Jbk1GV4WedmnkaXVH13Dl9Idjj3-Kw/s640/blogger-image-834953251.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhVJY9l5_S2e0_4IMUK9upwCs5Xc_s7Yj7lAKnP5TMnvMYf-ey2eszcz_9yu0ZxaCDV7-8N1epnBl_BktN072T-0dsA4X-jPeqSiCx1n6Jbk1GV4WedmnkaXVH13Dl9Idjj3-Kw/s640/blogger-image-834953251.jpg"></a></span></div>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">A tragédia, para Nietzsche, é a própria condição da existência humana, a dialética Apolínea e Dionisíaca nos torna, para sempre, seres em conflito entre o não preocupar-se e o entregar-se à vida, entre a ordem e o caos, e deste, há que nascer uma esperança. </span></div>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<br></div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Somos sempre seres apolíneos e dionisíacos e a tragédia consiste, segundo o texto citado, em aceitar a vida, o destino, em dizer um "sonoro sim à vida" ( Magalhães e Di Matteo, 2010), o que implica recebê-la com o que ela tem de dor e beleza. Isso é ser trágico para Nietzsche.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Essa aceitação da existência trágica me faz retornar ao texto de Melman citado aqui no início, sobretudo quando o autor sustenta a ideia de que a terra do sujeito do inconsciente é o exílio, é disso que se trata em Psicanálise e é isto que me faz pensar na estreita relação entre tragédia, em aceitar a vida em sua dor e em sua delícia ( me lembrei de Caetano) e exílio, este como pátria do sujeito inconsciente que, se não ignora o cogito cartesiano, não lhe reconhece como salvador da pátria.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">O que quero dizer é que, diante de todos os ensinamentos de Nietzsche dos quais não me julgo sabedora, essa noção de tragédia e da oposição entre apolíneos e dionisíacos, eu vejo o interesse maior da Psicanálise, qual seja, o entendimento de que há apenas um lugar para o alojamento do sujeito do inconsciente,e esse não é o cogito, não é a razão absoluta, não é Ciência, não é Deus, o sujeito do inconsciente é ateu e cético, eu suponho. </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">O desamparo é a prova da tragédia existencial da qual Nietzsche fala, e contra isso, contra a condição de desamparo, pouco se pode fazer. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">O desamparo, agora podemos dizer, lança luz sobre essa intrincada tragédia que construímos em nossa existência ( ex-sistência, nos adverte Lacan). </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Sendo assim, somos trágicos, pequeninos seres desamparados que , desiludidos com a Ciência e com a Religião - e nisso há sempre a lembrança de Nietzsche - não temos outra alternativa a não ser habitar o desamparo, mas, então, como fazê-lo?</span><br>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Como dizer um sim sonoro à vida, como abraçar esse exílio?</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Nesse ponto chegamos ao conceito de amor fati de Nietzsche, ou o amor ao destino, a vivência plena entre os pontos que estão em constante tensão, entre Apolo e Dionísio, o amor fati é poesia pura, e acho que é disso que se trata em Psicanálise.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Aqui volto à Melman quando este diz que na Psicanálise não se trata de remédio, pois não há o que se admnistrar. Aí a Psicanálise se distancia da Psicoterapia e das técnicas denominadas auto-ajuda.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Não há o que se administrar, não há fármaco capaz de dissolver a tragédia, não há polo vencedor na querrela inconsciente. Mas isso não significa que não há o que se fazer, aí há o amor fati.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Desse jeito, penso que reinventar a clínica e ser psicanalista é se lançar nessa labuta diária que é viver a tragédia sem por isso ser aplacado pelo desamparo, pela própria guerra.</span><br>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Fazer Psicanálise, arriscaria, é a arte do bem viver no exílio, é a arte de viver na corda bamba, e o que a torna arte é a noção de entregar-se à vida, ao amor fati, que implica também se responsabilizar </span><span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: large;">por suas escolhas, é se implicar na própria tragédia.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">O amor fati é assumir-se, é decorar o exílio com as cores mais bonitas e sabê-lo intransponível, é assumir-se e não depender de Deus, ou de Outro qualquer que retire o lugar de responsável pela própria tragédia.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Assim, entrar em análise é uma das coisas mais corajosas a que alguém pode se submeter, pois é lançar-se ao eterno e implacável Acheronte, e nossa arma sempre será o amor fati, o dizer sim, o que não é fácil e o que exige algo do que Nietzsche nos fala: dizer sim à vida exige liberdade, talvez a liberdade que o movimento niilista propõe.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Portanto, a liberdade seria o motor da tragédia, a liberdade seria o que estaria além do bem e do mal, o pleno trânsito do sujeito do inconsciente se dá por causa da liberdade, livre do cogito, longe dos grilhões morais, seria liberdade perante a religião, liberdade perante Deus.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Isso são apenas pensamentos que me acompanham desde quando comecei a compreender melhor Nietzsche. Aqui não tenho intenção de interpretá-lo com Freud, ou "usando" Freud. </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Cabe dizer que o ano em que Niezsche morre é o ano de lançamento da <i>Traumdeutung</i>, há algumas menções ao filósofo alemão na obra do pai da Psicanálise, o resto a gente associa por interesse e conta própria e nisso, repito, não assumo o lugar do sujeito suposto saber, só me interesso em aproximar mentes tão pertinentes para sua época e para a contemporaneidade.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Eu fiquei um bom tempo tentando achar a linha certa para costurar esses argumentos, a linha correta para iniciar o trançado desse texto trágico, e, por sorte, o acaso me encontrou e eis que surge a personagem fundamental e a quem eu devo esse texto e os insights que o costuram: o guardador de carros que eu vi na rua. </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Eu vinha atravessando a rua da faculdade, eu e minhas interrogações, estas sempre a minha frente, driblando os carros faceiramente, eu ia com mais calma e medo, passadas leves até ouvir o inesperado do tal homem que guardava os carros na esquina. </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Ao atravessar a rua, eu ouvi fragmentos de uma conversa quase inaudível, eram trechos soltos, mas o que ficou foi isso que ressoa em meus ouvidos até agora, disse ele para alguém, e eu não sei bem o contexto, mas ele disse bem assim: </span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<i><span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">"Solto ele já é, vamo deixar ele livre"</span></i></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Era o que me faltava para entender Nietzsche, obrigada, moço que eu não conheço, isso me faz perceber tão claramente a ideia de amor fati, a ideia do próprio exílio. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Soltos no mundo, desamparados todos somos, mas, sermos livres, eis o desafio, tanto para a filosofia trágica, como para a clínica psicanalítica.</span><br>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span>
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Não seria essa a proposta essencial do niilismo? Seria o guardador de carro um niilista por vocação e devoção?</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Agora me sinto em condições para recorrer à Melman pela última vez, e ouso complementar a frase que abre esse texto:</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">"O filósofo não sabe nada do mundo, mas o guardador de carros da rua, este sabe".</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;">Agora tudo se costura. Agora um alívio - temporário - para os percalços do exílio.</span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: Courier New, Courier, monospace; font-size: large;"><br></span></div>
</div>
<div class="separator" style="clear: both;">
<br></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-84544226250190949422014-04-24T02:22:00.003-03:002014-04-24T04:11:03.395-03:00Gabo, o livro póstumo ou como recorrer a Merleau-Ponty para não cometer
um crime<div style="text-align: justify;">
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<br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: black; font-size: 13.5pt;"><br></span><span style="color: black; font-size: 13.5pt;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">Em tempos de culto ao espetáculo, alguns eventos tornam-se mais ou menos
interessantes a medida em que a sociedade os reorganiza, os re-significa e os
faz parecer outra coisa nesta contemporaneidade da qual todos nós somos vítimas
e algozes.</span></span></span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Desde a última quinta-feira os jornais e programas televisivos começaram a explorar a figura de Gabriel
Garcia Marquez, para os íntimos, Gabo. </span></span></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><a href="http://4.bp.blogspot.com/-DAIVEmhEbvo/T1ac7ZAFd8I/AAAAAAAANFc/uK9P5T5yKY0/s1600/gabriel_garcia_marquez_1.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em; text-align: justify;"><img border="0" src="http://4.bp.blogspot.com/-DAIVEmhEbvo/T1ac7ZAFd8I/AAAAAAAANFc/uK9P5T5yKY0/s1600/gabriel_garcia_marquez_1.jpg" height="307" width="320"></a></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Gabo (me faço de íntima por economia
mesmo) andava um tanto quanto recluso devido a seus problemas de saúde, os
quais não eram segredo para seu ninguém, só que, quando morre um imortal,
quando morre um Nobel, devem ser rendidas homenagens colossais, assim foi com
Saramago, assim foi com tantos outros que certamente criaram um mundo melhor, mesmo que apenas na Literatura.</span></span></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;"><span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Não
sou contra as homenagens, mesmo que excessivas - o funeral durou muito tempo
até ser realizada a cerimônia de cremação. Não questiono aqui a importância do
defunto, nem a necessidade quase infantil - e culpada - de prestarmos todas as
reverências a alguém da estirpe de Gabo.</span></span></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Na verdade, por ser quem ele é, por
todos os livros que escreveu e os quais poucos eu li, confesso, eu não acho enfadonho
assistir as homenagens fúnebres e nem as edições jornalísticas que tentam
resumir sua importância em alguns minutos preciosos que cabem num telejornal. </span></span></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Eu sempre penso nisso: nos editores, naqueles trabalhadores que têm por ofício
realizar em suas ilha de edição, um breve resumo mais ou menos fiel à
importância do defunto, deve caber toda a obra de quem morre naqueles meros
dois minutos de exibição.</span></span></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Nesses preciosos minutos sobre Gabo,
há de se ouvir os nomes "Cem anos de solidão" e "Crônica de uma
morte anunciada", acho que caberia também "Memórias de minhas putas
tristes", este último nunca mencionado nos jornais e programas, o que me faz</span></span></span><span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: 13.5pt;"> questionar o motivo do 'esquecimento" de uma obra tão importante, apesar de
mais recente, do defunto célebre que ainda nem esfriou.</span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Divagações à parte, uma coisa me chamou
atenção nesse momento de comoção pela morte do escritor: hoje assisti a um
programa em que se falava da possível publicação de um livro que o autor não pensou em publicar. Consta que o seu editor pediu autorização à
família de Gabo para publicar o que viria a ser sua "obra
póstuma". </span></span></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<br></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Intitulado "Em agosto nos vemos",
sabe-se pouco sobre ele, mas o que se sabe é que em 1999, Gabo submetera
seu primeiro capítulo à audição pública. Somente o primeiro capítulo.Depois disso lhe coube o quase mais absoluto esquecimento.</span></span></span></div>
</div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">De 1999 para cá, muita coisa foi publicada,
inclusive “Memórias de minhas putas tristes” (2004) que foi um estrondoso sucesso de
crítica e público, o que contribuiu para <span style="mso-spacerun: yes;"> </span>o eterno adiamento da obra que se quer póstuma
agora. </span></span></span></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Qual seria o motivo, a razão pela qual “Em
agosto nos vemos” fosse relegado ao esquecimento, ao fundo de uma gaveta
qualquer? Segundo foi relatado pelo mesmo jornalista, talvez um dos motivos
para o esquecimento do livro tenha sido o fato de que Gabo nunca ficou satisfeito
com o ponto final que lhe cabia.</span></span></span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Apenas encerrar o livro, isto ele não conseguia.
Consta que foram seis, seis finais diferentes que Gabriel Garcia Marquez tentou
fazer funcionar em seu livro, mas que, ao que parece, não cumpriram o papel de
agradar o afamado escritor. O que aconteceu? Por que Gabo enganchado
nesse tal livro?</span></span></span></div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Talvez nunca saibamos estas respostas, mas
o que sabemos, neste momento, é que há um interesse do editor publicá-lo, e
agora que se deu a morte do criador, a criatura surgiria literalmente das
cinzas e se tornaria a obra póstuma a ser celebrada e honrada com todas as
honras e méritos que cabem a tudo que é póstumo.</span></span></span></div>
</div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Essa notícia evoluiu para uma interessante crítica em que se falou muito sobre
ética e sobre o desejo do escritor. Por essas surpresas que o destino nos
prega, acontece comigo acabar lendo algo relacionado com o que lera
anteriormente (mesmo dia) ou mesmo relacionar uma leitura da noite à algo visto
em jornal ou televisão mais cedo, por que acontece?</span></span></span></div>
</div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<br></div>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Eu sempre acho que é a mão do destino que
me faz à noite ler algo que corrobora ou se relaciona perfeitamente com o que
eu experimento ao longo do dia. Não sei dizer, mas sempre tendo para
explicações ocultistas. Não sei nem mesmo se há relação possível nesse momento,
mas faço-a, na cara dura.</span></span></span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: 13.5pt;">Não
sabendo se existe relação plausível entre o comentário que vi à
tarde e o que direi a seguir, eu insistirei, mas o caso é que para mim parece haver uma
relação, ou pelo menos, se não há eu a forcei.</span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">O que relaciono - a pulso ou naturalmente
- é essa questão do "livro póstumo" de Gabriel Garcia-Marquez a
alguns pontos da filosofia Merleau-pontyana. Na verdade, o que me interessa em
Merleau-Ponty é seu apreço pela arte e por esta ser um campo privilegiado em
sua ontologia. </span></span></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<br></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<br></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">A fenomenologia de Merleau-Ponty vem na esteira do pensamento de Husserl e trata do
resgate do Ser, fala também do interesse pelo Espírito Selvagem e outros bichos, mas o que
me fez relacionar "Em agosto nos vemos" a sua filosofia é na
verdade sua forma de conceber a arte como a própria experiência, como um
meio através do qual é possível realizar uma torção na linguagem, fazer
aparecer o inédito a partir do que está estabelecido. Todo meu argumento será
centrado nisto. E há tanto de lacaniano nisto, embora o autor seja um fenomenólogo...</span></span></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Marilena Chauí em recente artigo publicado
na Revista Cult sobre o filósofo nos apresenta alguns conceitos da filosofia e
da ontologia merleau-pontyanas, e diante do que expõe a autora, o que me chama
atenção é a possibilidade de ver Psicanálise em um fenomenólogo - isso eu não
acho forçado, também não sei se são os óculos que uso, quem sabe?</span></span></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<br></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Especialmente quando se trata de entender
que o artista, o escritor, o pensador realiza uma torção na linguagem ao
promovê-la ao mais além, ao levá-la a um lugar nunca antes habitado, este lugar
seria a própria experiência que não se encerra em um momento, a experiência -
bem dizer - nunca se esgota, e, consequentemente, o que foi dito, nunca será
terminado, porque, ao ser torcido e retorcido no exercício mesmo da feitura de
uma obra, já se cria outra coisa, já se cria um excesso e ao mesmo tempo uma
falta, excesso e falta estes que inevitavelmente levarão outros artistas,
outros escritores, outros pensadores a novamente torcer, retorcer e criar algo,
outra coisa, essa coisa é a experiência.</span></span></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<br></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Nesse rumo em que já estamos, fica difícil
não pensar que a questão polêmica entre publicar ou não o último livro inédito
ultrapassa os limites da ética, pois nos apresenta outras interrogações, o que,
para Merleau-Ponty, é um bom sinal, então, tendo o seu aval, sigamos.</span></span></span></div>
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Para o fenomenólogo em questão, só há obra
se há algo a dizer, nesse sentido, o excesso e a falta são inerentes a toda
obra e a esta cabe sempre o espanto, é esta, inclusive, a atitude que devemos
ter em relação ao mundo.</span></span></span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; text-align: justify;">
<span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: 13.5pt;">Então aqui eu chego ao ponto que desejo: como
seria escolhido um dos seis finais para o livro? Será que ficou algo escrito,
será que restou um último desejo de Gabo no que concerne à preferência de um final
em detrimento dos outros? Como o editor saberia? Como a família saberia?</span></div>
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span><br>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; margin-bottom: .0001pt; margin: 0cm; orphans: auto; text-align: justify; text-align: start; widows: auto; word-spacing: 0px;">
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
</div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Eu fiquei pensando em tudo isso e no
momento em que fazia minhas as interrogações que devem ser de muitas pessoas
que também assistiram ao programa hoje à tarde, eu pensava em Merleau-Ponty e
na sua forma de conceber a linguagem como prenhe de sentidos, como tudo aquilo
que escapa às significações. </span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Pensei também que dar um final a um livro
que nem o autor cogitou seriamente publicar soaria como um desrespeito a essa
mesma linguagem, misteriosa por excelência, experiência por vocação.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Dar um final e mais, publicar "Em
agosto nos vemos", me soa mais grave do que um problema ético, por mais
implicações que existam em um problema de cunho ético. Para mim, e agora eu forço,
seria o mesmo que cometer um crime.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Publicar e dar a este livro que já se sabe
problemático um estatuto de obra póstuma me parece um problema muito grande, a
começar pelo fato de que temos uma mania interessante de situar os autores, os
pensadores e o que eles pensam em um dado momento cronológico, assim temos
"o jovem Marx", "o velho Marx", e outro dia ouvi de alguém
que já se fala em um "ultimíssimo Lacan".</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Tenho medo que Gabo
vire o "último Gabo” “ O Gabo de Em agosto nos vemos", pois me parece
óbvio que este livro seria fruto do oportunismo editorial que adora esses
momentos de comoção para lançar algo "inédito", o "nunca visto" do
autor a quem são rendidas todas as homenagens. Acho até perigoso. Seria um
livro de Gabriel Garcia-Marquez ou do seu editor?</span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;"><br></span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Nesse exato momento penso em uma coisa: será mesmo que o melhor que se pode acontecer a um livro é ser publicado? Tenho medo do que esta reflexão pode fazer surgir. Mas vamos lá.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Tudo isto é perigoso</span></span></span><span style="color: #666666; font-family: 'Courier New', Courier, monospace; font-size: 13.5pt;"> porque, no sentido
merleau-pontyano, toda obra tem algo a faltar, tem um excesso que quase incita
as outras pessoas a retomarem o edifício construído e acrescentarem novas
pedras, para uma nova obra surgir.</span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Sendo assim, escolher um final seria proibir
qualquer outro dos cinco finais de existirem, de co-habitarem o mesmo espaço,
na folha de papel que, se foi escrita, não saiu a rua, não se expôs aos olhos
públicos. </span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Serei enfátic: Caso esse livro seja publicado, eu serei a
eterna viúva dos outros finais, estarei, ao ler, sempre pensando nos outros
cinco que por alguma razão não foram publicáveis, foram com Gabo para a última
morada.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">A publicação do livro que se quer póstumo
se torna não apenas um desrespeito à vontade do autor, mas também um problema
fenomenológico ao romper com a concepção de que toda obra é inacabada porque
vem alguém e a significa.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Claro que se pode pensar que não será a
publicação da obra que a tornará acabada, afinal, se assim fosse nunca deveriam
ter publicado nenhum livro, uma vez que o ponto final seria sua morte. </span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">E não
é isto, absolutamente, não penso que o ponto final retira do livro seu
potencial criador, ao contrário, o ponto final muitas vezes é o motor para que
pensemos em tantas coisas, para que criemos algo, o ponto final, é,
merleau-pontyanamente falando, o ponto de chegada onde vazio e excesso se
encontram, esborram e nos fazem criar.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">O que me faz pensar além do problema do
ponto final e na eleição de apenas um final, é justamente o fato que ler um livro assim seria um crime, e aqui novamente recorro à<span style="mso-spacerun: yes;"> </span>Merleau-Ponty. Segundo o autor, quando leio
um livro eu não penso como o autor, eu sou dentro do autor, eu sou o autor, eu
vivo a experiência. </span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Esse problema é muito mais interessante
aqui do que o ponto final e é ele que me causa a maior dor de cabeça. Meu medo
é justamente este, este medo de estar cometendo um crime, de fazer algo que de
certo Gabo não aprovaria. </span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Ora, se a literatura e a arte em geral possuem esse
estatuto privilegiado de chegar perto do Ser, e se o escritor e leitor se
fundem num só a viver a experiência da leitura, eu penso que essa experiência
eu viveria sozinha, sem Gabo.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;"> Eu só penso que a experiência de ler
"Em agosto nos vemos" seria algo meio proibido, algo assim para ser
feito escondido, eu penso que lê-lo e finalmente descobrir o tal ponto final
não seria algo que Gabo permitisse.</span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;"><br></span></span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Ao ler o que se quer
por "obra póstuma" eu estaria rompendo essa relação quase cúmplice
entre leitor e escritor, eu penso, na verdade, que Gabo acharia uma ousadia, e
assim, eu não pensaria dentro dele, eu seria apenas aquele que sorrateiramente
pegou umas páginas escritas por alguém que não desejaria que eu as lesse e
sempre estaria fazendo algo errado, algo criminoso.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Assim, estaria rompendo com a
própria experiência. Seria como um rato que meticuloso e sorrateiro invade a
casa alheia, e isso não evitaria que em toda página que eu virasse eu pudesse
ouvir o vozeirão do defunto a me interpelar: "O que você está fazendo?"</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Merleau-Ponty certa vez descreveu um livro
como "uma máquina infernal de produzir significações". Eu não vejo
melhor definição para um objeto, apesar da filosofia em questão desprezar
qualquer tipo de representação ou conceituação. Mas, vamos fazer um
esforço.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Talvez eu esteja sendo dramática ou até
mesmo pessimista, talvez a falta que certamente existiria no “livro póstumo” é
o que o tornaria célebre, é o que o tornaria prenhe de significados, cheios de
lacunas a preencher, talvez ele me lance a uma nova experiência, talvez ele, o
último, não venha com o peso do livro póstumo, talvez venha como uma
interessante descoberta, mas jamais virá com a cumplicidade terna que só observamos no verdadeiro encontro entre autor e leitor...</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Não importa, eu não vejo o "livro
póstumo" que ainda nem existe como uma máquina infernal de produzir
significações, porque sempre me parecerá romper com a cumplicidade harmoniosa
entre aquele que faz surgir do silêncio as palavras e aquele que as lê já
colocando uma ou outra palavra sua em cada página. </span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">O livro não será nem o último, nem o
primeiro Gabo, porque, como nos ensina a boa filosofia, o autor é tudo isso ao
mesmo tempo: passado, presente e futuro e não será o nome “póstumo” que me fará
vê-lo como uma consequência cronológica da obra de Gabriel Garcia Marquez.</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Por esses motivos citados, eu recuso ao livro póstumo e reafirmo aue se há
um Gabo ao qual recorro é o Gabo que é pura experiência, pura magia dos
sentidos, puro viver, eu sinto e vejo o colorido e o sol de "Memórias de
minhas putas tristes", com a cumplicidade carinhosa do autor que insistentemente
toca meu ombro a cada página que eu viro. </span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><br></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div style="margin: 0cm 0cm 0.0001pt; text-align: justify; word-spacing: 0px;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;"><span style="font-size: 13.5pt;">Este sim, me é permitido, este é uma
máquina infernal, este me abre o mundo, lhe dá forma, cor e sabor, mas,
esperem, isto é Fenomenologia!</span></span></span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Courier New",Courier,monospace;"><span style="color: #666666;">
</span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<br></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-90813843946049362492012-10-03T13:28:00.003-03:002012-10-03T13:49:43.182-03:00Melanie Klein e a jornada de Fabian: sobre a identificação<br />
<div style="text-align: justify;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhFQ8_V3PLacjs7kDaTbFqiR-DSoZSLQ-XOkma4cImawcGQpixZ62HGsi_PTEDKflptGZpT2MKFPqQfGZ4u4dYHh0En3OLCx35TA-xDTeJYx5p3JR00G5lmltV8L-A7_4gnzdEm/s1600/melanie_klein.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="320" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhFQ8_V3PLacjs7kDaTbFqiR-DSoZSLQ-XOkma4cImawcGQpixZ62HGsi_PTEDKflptGZpT2MKFPqQfGZ4u4dYHh0En3OLCx35TA-xDTeJYx5p3JR00G5lmltV8L-A7_4gnzdEm/s320/melanie_klein.jpg" width="244" /></a><span style="color: #666666;">Ao ler o primeiro capítulo do livro "Temas de Psicanálise Aplicada" (Zahar, 1955, organizado por Melanie Klein, entre outros) me deparei com algo que muita gente ainda considera novo: a análise de uma obra literária como ilustração de conceitos da teoria psicanalítica, como um bom motivo para estudar.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Para aqueles que acham que isto é novidade, a tal da interface, sinto dizer , mas desde Gradiva (1906) Freud tenta ilustrar sua teorização com algumas obras da Literatura, fazendo com que percebamos que, na verdade, o que interessa à Psicanálise é o humano e suas vicissitudes e disto a Literatura está repleta. A literatura ocupa um lugar precioso na Psicanálise, interessando também a outros teóricos que não apenas Freud. É o caso de Melanie Klein.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Melanie Klein é uma autora que nem sempre é valorizada como deveria. As pessoas geralmente associam a sua teorização com a clínica infantil, mas é importante que saibamos que os conceitos pensados por Klein são de extrema importância para o desenvolvimento ulterior da Psicanálise como estudo da subjetividade humana, Klein não é so Psicanálise infantil, ela é Psicanálise. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Além disto, seus conceitos de identificação projetiva e projeção fazem parte do material de estudo de todo aquele investigador que estuda os delírios e os mecanismos psicóticos em geral. Sendo assim, o que me interessa hoje é falar do capítulo chamado "Sobre a Identificação". </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Inicialmente, Melanie Klein preocupa-se em definir o que entende por projeção e introjeção e alerta para o papel essencial que estes conceitos relacionados exercem no desenvolvimento da subjetividade. Até aí, nos deparamos com uma teorização sistemática trazida ao leitor por meio de uma escrita fluida e objetiva. Klein consegue ser tão direta e assertiva como poucos teóricos puderam ser depois de Freud, aliás, tanto suas obras, como as de Winnicott me parecem bem agradáveis de serem lidas e compreendidas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"> No caso da autora inglesa, acredito que se fala muito sobre a dificuldade que cerca o entendimento de seus conceitos, quando, na verdade, a autora é aquilo que todo escritor deve ser: claro e preciso na defesa de suas hipóteses.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"> A grande ideia de Klein é que o bebê vive num mundo que é, em última análise, produto de suas constantes projeções e introjeções. Isto quer dizer que nossa vida deve ser , prioritariamente, produto dos objetos que internalizamos e projetamos no outro. Somos sujeitos que se constituem pela falta e pela fragmentação que permitem que encontremos no outro, algo de nós mesmos que considerávamos perdido.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Nisso vejo a beleza da teorização de Klein que neste ponto se associa à teoria de Freud, quando este diz que amamos no outro uma parte de nós mesmos que projetamos no objeto. (Psicologia das massas e análise do eu). Para amar um objeto é preciso - e isso deduzimos - projetar no outro partes do nosso ego que consideramos boas, é preciso ver no outro um quê de familiar para que possamos amá-lo, isto é a base de toda a identificação para Klein.</span></div>
<span style="color: #666666;"></span><br />
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Ao dizermos isto não estamos excluindo o fato de que também podemos projetar no outro partes do nosso ego que consideramos más - daí a formação dos objetos persecutórios que , nada mais são do que partes do nosso eu. Acredito que esta concepção lança luz sobre várias problemáticas contemporâneas acerca da violência e dos instintos agressivos. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Não podemos esquecer um dos temas preferidos dos estudantes de Psicologia: a subjetividade do psicopata, aquele, que hoje é melhor conhecido como alguém cujo transtorno de personalidade anti-social o levou a cometer crimes muitas vezes hediondos (para sermos cognitivo-comportamentalmente corretos).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Identificar-se com o outro é , por assim dizer, reconhecer em alguém as qualidades e os defeitos que separamos de nosso eu e mantivemos em uma galáxia muito, muito distante: isto serve tanto para eu amar o outro, como também para odiá-lo. Inevitável não pensar nos assassinos seriais e suas preferências sexuais, ou no caso de assassinos que preferem ou que apenas matam mulheres, uma vã tentativa de destruir o seio mau (de acordo com a teoria de Klein.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">O pensamento de Melanie Klein parece certeiro como a matemática: se introjetamos objetos bons advindos do meio, poderemos construir uma vida psíquica mais integrada e livre de fragmentação. No entanto, não existe impulso mortífero que não sucumba à necessidade de integração que todo ego possui. Por isso, a fragmentação nunca se dá por completo enquanto existe vida, isto é dito pela teórica.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Estas afirmações parecem indicar uma postura essencialmente positiva sobre as possibilidades do ego se reconstruir e isto se dá porque, desde que nascemos até o dia em que morremos, estamos nos relacionando com o mundo por meio destes complexos elementos que provocam os sentimentos de amor e ódio: estamos vivendo porque introjetamos o outro e sobrevivendo porque projetamos; sentimos culpa porque projetamos, do mesmo modo, podemos reparar um dano, porque nos identificamos. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Sendo assim, feliz daquele que pode encontrar os nostálgicos objetos maternos e lançar mão destes para reparar os ataques à mãe amada que o levaram a se afundar num mar de culpas.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">E a interface nisto tudo? Interessante notar que a leitura psicanalítica de um conto, de uma fábula ou qualquer trecho de uma obra literária nos permite vislumbrar o caráter poético do conceito que se pretende esclarecido através da ilustração. Talvez o interesse de Klein seja tão somente esclarecer os conceitos de projeção e introjeção através da obra de Julien Green, "If I were you" (não sei o nome em português), mas a obra abre espaço para tantas outras possibilidades...</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Um resumo básico do texto de Green que inspira Klein é o seguinte: um homem considerado por si mesmo mal sucedido e incapaz de atrair as mulheres, em um belo dia conhece alguém, que lhe permite fazer uso de uma fórmula mágica: poderia se transformar em quer que desejasse, havendo apenas uma condição para que tudo se desse tranquilamente: deveria colocar no bolso daquele em quem desejasse se transformar o seu nome original e o seu endereço, para que pudesse voltar, a qualquer momento, ao seu eu original. Nisto há um quê faustiano, aparece o Diabo e diversas tentações às quais sempre sucumbem os homens fracos (na verdade, todo homem).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">A estória é longamente contada por Klein para depois ser interpretada no melhor estilo "colocando a personagem no divã", o que, diga-se de passagem, não se costuma mais fazer em trabalhos recentes. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Apesar da patologização da personagem, sabemos que os conceitos que Melanie Klein parecem ganhar em poesia quando observarmos o troca-troca de "peles" que o sujeito da estória - Fabian - realiza para, afinal, constatar que nada melhor para o próprio eu do que reencontrar-se consigo mesmo depois de uma jornada conturbada para dentro da pele do outro, dos vários outros com os quais acaba sempre se identificando. Há sempre algo de familiar nos outros com os quais Fabian troca de pele.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Seguindo seu objetivo, Klein nos explica a estória da personagem-paciente, seus impulsos agressivos diante do pai, o sentimento de culpa gerado pela percepção dos objetos maus que foram capazes de lesar o outro, o sentimento edípico de Fabian por sua mãe que, ao mesmo tempo, permite que este perceba os objetos bons advindos desta e se reconciliar com a figura do pai, possibilitada pela aceitação da religião (o Pai).</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Acredito que estas poucas informações tenham deixado qualquer um que chegou a ler este texto até aqui no mínimo curioso. O que quero com tudo isso é chamar atenção para a beleza que estes conceitos engendram: apesar de muitas vezes estejamos falando de fragmentação, seio mau, agressividade, impulsos de morte, etc. Perceber desta forma seria apenas reduzir a tarefa de Melanie Klein.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Sendo assim, entendemos que estar na pele do outro acaba sendo a melhor forma de recuperarmos a particularidade de nós mesmos. Isto deve ser o fundamento do que a Psicologia Social chama de empatia, pois empatizar é, em última análise, "colocar-se no lugar do outro, como se ele fosse, adquirindo características deste" (Houaiss). E aí eu complementaria Antonio Houaiss: adquirindo as características do outro que, são, na verdade, minhas. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;"></span> </div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="color: #666666;">Para quê serve estar na pele do outro? Serve para nos constituirmos como sujeitos. A jornada de Fabian não foi em vão, aprendemos com Klein.</span></div>
Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-85111401935786113432012-04-26T02:05:00.000-03:002014-04-29T00:30:58.548-03:00O evento, o Real e Paul McCartney<br />
<div style="text-align: justify;">
<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgb-TdXl0PeGGWw_gEfQPhdBxl0vIIu6QOi19DhXXsmItEppcwxNLalOST9XAGMBAMbtGnE4yAlyRRRsFwnhE-hV9QpEvMU9F30jVqV8yff35s6U36KIUcyQIB-IT6FGOgoLU5c/s1600/100_1125.JPG" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="240" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgb-TdXl0PeGGWw_gEfQPhdBxl0vIIu6QOi19DhXXsmItEppcwxNLalOST9XAGMBAMbtGnE4yAlyRRRsFwnhE-hV9QpEvMU9F30jVqV8yff35s6U36KIUcyQIB-IT6FGOgoLU5c/s320/100_1125.JPG" width="320" /></a><span style="background-color: white; color: #666666;">O dia de 21 de abril de 2012 será lembrado como o dia em que me encontrei com o Real. Segundo os desdobramentos lacanianos. O Real é tudo aquilo que não podemos abarcar por meio de símbolos, o Real mais se aparenta com um acontecimento, com um evento. Eu lembro agora de outro momento, que talvez não tenha muita relação com o que eu estou tentando dizer, mas acabei me lembrando.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Lembrei agora de uma palestra de um filósofo que me chamou bastante atenção: ele falava de amor, falava da necessidade atual das pessoas disciplinarem o amor, higienizarem as relações a ponto de pouco sobrar para nos deixarmos arrebatar. Você poderia agora pensar: Filosofia, Real, amor?Como estes fatos se entrelaçam com o tal 21 de abril?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Vejamos os argumentos: segundo o tal filósofo, o evento seria algo que não podemos programar, algo que irrompe, que nos toma de assalto e tem a característica imútavel de ser surpreendente. O evento é um acontecimento e isto deve nos arrebatar, justamente porque não o programamos, ele apenas acontece e nos toma.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Poderia falar da consequência disto para as relações amorosas. Vou insistir no Real, e percebemos que o evento é parte do Real, é mesmo aquilo que não se inscreve. Vejamos: se estamos realmente envolvidos e tomados pelo evento, ele é o Real, aquilo que, por mais que tentemos, não conseguimos simbolizar.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Agora vem a parte mais interessante, voltemos ao dia 21 de abril de 2012. Deu-se o evento para mim, o evento verdadeiro. Inesperado, surpreendente. O que não posso simbolizar, mas tentarei porque sou um ser simbólico. A partir daqui, então, esqueçam os ensinamentos sobre Lacan e seu Real, esqueçam o filósofo e seu evento. Vamos ao que arrebata.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">O evento do qual falo é tudo aquilo que não consigo abocanhar com os símbolos dos quais aprendi a dispor quando cresci: Sou fã dos Beatles, minha identidade , minha vida como sujeito se formou junto com os quatro de Liverpool. John Lennon, Ringo Starr, Paul McCartney e George Harrison sempre foram para mim os amigos de infância que não tive, as pessoas com as quais compartilhei meus momentos mais marcantes, e falo isso sem o temor da pieguice. Falo apenas o que se dá.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Depois de vários anos de Beatlemania solitária, eis que o improvável acontece: surgem boatos em fevereiro que sir Paul McCartney se apresentaria no Nordeste, em Recife, cidade vizinha à minha. Esta seria a terceira visita consecutiva do ex-beatles ao Brasil, tamanha frequencia causava uma espécie de descrença por parte de todos os beatlemaniacos brasileiros: seria estranho Paul estar no Brasil, de novo, em tão pouco tempo, numa capital do nordeste que tem fama de ser megalomaníaca, enfim, em poucas palavras: não seria mais do que um boato.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Até que o impensável se dá: Paul realmente vem, e eu seria uma das pessoas que se cercaria de todas as informações possíveis sobre esta vinda tão estranha, e ao mesmo tempo tão esperada: eu estava arrodeando o evento, procurando me informar sobre as homenagens, sobre o set list , sobre tudo enfim que diria respeito a Paul. Eu estava tentando programar o evento, comprando ingresso, programando a viagem.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">O dia do evento chega, e falo evento porque assim ele é referido: o evento começaria às 21:30 da noite, em um estádio de futebol, e os portões se abririam ao público desde às 17:30. </span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Depois de muito tempo na fila, já sentia uma espécie de comoção por conta da situação, das pessoas do país todo que se espremiam e se maltratavam naquela fila quilométrica. Eis que entro no tal estádio e busco um lugar na frente. É interessante porque não me servia qualquer lugar, à despeito de qualquer advertência, de qualquer ressalva financeira, decidi gastar os tostões que tinha numa experiência que valeria por uma vida.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Às 21:35, aproximadamente, sir Paul McCartney aparece, eu digo aparece porque foi num lampejo, de um simples palco à espera, cheio de parafernalhas eletrônicas, instrumentos e pessoas trabalhando exaustivamente, ele chegou e tudo parecia fazer sentido, ou não fazer nenhum sentido. Pergunto-me agora a sensação que tive ao vê-lo ali, na minha frente, o homem das capas dos discos, o homem que está no quadro no meu quarto, na minha caneca preferida, enfim, era Paul McCartney. E falo isso</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;"> sem o temor da pieguice, insisto.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Aí entra o conceito de evento, como inesperado. Por mais que se houvesse anunciado o tal evento, o evento em si, o show, a visão de Paul ali, reluzente, vivo, elétrico na minha frente, era a personificação do evento, do inesperado que, por mais que tivesse sido esperado, acalentado nos melhores sonhos, a sensação reinante em mim era: como é possível?</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">Nesse momento estou buscando associações, revivendo as experiências sensoriais vividas no dia, e não consigo , de maneira alguma, transformar isto em palavras: estamos na seara do Real. Por mais que eu tente, por mais que existam registros de que realmente o show aconteceu, eu não consigo compreender como aconteceu.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">O Real é o que não se explica, naquele momento não filmei, não me preocupei em registrar o momento incessantemente por meio de fotografias; tirei algumas, mas ainda não acredito no que elas me mostram. O Real de Lacan se apresentou para mim ali, com Paul McCartney cantando todas as canções da minha infância e seminário nenhum iria me dar melhor definição do que vi, e precisamente do que senti, ao ouvi-lo cantar, ao alimentar meus olhos com a visão daquele que tão frequentemente habitou os meus melhores anos de vida - decididamente não temo a pieguice.</span></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div style="text-align: justify;">
<span style="background-color: white; color: #666666;">E quanto mais eu penso e tento articular teoria ao evento inesperado, sempre será o evento que me arrebata e que me deixa sem palavras, porque não existe símbolo nenhum no mundo que consiga traduzir a sensação do encontro com o Real, ali, a 15 metros de mim, por quase três horas. Infinitas horas de encontro com o Real.</span></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-80304650890696645432012-04-04T14:33:00.005-03:002012-04-04T16:00:48.742-03:00É o fim? De novo?<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhRtKyczb1lan2Z_45RMKpB0JOsI64EaH12LZgPMl7sWvarqSxNw6IM1S_7NHmwuSfDmbYyw0Dco_CgliFiYPA_rwW3gTxkwXJ4SatVUgbFeovYSH6BsC3giaKwWhls3EEQnEHO/s1600/zrclip_001n608bccb0.png"><img style="margin: 0px 10px 10px 0px; width: 134px; height: 200px; float: left; cursor: pointer;" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5727621545179352914" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhRtKyczb1lan2Z_45RMKpB0JOsI64EaH12LZgPMl7sWvarqSxNw6IM1S_7NHmwuSfDmbYyw0Dco_CgliFiYPA_rwW3gTxkwXJ4SatVUgbFeovYSH6BsC3giaKwWhls3EEQnEHO/s200/zrclip_001n608bccb0.png" /></a><br /><div><div> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Lançado em 2005, pela editora Arènes, na França, o<em> Livro negro da Psicanálise </em>tomou impulso e em 2011 foi lançado em terras tupiniquins pela editora Civilização Brasileira. O que trago aqui é fruto de uma lembrança, trazida a mim por meio de um link em uma rede social: em algum lugar do passado, houve uma pessoa que escreveu uma resenha sobre o tal livro, isto chegou a mim e me fez pensar muito sobre o assunto no qual me enfiei desde 1999: a Psicanálise - a metapsicologia freudiana, a invenção do inconsciente, ou seja lá o nome que queiram dar ao que Freud inaugurou.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Conheci o Livro de "ouvir falar", portanto não esperem de mim uma outra resenha sobre o livro, pois para se fazer uma resenha de um livro é preciso preencher um pré-requisito básico: lê-lo. Eu não o li. No máximo alguém pode considerar isso aqui uma "resenha da resenha". </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Soube de sua existência através de uma publicação de Elisabeth Roudinesco (psicanalista e historiadora da Psicanálise), em 2010, quando comprei "Em defesa da Psicanálise". Percebi em Roudinesco um ímpeto jamais visto na defesa do seu objeto de estudo, não era pra menos - pensei - a mulher é historiadora da Psicanálise, reúne em seu nome os textos mais influentes da área dos últimos anos, então é capaz que ela esteja falando também do lugar da indignação - sejamos francos, é duro ver algo em que acreditamos ser enxovalhado em praça pública: dei um desconto à Roudinesco, pelo seu envolvimento passional num debate não menos acalourado que surgiu na França, no ano de lançamento d'<em>O livro negro</em>. </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Hoje o tema volta à tona: Através do link que me foi enviado, li uma resenha sobre a publicação que acaba com a reputação de Freud e de quem mais defender a ideia de inconsciente escrita por alguém , talvez, menos apaixonado, ao menos no referido texto: Ricardo Cabral consegue - mais ou menos - encontrar um meio de falar d<em>'O livro</em> sem se deixar cegar pela Psicanálise e seus fundamentos que são duramente criticados na publicação de origem francesa e tampouco se deixar convencer do que a TCC é a bola da vez. Interessante texto que acreditava num debate igualmente acalourado que surgiria no Brasil, com o evento da publicação do livro pela Civilização Brasileira. Outra resenha, publicada em março do ano passado na Folha de São Paulo, pelo jornalista Fabio Andrighetto, nos mostra o mesmo: a esperança de um debate frutífero entre profissionais de várias áreas. O único problema de Andrighetto é a ignorância: em sua resenha percebemos para além do interesse no debate, percebemos uma crença no fato de que a Psicanálise está morrendo, está em "franca decadência", segundo suas palavras. Veremos.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">O livro que causou estas resenhas foi lançado no Brasil, como disse anteriormente, em 2011. A resenha de Cabral é de 2011, a de Birman e a de Andrighetto também. A pergunta que não quer calar é : Alguém viu debate?Alguém viu psicanalistas brasileiros se revoltando contra a publicação organizada por Catherine Meyer?Alguém viu entusiastas das neurociências subindo em palanques, gritando, enxovalhando com a cara de Freud, pisando em Lacan, Klein, Winnicott e companhia, citando passagens do referido livro? </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Ora, se alguém viu, por favor me diga, me mandem links , pois não vi nada que seja considerável a não ser algumas meia-dúzias de resenhas - mais ou menos - imparciais, defendendo uma das nações em conflito: TCC é a esperança dos dias atuais? A Psicanálise continua a salvação por sua abordagem do sujeito psíquico? Não vi opositores, não vi batalha, não vi guerra, não vi sangue.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Não vi nada, e como não sou francesa e nem sequer pisei na terra de DeGaule, insisto que o debate foi xôxo, borocoxô , quase nada perto da guerra de farpas que aconteceu em Paris. Me perdoem os mais informados do que eu, mas não considero essas resenhas dignas do termo "debate acalourado". Não credito esta falta de investimento libidinal no tema como alguma característica especificamente brasileira - coisa da qual francês sentiria falta- ou nada que o valha. Credito ao fato de que, talvez - e digo talvez porque não tenho certeza - talvez sejamos menos passionais que os franceses . E eu nunca pensei em dizer isso.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Talvez tivéssemos percebido o óbvio, talvez tivéssemos percebido o que Roudinesco, J.A Miller e tantos outros não viram: não há como destituir a Psicanálise do lugar que ela ocupa utilizando os argumentos de "O livro negro da Psicanálise". O fato é facilmente compreendido a partir do momento que consideramos que o tal livro não mostra muita coisa além do que Freud mesmo já tinha revelado: de que não acertou todas as vezes, que sua teoria estava em franco processo -eterno- de construção e que sua teoria era uma mitologia. Nada novo no front.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Em "Estudos sobre Histeria", Freud mesmo diz que deixou de entender algumas das patologias que cercavam de mistério os fenômenos histéricos. Freud, sim, ele mesmo, entendeu sua impossibilidade de compreensão e creditou isso a ninguém mais do que ele mesmo. Ele foi incapaz, ele por certas vezes também acreditou que poderia ter feito melhor, se soubesse de outras coisas que não sabia no momento. Daí referir-se a Freud como o rei dos embustes, francamente não é postura científica que se adote. Toda e qualquer ciência deve se valer de argumentos plausíveis, passíveis de observação e verificação.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Sobre isso, encontrei uma outra resenha não menos interessante sobre a tal publicação , da autoria de Joel Birman, esta que talvez tenha sido mais aguerrida, algo próximo ao tão desejado debate acalourado, segundo Birman, há em, "O livro Negro", toda uma agenda política que se descobre facilmente numa simples tarefa de metodologia: a ordem dos capítulos, nos adverte o autor, é totalmente manipulada para que o <em>grand finalle </em>coincida com a ascensão da mais nova esperança em termos de tratamento psicoterápico: a TCC.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Talvez essa resenha de Birman tenha feito parte do que muitos queriam ver no Brasil: o famoso debate. Eu insisto, não vi nada, nada de novo. Ao que parece é tradição, de tempos em tempos, aparecer um ou outro livro, um ou outro teórico disposto a acabar com as bases de uma teoria, de um conhecimento já consolidado. Mas, e qual o mal nisso? Nenhum. A ciência nasceu assim e - ainda bem - continua evoluindo graças à opiniões que contrastam, isso também aprendemos em Metodologia da Ciência - isto é quebra de paradigma, isto é importante, é vital.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Desta forma, é tradição, de tempos em tempos, vermos estampados em revistas semanais a pergunta recorrente: "Há espaço para Psicanálise?" "Freud é necessário, ainda?". Outras publicações, dependendo do grau de sensacionalismo com o qual esteja comprometida, substituirá a interrogação e estampará em suas capas simples assertivas. "Freud está morto.", "Fim da Psicanálise". Estratégias de marketing à parte. Pensemos sobre essas questões.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Nunca vi um psicanalista organizar coletânea ou livro que seja para falar mal de outras psicoterapias. Talvez isso soe infantil. Talvez seja, mesmo, infantil. Mas o ponto que quero </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">ressaltar é o seguinte: ataques à invenção freudiana acontecem desde que Freud ainda estava vivo para se defender. A teoria evoluiu, faz uso de interfaces, promove debates sobre questões de interesse social, dialoga com outras áreas do saber, mas não abandona o que mantém em sua essência, desde Freud: o sujeito. </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Segundo as poucas resenhas de psicanalistas que vi por aqui sobre o livro, há uma necessária objetificação do sujeito, alguns acreditam mesmo no mundo sem o sujeito e um ou outro ataque às neurociências. Freud acreditava nas neurociências, mas sempre deixou espaço para que pudéssemos pensar no primordial: nosso objeto de trabalho é a escuta, é a disponibilidade do próprio inconsciente em contato com outro inconsciente (Antonino Ferro, psicanalista italiano nos lembra muito bem disso) e, portanto, o novo da Psicanálise - é, portanto, o velho: o sujeito e seu inconsciente - esta frase não é minha, é de outro psicanalista cujo nome não me recordo agora.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Para defender Freud poderia continuar este texto lançando mão do fato de que o mundo contemporâneo esquece do sujeito, que hoje somos seres medicados e alienados, que vivemos a cultura do DSM-IV, da banalização de substâncias químicas, do reinado dos hormônios e afins, mas não, não farei isso, porque acredito que seria muita superficialidade dizer que todas as teorias que são contrárias à Psicanálise estão erradas e que todas estão aí esquecendo em toda esquina o pobre do sujeito, mais sujeito do que nunca.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Não é por aí, ao menos não quero "ir por aí". O que quero dizer é simples. Se <em>O livro negro da Psicanálise</em> equipara à Psicanálise à regimes políticos sangrentos ao devotar um capítulo sobre "as vítimas da Psicanálise", seus defensores deveriam também perceber que esse argumento de destituir Freud do lugar em que ele se encontra atualmente é, no mínimo, falta de assunto. Todo mundo já disse tudo sobre isso: as pessoas se posicionam, contra ou a favor, escrever uns textos, umas resenhas, o que gera um ou outra polêmica, que gera mais repercussão e pronto, acabou o assunto porque surge outro mais interessante.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Quero dizer que <em>O livro negro</em> que defende a ideia de que a Psicanálise mais mal do que bem fez à sociedade moderna, acusando-a de pseudociência, esquece-se do fato de que, qualquer um que falasse de mente e não fizesse parte das ciências naturais era visto com desconfiança. Precisamos lembrar que Kant, o próprio, acreditava que a Psicologia - como um todo - nunca seria ciência, posto que não lida com argumentos matemáticos. Ou seja, era a Filosofia nos empurrando de um lado, e a Psiquiatria e as ciências naturais nos enxotando de outro: isso nos iguala, psicólogos das mais variadas tendências e correntes teóricas.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Criticar Freud não é novidade, falar que Psicanálise não é ciência e alçar a TCC como única forma possível de tratamento não é nem um pouco lúcido, haja visto que Kant nos coloca todos no mesmo saco, eu, o gestaltista, o psicodramatista, o cognitivista: lidamos com o invisível, e, para Kant, isto não merece ser considerado científico.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Essas reflexões não vão me fazer comprar o tal livro, já sei que se trata de um ataque desconjuntado à Psicanálise, sobre o fato de não ser ciência, muitos outros autores, como Fèdida e Figueiredo falaram melhor que eu: não se necessita de qualquer que seja o "tribunal epistemológico" para comprovar a validade da Psicanálise. </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Figueiredo diz isso, e eu nunca esqueci a imagem mental que formei do tal "Tribunal": aqueles juízes envelhecidos, de perucas, pregando a velha e boa metodologia, do alto de suas tribunas, perguntando a um Freud, réu, diminuto, o que seria a base metodológica da Psicanálise, como confiar em seus achados que, em muito, não passavam de meras observações clínicas?</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Nunca esqueci o tribunal. Mas d<em>'O livro negro da Psicanálise</em> eu esqueci, não porque recalquei, mas porque me foi indiferente. Li o livro da Roudinesco e entendi - até mesmo valorizei - sua enésima tentativa de defender o indefensável, li estas resenhas as quais me referi e pronto. </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Não me afeta, não me diz nada, porque nada novo tiro de tudo isto. Para não dizer que não foi útil voltar ao tal livro, agora um sentimento novo me toma: de súbito um calafrio de medo, medo não do livro, mas do que podem fazer com o livro os menos perspicazes que passarão a postar frases do livro, trechos sensacionalistas e começarem um levante "Fora Freud!Fora Lacan e suas lacanagens", medo da repercussão disso nos círculos mais inocentes, porque os escaldados já entenderam que não se pode defender a Psicanálise pelo simples motivo de que ela não precisa de advogado. </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div> </div></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-53123450923259841322012-02-13T14:08:00.003-02:002014-04-29T00:35:25.004-03:00"The artist", voz , barulho e silêncio<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhOVg6GN6WigKB3hQ60UpvVRUesLKaTDW_yRMrZb_k0tv0C7kJQmY1KHeuMA_iFNRdbp9Wask7mRWJpfkQroXv_0kvM-P2aDmGIV7E87mGIxN5jYG9MSmloOl4ZCIOLTW4mFjdB/s1600/untitled.png"><img style="margin: 0px 10px 10px 0px; width: 200px; height: 112px; float: left; cursor: pointer;" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5708664086657556562" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhOVg6GN6WigKB3hQ60UpvVRUesLKaTDW_yRMrZb_k0tv0C7kJQmY1KHeuMA_iFNRdbp9Wask7mRWJpfkQroXv_0kvM-P2aDmGIV7E87mGIxN5jYG9MSmloOl4ZCIOLTW4mFjdB/s200/untitled.png" /></a><br /><div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"> Arrasando em todos os prêmios do ano, o maravilhoso "The artist", idealizado por Michael Hazanavicious, tem sido motivo de muitos comentários no meio cinematográfico atualmente. Polemizado por muitos, o filme resgata o glamour da era de ouro do cinema Hollywoodiano com delicadeza e simplicidade.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Trata-se da história de um ator de cinema mudo que passa por turbulências em sua carreira motivadas pelas mudanças na indústria da sétima arte empregadas com fins mercadológicos e políticos.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">A saga de George Valentin que encarna o protagonista vai do estrelato ao esquecimento, do glamour à tragédia. Um ator com ótimo tempo para a comédia que não parece imitar os astros dos outros tempos; ao contrário, torna nostálgico qualquer cinéfilo que acompanhou as desventuras de Fred Aistaire na grande tela. O roteiro já ganhou o prêmio Bafta, acompanhado do figurino e da fotografia. O filme - ninguém duvida - será a sensação do próximo prêmio da academia, o famigerado Oscar, da cabeça aos pés decidido politicamente que parece que vai se render ao clima nostálgico que "The artist" provoca: uma curiosidade para quem ainda não viu: o filme é mudo.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Esse é o ingrediente indefectível do filme, talvez o ingrediente mais arriscado que Hazanavicious não pareceu temer: em plena era do 3D e das reprises de grandes clássicos do cinema moderno se adaptando a esta nova tecnologia, "The artist" é um filme mudo, em preto e branco, que gasta seus minutos para contar uma história que não apresenta tanta novidade: um amor, muitos obstáculos, sucesso, comédia e ação. Até então, nada novo no front e é exatamente isso que seduz tanto.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Se não há novidade, poder-se-ia perguntar: então estamos voltando ao passado? Dispondo de tanta tecnologia , em plenos 2012 um diretor francês resolve testar a inteligência e a paciência do espectador ao submetê-lo a esta história que, como já disse, não revela nenhuma novidade. </span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">A questão não é puramente nostalgia, o filme é bom como seria nos anos 20; uma história verossímil, um roteiro sem defeitos que leva o espectador a experimentar as mais diversas sensações. É nisso que "The artist" consegue ser genial. Mas há outro fato a se comentar: a impaciência contemporânea.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);"></span> </div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Em se tratando de um filme mudo, algumas pessoas - desconhecendo a sinopse - resolvem, em uma atitude que lembrava o repúdio, abandonar a sala de cinema. Presenciei na noite em que vi o filme mais de cinco pessoas deixando a sala ao entenderem que não haveria voz na produção francesa. Ironicamente, o filme também trata da questão do silêncio em seu roteiro, mas é interessante fazermos aqui um paralelo cabível.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Se na tela, o que presenciamos é o auge e a decadência do cinema mudo através das produções da fictícia "Kinograph", o incômodo que causa a mudança do sucesso garantido do cinema que se satisfazia com a mudez, para a aposta no escuro nos novos filmes falados; o que se passa do outro lado do ecrã é o oposto: a mudança provocada pelo incômodo silêncio que atualmente se encontra cada vez mais fora dos planos da sociedade contemporânea, tão bem representada pelas super produções hollywoodianas repletas de efeitos especiais os mais barulhentos possíveis.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Bem dizer estamos na era do barulho, mesmo que não se esteja falando de barulho físico, do som estridente, estamos na era da "onipresença", em que as pessoas usam redes sociais como diários de uma vida, com um roteiro pré-estabelecido do qual todos devem saber/seguir/acompanhar.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">O silêncio, nos dias atuais é quase uma ofensa, é repulsivo. Como podemos tolerar um filme mudo se não toleramos o próprio silêncio? O mais puro silêncio é feito de incômodo que nós, seres contemporâneos, visamos incessantemente tamponar. Por acaso não estamos falando aqui de subjetividade? Perdi o bonde ou estou falando algo coerente?</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Na falta de uma resposta e de leitores, arrisco - parcialmente - a dizer que estou chegando em um ponto interessante: o silêncio insuportável para muitos que deixam a sala de cinema em "The artist"é o mesmo silêncio intolerável que se evita quando se inunda o mundo de palavras, de caracteres, como queiram.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Nossa relação com o silêncio sempre será problemática enquanto não buscarmos compreender o que não cessa de tagarelar internamente e que, no entanto, não estamos dispostos a escutar; fazemos barulho para tamponar o barulho que não cessa, parece contracenso, parece loucura, mas não é de um todo incoerente.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Fazemos tanto barulho numa espécie de competição sobre quem fala mais alto: eu ou esse isso que me atormenta tanto aqui do lado de dentro. A metapsicologia de Freud foi uma das primeiras tentativas de se dar voz ao que tagarelava indiferente dentro de nós. A chamada "Cura pela fala" permitiu que soubéssemos vislumbrar o que havia de tão estridente nos porões de uma mente que não se deixa conhecer. A ladainha freudiana sobre o silêncio e a voz é antiga, tem mais de cem anos e continua a impressionar.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Da mesma forma que as pessoas não dão uma chance a um filme mudo, ou não parecem dispostas a dar, elas não se tornam nem um pouco mais afeitas a deitar num divã e vasculhar os lugares mais barulhentos do lado de dentro. Isso é fato. Não precisamos falar do que está calado, mas , será que está mesmo calado? Entre escutar - e para isso é preciso silêncio - e agir (passar ao ato), nos dias de hoje se torna mais interessante agir. A ligação entre filme e o trabalho psicanalítico me parece pertinente agora.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">Como este não é um post sobre o filme, mas o usa como pretexto, não poderia encerrar sem lembrar do que ouvi, dos comentários após as luzes se acenderem. Um é digno de nota: ao ser perguntada sobre o filme, se havia gostado do que vira, uma garota respondeu: "Er, é assim né, é todo mudo".</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">A expressão de desgosto parecia evidente no rosto da menina. O julgamento simples sobre se tinha apreciado o filme ou não foi respondido desta forma. Cabe também mencionar que, nesta mesma sessão, telefones celulares tocavam e as pessoas calmamente respondiam - o que nem sempre acontece, pois no cinema todos costumam olhar com desprezo para aquela pessoa desligada que esquecera o celular ligado. Isso me faz entender que as pessoas imaginavam que não seria tão mal educado assim deixar o celular tocar e pior, falar ao telefone, durante um filme mudo, pois não haveria prejuízo algum no acompanhar das cenas, da trama. Mais um erro.</span></div><div align="justify"><span style="color: rgb(102, 102, 102);">É. O post não é sobre a trama, os atores, os diretores e todo o pessoal que tornou possível "The artist", é mais sobre as pessoas sentadas numa sala de cinema não suportando estar vendo um filme mudo. E isso dá tanto pano pra manga...</span></div></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-48984212011850787952012-01-02T14:23:00.004-02:002014-04-29T00:35:24.999-03:00Um vencedor<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiz0bZsLbjHieLbcDmslTmtSzItzflelm03K32ky01dTfPD-efIXhIBYCR5fHp1XChEt1dBhfXY5suEATZex6li1nsnaxFD9iQMNmrUKgqhvYaW_OGA7M0cghGMnz164s_n-Arz/s1600/ayrton-senna.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 148px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5693079541395264578" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiz0bZsLbjHieLbcDmslTmtSzItzflelm03K32ky01dTfPD-efIXhIBYCR5fHp1XChEt1dBhfXY5suEATZex6li1nsnaxFD9iQMNmrUKgqhvYaW_OGA7M0cghGMnz164s_n-Arz/s200/ayrton-senna.jpg" /></a><br /><br /><br /><div align="justify">Considerado o melhor filme documentário no Brasil no ano de 2011, <em>Senna</em> (2010) não nos mostra nada de inédito, mas tem o mérito de nos relembrar certas lições que aprendemos com um dos maiores ídolos que o Brasil já conheceu. </div><br /><br /><br /><div align="justify">Acompanhando os passos de Ayrton Senna, piloto nascido em 21 de março de 1960, o documentário revela o submundo do automobilismo, antes mesmo de toda a parafernalha eletrônica tomar conta da F-1, tornando o esporte, no mínimo , chato, asséptico e previsível. Antes de Schumacher existiram algums ídolos dos quais poucos esquecem.</div><br /><br /><div align="justify"><em>Senna</em> vale ser visto e revisto por todo aquele que deseja entender melhor como alguém pode vencer mesmo diante de diversidades. Diante da politicagem que já corria solta no mundo perfeito imaginado pela FIA, diante de inimizades, inveja e injustiças, Ayrton Senna mostrou perseverança, obstinação e firmeza, qualidades tão em falta nos dias de hoje, nos ídolos atuais.</div><br /><br /><br /><div align="justify">Inúmeras são as passagens mostradas pelo documentário nos quais percebemos a garra que fez de Ayrton um campeão. Longe do cenário bizarro que envolve os grandes nomes do futebol atualmente, longe das baladas, das mulheres-fruta, dos anabolizantes , drogas e álcool, Ayrton Senna deu uma lição de como insistir em um objetivo. </div><br /><br /><br /><div align="justify">Quando perguntado sobre o que a vitória significava para ele, Senna costumava dizer que esta era como uma droga, uma vez vencendo, difícil seria deixar de se levar pela busca dessas sensações que envolvem coragem e firmeza. Só não concordo com o campeão sobre sua opinião a respeito da similaridade entre droga e vitória: Ao contrário da vitória, a droga tira a coragem e destrói. Uma vitória prepara para a próxima.</div><br /><br /><br /><div align="justify">Apesar de ser um ídolo esportivo, Senna teve um importante papel para a auto-estima do brasileiro que, nos anos 90, via em seu campeão o único motivo de orgulho da nação. Um país soterrado por uma inflação gigantesca, um povo miserável que tinha nos domingos a possibilidade de esquecer um pouco a miséria em que vivia para torcer pelo ídolo que, apesar de ter origem abastada, nunca esqueceu de revelar a qualidade mais rara encontrada nos seres humanos: humildade.</div><br /><br /><br /><div align="justify">A história nos leva aos três campeonatos mundiais para nos guiar, finalmente, para a curva final, no famigerado GP de Ímola, onde Senna perdeu a vida, apesar de seus pressentimentos. Espiritualidade também marcou sua vida e nos faz entender melhor quem foi essa pessoa que deixou o mundo no auge de seu sucesso.</div><br /><br /><br /><div align="justify">Passaram-se quase 18 anos e Senna continua presente em cada homenagem que se faça a sua garra e determinação, tão em falta hoje em dia. Achei que este seria um bom motivo para escrever: um ano gastando seus primeiros dois dias, as pessoas pensando no que fazer para viverem melhor e uma lição nos ensinada sobre humildade, generosidade e persistência.</div><br /><br /><br /><div align="justify">Para mim alguns aprendizados para toda vida: não existe o impossível, apesar de ser clichê, poucos de fato acreditam que podem fazer a diferença, não existe o incompreensível e não existe dificuldade nenhuma que a força de vontade não vença. Coragem, coragem.</div><br /><br /><br /><br /><div></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-47769644885451360822011-12-23T13:03:00.006-02:002014-04-29T00:35:24.995-03:00Poeminha quase casado*<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi41tRyi2D1gTgM9pjqB2U35DGEAxroHT48LW1yzfLyFxyh-SD6RV2e2fA0lLi014TNPLyXX6UwXaUJmTlZk4O9PYsocKZK5woPejLLTOhujX9vx7CSeAfouqMooth33O0MX4AU/s1600/letters%252Cletter%252Creading%252Cbook%252C%252C%252Cphotography%252Cvintage-f987712b2929a3adbc0ca952ae0710e5_h.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5689343354052638626" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi41tRyi2D1gTgM9pjqB2U35DGEAxroHT48LW1yzfLyFxyh-SD6RV2e2fA0lLi014TNPLyXX6UwXaUJmTlZk4O9PYsocKZK5woPejLLTOhujX9vx7CSeAfouqMooth33O0MX4AU/s200/letters%252Cletter%252Creading%252Cbook%252C%252C%252Cphotography%252Cvintage-f987712b2929a3adbc0ca952ae0710e5_h.jpg" /></a><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor, e tem uma voz tão doce e bela, eu lhe prometo amor mais que eterno, pois é amor que não se contenta com a eternidade de um mundo só, pois quer outras para ser bem mais eterna. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor, e tem esta voz tão doce que dá certinho com estes olhos teus que são tão profundos, é que eu te prometo o amor mais belo, mais de uma beleza tão vistosa que a própria beleza se esconde de tão feia que é, perto da beleza deste amor que tenho.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor, que tem uns cabelos brilhosos e usa um shampoo que eu escolhi e que cheira tão bem como você. </span><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor, porque constrói carro de lata e faz dela nascer arte, e se admira com a própria criação. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor, que sabe cantar bossa nova até com os olhos, os que já disse serem tão profundos, porque choram bem raramente, mas quando choram é um choro assim muito sincero que eu quero logo enxugar.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor e diz coisas tão sérias, e sabe coisas tão sérias, é que bendigo todo este amor.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você faz o bem mesmo que não goste de ser chamado de bom, porque se importa com os outros, porque me escuta e me diz somente para me acalmar.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor e transborda lucidez e serenidade, porque você preza o equilíbrio e porque é libriano. </span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor e tudo que faz é perfeito: com arte, música e amor.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor e me ama como ninguém jamais me amou.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor, e me prometeu um livro, uma máquina de fazer poesia, e me escreveu " a face pintada" é que você é um menino com uma flor.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um gênio dentro de um menino, mas com uma flor, é que adoro sempre este amor e por mais que muitas vezes não saiba compreender o tamanho deste amor, eu nunca o digo menor, porque isso seria mentira.</span><br /><span style="color:#666666;">Porque você é um menino com uma flor eu me torno, a cada dia, uma menina, com outra flor.</span><br /><span style="color:#666666;">E por estas e outras eu te amo calma, linda e profundamente.</span><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">*<em>Poema descaradamente inspirado em Vinícius de Moraes (Para uma menina com uma flor)</em></span></div><span style="color:#666666;"></span>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-42498717904655956752011-11-18T01:38:00.004-02:002014-04-29T00:35:24.990-03:00O que aprendi com Lévi Strauss sobre o meu país<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEizBFz17Cw-HSD8rVfHDRiyqCe3l3GkUHmuR20bWAIIcCCL1fI6-qq_EKDe7ImNaahh3vZLK3qwqs4stlBjo9C9PZ6YkXvUDnqgbU23g6-prSlIFT_hfycg66FNjTo1m4fuy0G0/s1600/longe_do_brasil_levi-strauss.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 149px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5676183741941374578" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEizBFz17Cw-HSD8rVfHDRiyqCe3l3GkUHmuR20bWAIIcCCL1fI6-qq_EKDe7ImNaahh3vZLK3qwqs4stlBjo9C9PZ6YkXvUDnqgbU23g6-prSlIFT_hfycg66FNjTo1m4fuy0G0/s200/longe_do_brasil_levi-strauss.jpg" /></a><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Foi nos idos de 2009 que entrei em contato com Lévi Strauss. Acidentalmente, devo dizer. Foi quando ministrava uma disciplina chamada "Antropologia empresarial". Parecia que havia um desinteresse geral pela temática o que ocasiou o tal acidente: Lévi Strauss surgiu para mim. Como o nome já diz, seria uma disciplina em que haveria a aplicação da Antropologia, campo de estudos no qual o pensador de origem belga se destacou, à Administração.</span></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Depois de um certo tempo, tive outro encontro intelectual com o autor de origem belga. Foi assim então que, apesar de não ter lido seu famosíssimo <em>Tristes Tópicos</em>, resolvi ler <em>Longe do Brasil </em>(UNESP, 2011). Trata-se de uma entrevista concedida à Véronique Moraigne em 2005 e publicada no jornal francês Le Monde. </span></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Neste pequeno livro que se lê literalmente em duas horas, encontra-se um prefácio tão interessante quanto o seu conteúdo restante. Escrito pelo antropólogo Eduardo Viveiros de Castro, o prefácio a que me refiro anuncia o que vai se constatar na leitura da entrevista: Um Lévi Strauss lúcido, apesar de seus quase 100 anos, relatando como sua experiência no interior do Brasil foi fundamental para sua carreira de teórico. Digo mais, Lévi Strauss, com a lucidez e a coragem que só a idade e a proximidade da morte permitem, consegue definir sua experiência brasileira como algo fundamental em sua vida, em geral. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Sabe-se que o pensador em questão esteve no Brasil e aqui embrenhou-se pelas bandas do interior do país buscando conhecer as comunidades e os hábitos dos brasileiros situados nos mais longínquos cantos desse país de dimensões continentais. Vale dizer que na década de 30 a condição de precariedade em que se encontrava o país não se compara ao que vemos atualmente. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Lévi Strauss, foi, portanto, um desbravador, alguém que, não sabendo bem o que de fato fazer, foi capturado pelos povos que visava estudar. Por isso fez anotações, publicações, fotografias no intento de conhecer melhor todas as peculiaridades que esses povos apresentavam aos seus olhos europeus.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Lévi Strauss, em sua experiência brasileira, não gostava muito de fotografias, acredita que estas tinham alguma importância, mas, do mesmo modo, poderiam distraí-lo e afastá-lo do seu real objetivo que seria entrar em contato com o que se apresenta diante da lente da objetiva. Ao observarmos o relato desta experiência que marcou a juventude do teórico e o alçou a uma popularidade sem precedentes na França e resultou na inauguração do que hoje chamamos de "etnografia" ou relatos etnográficos, percebemos que o pensador hoje cultuado por uma série bem variada de intelectuais, estudantes de várias áreas do conhecimento, se encantou com o povo brasileiro, foi capturado, por assim dizer, pelo encanto do Outro: eis uma bela lição de contato com a alteridade.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Se para alguns o Outro ameaça, para Lévi Strauss, o Outro ensina, promove desterritorialização, a qual tantas vezes já citei aqui. Como perceber o contato, o diálogo e a convivência entre um teórico europeu e os povos erroneamente chamados de primitivos? Melhor dizendo: existem culturas inferiores?</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">A estes questionamentos certamente não poderemos responder sem aludir à Lévi Strauss e sua experiência marcante nos anos 30. Interessante é que <em>Longe do Brasil</em> também relembra o fato de que o pensador francês retornou ao Brasil, em 1985, fazendo parte de uma comitiva do governo francês.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Nesta última ocasião, neste último encontro ou (des) encontro com o Brasil, percebeu que muita coisa mudou; que o país que outrora conheceu já não é do jeito que o encontrou, pela primeira vez. E continuou pensando sobre isso, o que, inevitavelmente, nos faz pensar também, não seria este o papel fundamental de todo pensador, a produção do insight?</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"><em>Longe do Brasil</em> é um livro tocante que nos revela a importância do nosso país para a construção de um campo de conhecimento; o livro também nos mostra quem somos, assim como os outros livros do autor sobre o tema. Livre de qualquer exagero, acredito que somente um olhar distanciado e ao mesmo tempo implicado poderia nos oferecer uma visão tão apurada de nós mesmos, nós, como povo e nação. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Eis uma das variadas lições que lévi-straussianas. O teórico, com a paciência que é uma dádida velhice, responde sobre o futuro:</span></div><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"><em>"Estamos num mundo ao qual já não pertenço. o que conheci, o que amei, tinha 2,5 bilhões de habitantes. O mundo atual conta com 6 bilhões de seres humanos. Ele não é mais o meu. E o do amanhã, povoado por 9 bilhões de homens e mulheres - mesmo se for o pico de população, como nos asseguram para nos consolar - , proibe-me qualquer previsão..."</em></span></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Se ao menos Lévi Strauss imaginasse que apenas em seis anos aumentaríamos nossa população em mais 1 bilhão... A velhice nos permite certos privilégios, um deles é a sensatez e , sobretudo, a licença de não termos respostas para tudo que nos perguntarem.</span></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"></div><br /><br /><br /><br /><div align="justify"></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-59748731818003756442011-10-29T11:41:00.009-02:002014-04-29T00:35:50.010-03:00Feminino: arte & revolução: um aporte psicanalítico<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjYMtNiRX6bAXlvqhww8nOZ6hO25PY0MrX2skc0TgIZwkRJv_PD5wVjSeUx8euozINjwI7j2HT13Mg1o7nbeoxV79S9zEdBCalVsl9ofdCdzJSbKTEOV6JoDSxCH53d4OOqVH3R/s1600/Convite.png"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 138px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5668916388299945554" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjYMtNiRX6bAXlvqhww8nOZ6hO25PY0MrX2skc0TgIZwkRJv_PD5wVjSeUx8euozINjwI7j2HT13Mg1o7nbeoxV79S9zEdBCalVsl9ofdCdzJSbKTEOV6JoDSxCH53d4OOqVH3R/s200/Convite.png" /></a><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Se eu for pensar em quantos posts já dediquei a livros e a filmes que me marcaram, que trouxeram algum conhecimento, que, enfim, me mobilizaram e inspiraram, certamente perderia as contas. Por este motivo, pensei em adicionar à coleção o meu próprio livro, aquele que mobilizou, inspirou e inspira minha vida, ao menos minha vida como pesquisadora.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Penso que não há ninguém melhor, e ao mesmo tempo, ninguém pior do que o próprio autor para analisar sua obra, dizer algo sobre. Sendo assim, não pretendo aqui fazer uma defesa apaixonada do meu projeto que durou, ao todo, quase cinco anos para se materializar, tampouco espero estar imune a algum sentimento de orgulho que de fato sinto, por ter conseguido realizar este desejo.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Para Lacan, em seu seminário sobre a Ética, não existe nada mais perigoso do que realizar o seu desejo. Para este autor, parece que realizar um sonho ou um desejo significaria, necessariamente, realizá-lo no fim de tudo, ao apagar das luzes. Por isso, então, "realizar um desejo" seria o mesmo que "realizar , no final". Ainda sobre o desejo, lembro de Zizek - um filósofo que dialoga com a Psicanálise lacaniana - falando sobre o caráter paradoxal que envolve desejo/sonho e felicidade. Para o autor esloveno, realizar um desejo seria, de saída, abrir mão da felicidade. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Sendo assim, das duas uma: ou você é feliz, ou realiza seu desejo. Esse caráter perigoso do desejo está tanto em Zizek como em Lacan, e perpassa, em geral, toda a ideia psicanalítica de subjetividade. Aí entra o mote para o meu livro: <em>Feminino, arte & revolução: um aporte psicanalítico</em> (Edufal, 2011) que fala sobre esses desejos que , via de regra, nos mobilizam e geram inquietações, construindo nossa identidade. Este livro, cabe dizer, foi o resultado de minha dissertação de mestrado realizado em São Leopoldo-RS. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Busquei aliar meu interesse pela subjetividade feminina ao diálogo com as artes, porque sempre acreditei no que Freud dizia a respeito do pioneirismo da arte nas questões do inconsciente. Porém, não necessariamente poderia fazer esta relação livremente, por exigências acadêmicas as quais, não retiraram todas as minhas esperanças deste intento.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Entendendo a subjetividade feminina como uma invenção, tal como Lacan desenvolveu, percebi o conceito de mascarada como uma possibilidade criativa diante da falta de referência na construção da identidade feminina e me coloquei à disposição do tema para que ele demolisse meus próprios paradigmas, me levando ao meu desejo, e não a minha felicidade. Estranho? Sendo um livro acadêmico, nascido de exigências igualmente acadêmicas, a ideia que norteou o projeto foi falar, mesmo que de maneira indireta, da arte feminina em fazer-se mulher e para tanto é necessário revisitar os autores, os teóricos que respaldaram o projeto.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">No entanto, em poucas palavras, o que busquei entender - e por isso, me senti mobilizada - foi como esta construção de identidade se dá no contexto cultural atual, como as mulheres se tornam mulheres? Além da ultrapassagem do Édipo, da constituição da feminilidade através de amigas e de outras mulheres, como a mulher, hoje, se torna um sujeito, apesar da ausência do significante da feminilidade?</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Leituras sexistas à parte, meu interesse foi me sustentar em quem primeiro falou sobre o tema, Joan Riviére e Lacan, para que, de fato, fosse possível pensar nas reconstruções que a mulher faz diante das exigências dos tempos atuais, a saber, a obediência irrestrita e geradora de ansiedade ao tripé " beleza-juventude-magreza", aos novos ideiais que apregoam a liberdade, a livre disposição dos sujeitos, toda a parafernalha científica-midiática que torna a mulher uma outra mulher, porque se reinventa hoje não mais como se reiventava ontem, seguindo referências outras.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">No fim dessa discussão teórica surge o discurso das próprias mulheres que hoje tentam e criam a sua verdadeira "arte e revolução" diante dos ideiais contemporâneos. É preciso dar-lhes fala, tal como o fez Freud, desde as suas histéricas.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Até este ponto, talvez não saibamos o que isto tem a ver com o desejo, com o desejo feminino, mas, acredito que há uma relação quando começo esse texto falando do meu desejo que foi realizado, no fim. Desejo de pesquisadora de entender como se dão todas essas questões que, invariavelmente, também são minhas. No fim , realizei um desejo?Não sei, mas desconfio da face mortífera deste: pois só me vieram mais perguntas ao invés de conclusões sobre tudo isso que tem relação com a mulher e com sua subjetividade. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Realizar um desejo no fim, é saber que não há fim para um desejo, pois este continua nos guiando, por onde bem entender, assim é o papel do pesquisador que deve abandonar as ideias ingênuas que poderia ter sobre neutralidade. Esta não existe. Gosto muito de um trecho que escrevi neste livro, justamente falando da minha incapacidade de ouvir tudo isso incólume:</span></div><br /><div align="justify"><em><span style="color:#666666;">" [...] escutar é, necessariamente, dar forma aos próprios fantasmas; aquele que escuta não está imune ao que se lhe apresenta como queixa do outro e é neste ponto que se faz a dificuldade e também o motor, a mola propulsora desta empreitada"</span></em></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Quer saber? No fundo, no fundo, pesquisar é nunca realizar o seu desejo. Porque isso nunca termina.</span></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-32117629344098885782011-08-29T22:32:00.005-03:002014-04-29T00:36:58.912-03:00Um conto chinês ou até onde a alteridade nos conduz<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMV24j6phFZ5IR5NHrFqIrF9C3f-dgNUR3iL0dFGLS-jDNk5D8ZUXe9Y79YmVsIhjwgTIpH9Iy8kldQG3DfwkFvFchqFKbPM1pjLv7qXIYM1QyDqkQIUXnX5NfnldDiQ2vrIai/s1600/un-cuento-chino-2.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 132px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5646465353376470498" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhMV24j6phFZ5IR5NHrFqIrF9C3f-dgNUR3iL0dFGLS-jDNk5D8ZUXe9Y79YmVsIhjwgTIpH9Iy8kldQG3DfwkFvFchqFKbPM1pjLv7qXIYM1QyDqkQIUXnX5NfnldDiQ2vrIai/s200/un-cuento-chino-2.jpg" /></a>
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<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Um argentino ermitão, um chinês perdido e uma mulher apaixonada. Essas são as personagens centrais de <em>Un cuento chino</em> (Argentina, 2011). A trama busca lançar luz sobre um relacionamento insólito mantido por acidente entre Roberto (Ricardo Darín, de <em>O segredo de seus olhos, Abutres e O filho da noiva</em>) e Jun (Ignacio Huang). </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Darín, que consegue ser unânime em críticas quanto a sua vibrante e precisa atuação, vive uma personagem solitária, imersa em um mundo obsessivo em que não se come os miolos dos pães. Roberto é dono de uma pequena loja de ferragens a qual, herdada de seu velho pai, serve de palco para muitas atitudes típicas de um verdadeiro rabugento, como, por exemplo, maltratar clientes que buscam parafusos.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Roberto, apesar de suas próprias manias, herdou outras de seus pais: costuma colecionar notícias de jornal que guardam em comum o fato de serem estranhas: a prova da hipótese de Roberto de que a vida não faria o menor sentido. É com esta certeza que Roberto coleciona recortes de jornal que comprovam a veracidade de sua hípótese, mas o estranho hábito vai além: é através do mergulho nas vidas alheias, desconhecidas, que Roberto consegue dar um sentido a sua própria vida: aí está o paradoxo: é tentando obsessivamente provar que a vida não tem o mínimo sentido que Roberto vai reunindo e colecionando sentidos para sua , uma motivação que o faz acordar todos os dias e apagar a luz de seu quarto, indefectivelmente, às 23 horas da noite.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Tão sem sentido como as notícias bizarras colecionadas por Roberto é a vida do chinês Jun, perdido na Argentina desde a tragédia que matou sua noiva: um desastre insólito, um fato considerado por muitos improvável, bizarro: eis que surge, do alto do céu, uma vaca a mugir que acaba atrapalhando o pedido de casamento que Jun faria à noiva, que não resiste à pesada vaca. Assim a história começa e também começa a relação estranha mantida entre Roberto e Jun.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Apesar da incompreensão entre os idiomas, os hábitos e culturas tão diferentes entre Argentina e China, <em>Ún cuento chino</em> vai além do óbvio: o que está claro no filme - e esta deve ter sido a verdadeira intenção de seu realizador Sebastián Borensztein - é que para além dos idiomas é a própria subjetividade que afasta e ao mesmo tempo une as pessoas. </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">O atrapalhado chinês que não consegue pronunciar sequer o nome de Roberto , estranha não só a sisudez do anfitrião argentino: estranha-lhe os hábitos, o gosto pela comida, a casa, os recortes. O belo e simples filme nos mostra nada de novo e, ao mesmo tempo, nos coloca à frente uma verdade que parece sempre inédita: o Outro nos constitui e nos dá um lugar em seu discurso, e por isso existimos, é através do olhar do Outro, representado pelo chinês que "é limpo, calado e colaborador", que Roberto consegue encontrar um sentido em sua vida tão perpassada pela própria incapacidade típica dos obsessivos de lidar com os sentimentos. </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">O pobre e inadequado chinês ensina a Roberto coisas sobre sua cultura, sua gente, sua língua , mas ensina, sobretudo, lições sobre os sentimentos e como estes podem ser acessados: solidariedade, compaixão e agradecimento estão presentes neste sensível filme como se fossem lições das quais Roberto deveria entender. Apesar das confusões entre as línguas e da necessidade de tradutores, Jun e Roberto se entendem pelo fio mais tênue que os liga à vida: o insólito e trágico acidente com a vaca e sua consequência, o não menos insólito encontro entre o argentino solitário e rabugento e o chinês sensível e observador. </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">A pista sobre o que de fato está em jogo neste filme é-nos jogada pela personagem de Muriel de Santa ana, Mari, de quem Roberto não consegue se aproximar da maneira como deveria segundo os próprios sentimentos. Mari insiste, convida e oferece afeto à Roberto que, diante disto, não consegue expressar nada além do que uma cansativa e obsessiva educação. Enquanto isto, Jun consegue comprender bem o vínculo afetivo que existe entre o novo amigo e a moça romântica, mesmo sem falar uma palavra em espanhol.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">O filme gasta seus quase noventa e quatro minutos falando, inclusive nas entrelinhas, de como precisamos do olhar do Outro, esse mesmo outro que nos constitui à medida que nos desaloja, nos desterritorializa em nosso próprio espaço, em nossa própria subjetividade. </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Era preciso que Roberto encontrasse Jun, e este filme, sincero, convicente e coeso mostra todo esse desencontro diante do Outro, tão bem representado pelo estrangeiro, pela "cultura estranha", o encontro como o novo, como o diferente faz com que ambos ultrapassem os próprios limites e, com isto, encontrem o verdadeiro sentido das suas vidas, mesmo que isso tenha sido determinado no fatídico dia em que uma vaca caiu do céu.</span></div>
<br />Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-35778993047972950292011-08-19T09:54:00.010-03:002014-04-29T00:38:18.749-03:00"Eu queria ser médico, mas fiz Psicologia"<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7Y2GSMMc2OMJ2V4EOLri64W2Qcg9A-T_csYBC2Hzw3jdLpNtlUtrbHnpV-T2RwEZqTY4Hk9HgTSq0veH8IPALcZ72QS6zfrpjHEOAAHqPUsTYkK2LwNh-d5UCeGsEWeLn_xlf/s1600/psi.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 200px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5642557556225762482" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7Y2GSMMc2OMJ2V4EOLri64W2Qcg9A-T_csYBC2Hzw3jdLpNtlUtrbHnpV-T2RwEZqTY4Hk9HgTSq0veH8IPALcZ72QS6zfrpjHEOAAHqPUsTYkK2LwNh-d5UCeGsEWeLn_xlf/s200/psi.jpg" /></a>
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<br /><div align="justify">Desde <span style="color:#666666;">que surgiu no horizonte do pensamento humano, a Psicologia vem superando obstáculos com a mesma rapidez com que cria as mesmas barreiras que dificultam o real entendimento sobre sua função e especifidades. Ao buscar apoio nas teorias pré-psicológicas de origem filosófica estruturalistas e funcionalistas, a nova ciência apareceu como uma aposta daqueles que buscavam conhecer os processos mentais e, de quebra, elucidar os mistérios do comportamento humano. Em suma: era hora do homem conhecer as motivações que agiam no interior de si mesmo.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">A partir disto, o que se viu foi uma proliferação de teorias, hipóteses, um mundo colorido de variáveis idealizadas somente para delícia e desespero de qualquer pesquisador. Vimos passar por nós teorias deterministas, teorias que pretendiam entender o cerne do comportamento - para manipulá-lo e prevê-lo, até o surgimento de uma abordagem que se situa para além da psicologia , uma metapsicologia na qual o comportamento não é sinônimo de personalidade.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Entre comportamentalismos e freudismos há mais coisas do que ousa sonhar nossa vã Psicologia - aqui me aposso de Shakespeare. Assim, para entendermos o lugar que a Psicologia ocupa no discurso contemporâneo é preciso de certos pré-requisitos. Dentre eles, cito:</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">1- Contexto sócio-histórico: Pois toda ideia nasce em um determinado cenário, revestido de contrasensos e peculiaridades. Skinner não pensou em modelar o comportamento humano sem considerar as exigências sociais as quais se impunham ao homem moderno. Tampouco as ideias de Freud foram alheias ao trajeto Viena-Paris-Alemanha fin de siécle em que se constituiram. Cada povo tem uma história e essa história é dinâmica, transformável a medida que é de autoria do próprio povo , quisera eu ser inédita neste ponto.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">2 - Status de ciência: Apesar do que supôs Immanuel Kant, a Psicologia poderia se tornar uma ciência, apesar de não se fazer valer de proposições matemáticas. Contrariando o pessimismo do alemão, a Psicologia deu largos passos diferenciando-se da concepção positivista reinante que lh e pariu para buscar outras searas. Essa é a grande virada psicológica: a ruptura com o paradigma positivista que nos faz entender a velha máxima cartesiana do "Penso, logo existo", como uma piadinha ingênua e sem graça perto do que já descobrimos no mundo Psi.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">É interessante que o discurso social seja tão importante para a validação de uma ciência tanto quanto o é o grau de fidedignidade alcançado por um experimento que se pretenda científico. Testamos tudo, mensuramos todas as variáveis possíveis e imagináveis e ainda assim, dependemos inescapavelmente do aval social para respaldar nosso direito de existir. Era assim na época de Freud, era assim na época de Skinner, por que agora seria diferente? </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Continuamos lutando por um lugar nesse vistoso campo das Ciências e - pasmem - como diria Figueiredo, ainda sentimos a necessidade de prestar contas a qualquer tribunal epistemológico que se revista com a pompa da Verdade absoluta para sermos autorizados a dizer: Sim, existimos, somos ciência e temos um lugar.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Dentro dessas questões acima citadas, talvez uma das mais interessantes esteja relacionada a este afã que muitos psicólogos têm no que tange ao respaldo ao seu saber. Por que precisamos de tal aval social, epistemológico, positivista para, simplesmente, existirmos? Responder a esta questão é, no mínimo, uma empreitada árdua, sem garantias de sucesso.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Buscamos incessantemente fazer-nos respeitar, não que isto seja errado, equivocada é a forma pela qual exigimos este respeito, quase rasteijando. </span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Existe uma espécie de complexo de inferioridade que perpassa a alma psicológica de tal maneira que nos faz submeter aos horrores positivistas: queremos usar branco , queremos ser objetivos, queremos, finalmente, existir, por a mais b. É este desejo que nos leva, algumas vezes, a falsificarmos nosso discurso em nome de uma adesão ao determinismo, a lógica médica, retirando da Psicologia o que ela tem de mais especial - sua subjetividade.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Desse modo, pisamos, xingamos qualquer coisa que esteja relacionada a uma subjetividade que nem de longe se explica pela química hormonal. Não somos um feixe de glândulas e neurônios a espera de um comportamento. Somos isso também, não só isso. Compreender a personalidade humana é uma tarefa que não se esgota na compreensão das estruturas mentais - caso assim fosse Titchener e seus companheiros estruturalistas não teriam perdido seus postos.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">É preciso - e a história nos confrontou com isto - que vamos além da descoberta dos arquivos mentais, que vamos além para acharmos o que diabos existe dentro dessas tais gavetas e de que forma esse conteúdo altera o modo de ser, de pensar, de sentir de alguém.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Todas essas opiniões não precisariam ser defendidas, mas o faço porque ainda me contorço diante de afirmações anacrônicas que sugerem um retorno a essa necessidade positivista, a essa ânsia de reconhecimento a partir da semelhança com tudo que produziu o engessamento paulatino da subjetividade - o principal objeto de estudo do psicólogo, a meu ver.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Tal como uma criança carente de afeto, ainda buscamos o olhar dos superiores, fazemos uma palhaçada ou outra, uma traquinagem aqui outra ali esperando o sorriso nos lábios daqueles aos quais devemos respeito e consideração, simplesmente pelo fato de que somos menores.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Deveríamos lutar contra tudo isso, contra essa necessidade de se apresentar no banco dos reús desse tribunal da Epistemologia, deveríamos ter coragem de esfregar nossa subjetividade por aí, bem indecentemente, e pagar o preço das conseqüências. O único alento diante de tudo isto é que não podemos generalizar esse complexo. Ainda existem revolucionários românticos que acreditam que não precisamos do branco gélido.</span></div>
<br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Porém, Enquanto pairar sobre nossas cabeças qualquer espécie de complexo de inferioridade , qualquer desejo de estar à altura do discurso médico-positivista, o psicólogo adorará usar um jaleco branco e se regozijará somente por ser chamado de "Doutor".</span></div>
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<br />Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-56808121664809021162011-08-01T10:47:00.004-03:002014-04-29T00:39:36.485-03:00Um entre cem sonetos de amor<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjf37eteJymnlH8ythER3ISwpJP9Wzv5LiU_CWzJfMQKxtuhneUFYv2RgCUJxYwT07dklRGEAfI_ZFc5_STqBeOWj3ojyByydSJzI9ykLQyk-V2jiIY6Fp4iWUg0_YuTkyJBnvz/s1600/neruda+e+matilde.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 133px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5635887581922862562" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjf37eteJymnlH8ythER3ISwpJP9Wzv5LiU_CWzJfMQKxtuhneUFYv2RgCUJxYwT07dklRGEAfI_ZFc5_STqBeOWj3ojyByydSJzI9ykLQyk-V2jiIY6Fp4iWUg0_YuTkyJBnvz/s200/neruda+e+matilde.jpg" /></a><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Em Outubro de 1959 , Neruda, poeta chileno conhecido por ser amigo do amor e exaltá-lo de tantas formas, escreve um pequeno compêndio de uma centena de sonetos dedicados a sua esposa, Matilde Urrutia. Os sonetos são precedidos por uma pequena dedicatória na qual Pablo esclarece suas "razões de amor" , as únicas razões pelas quais se justificam os cem sonetos de amor de madeira que só se levantaram porque a amada Matilde deu-lhes vida.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Em homenagem a todo ser que ama e é amado, trago aqui o soneto número XVII, que faz parte do singelo livrinho de bolso "Cem sonetos de amor" que a editora L &PM lançou este ano. Um poema que cheira a madeira, a sal e nos faz lembrar que o amor, embora quisesse o poeta fazê-lo, não se justifica.</span></div><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">XVII</span></div><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">NÃO TE AMO como se fosses rosa de sal, topázio</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">ou flecha de cravos que propagam o fogo:</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">te amo como se amam certas coisas obscuras,</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">secretamente, entre a sombra e a alma.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Te amo como a planta que não floresce e leva</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">dentro de si, oculta, a luz daquelas flores,</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">e graças a teu amor vive escuro em meu corpo</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">o apertado aroma que ascedeu da terra.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Te amo sem saber como, nem quando, nem onde,</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">te amo diretamente sem problemas nem orgulho:</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">assim te amo porque não sei amar de outra maneira,</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">senão assim deste modo em que não sou nem és</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">tão perto que tua mão sobre meu peito é minha</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">tão perto que se fecham teus olhos com meu sonho.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"><em>Pablo Neruda</em></span></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-41081563707446788602011-07-24T13:04:00.006-03:002014-04-29T00:40:36.270-03:00Por uma nostalgia salvadora<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjuOXb_NmYA85AMLK5GQPPi7d_8BX8oKBCR4Zn9-8WJwQlUJ8eialNtyy4MN7FtbgBN5wH5j081n5VdUjM4kF3lUTPInoyKl7Ay5yq4LI35qi-kXDeYGNLiM7IItYEcBon8GfNi/s1600/nostalgia_by_SuzyTheButcher.jpg"><span style="color:#999999;"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 174px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5632957534429808626" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjuOXb_NmYA85AMLK5GQPPi7d_8BX8oKBCR4Zn9-8WJwQlUJ8eialNtyy4MN7FtbgBN5wH5j081n5VdUjM4kF3lUTPInoyKl7Ay5yq4LI35qi-kXDeYGNLiM7IItYEcBon8GfNi/s200/nostalgia_by_SuzyTheButcher.jpg" /></span></a><span style="color:#999999;"><br /></span><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Eu sei que há tempos se critica - e sempre irão criticar - esse tipo rançoso que vive como se vivesse atravessado por um tempo outro, um tempo melhor, em que não se matava, em que não se morria - não pelo que se mata e pelo que se morre hoje, ah, estes eram os meus tempos.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Por todos os campos do conhecimento sempre existirá lugar para o teórico nostálgico - e eu não estou falando de Psicanálise apenas, estou incluindo aí, nesta mesma seara, os sociólogos, os linguistas, os filósofos. Sempre há uma legião de defensores dos dias de outrora. Eu também os defendo. Na cara dura. E direi por que.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">O passado parece ser o lugar das realizações, o lugar do conforto. O passado é sempre uma casa mobiliada como nos tempos das avós - cristaleiras, móveis de imbuia, e porta-retratos bem antigos estampando outros tempos. Assim é o passado, uma casa de vó, bem mobiliada, cheirando a pitanga e a genipapo. É a este lugar , situado em algum lugar da história dos homens, que muitos dedicam suas vidas, suas trajetórias. </span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">A contrário do que alguns possam pensar, ao contrário de toda a ladainha modernosa, o passado não é feito de naftalina: é lugar de reflexão por excelência - lugar para repensar o presente e de idealizar o futuro, o qual, nunca, mas nunca será tão colorido como o passado em preto e branco. Bem já disse Janis Joplin ao dizer que trocaria vários dias no futuro por apenas um dia no passado, e, o mais irônico de tudo é que a cantora de voz singular era considerada tão <em>avant gard tão prafrentex</em> em sua época. É. Até os moderninhos têm saudade de um não sei o quê que nem viveram.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Recentemente, o último filme de Woody Allen, "Meia-noite em Paris" revelou o que todos já sabiam, seja através de biografias do cineasta americano, seja por perspicaz observação: Allen é frequentador assíduo das confeitarias do passado, e mesmo na pele do ótimo Owen Wilson, Allen consegue nos deixar entender o porquê da nostalgia ser válida , ou melhor dizendo: porque o passado é alento.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">A esta altura alguém poderia perguntar: o que tem isso de novo? Realmente, nada há de novo em nostalgia a não ser a exaltação desta como nunca antes em outros tempos: roupas retrô, brechós, móveis vintage, tudo isto surge como uma novidade da sociedade pós-moderna que cansou - ou não resistiu - aos constantes apelos que bradavam: "inovem!inovem!". O passado, a casa e as receitas da vó - além de seus vestidos e coques - voltaram a ser valorizados e ostentados por cabecinhas tão modernas. Só que a onda nostálgica para aí na área do design, da estética.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Como sabemos, ou podemos suspeitar, não parece nada bonito assumir-se um nostálgico convicto. Retrô é apenas moda pós-moderna, de uma contemporaneidade ímpar, mas não vá sair por aí ostentando o que viveu - ou o que não viveu, mas que gostaria. O idealismo nostálgico - cunho o termo agora - não é bem vindo, está roto, é tão anacrônico como a palavra anacrônico.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Desse modo, aquele teórico que , porventura, deixar sua alma saudosa dos tempos da brilhantina falar mais alto e denunciar que bons mesmo eram os velhos tempos será execrado, chamado de antigo, ultrapassado, intransigente, até mesmo de "defensor de uma visão de futuro apocalíptica". Pois é na carona desses que vou.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Não peço desculpas por continuar ostentando o velho discurso de que sou do tempo em que as pessoas temiam os professores, não pelo autoritarismo destes, mas pela simples existência daquele sentimento misto de afeto e medo que um dia Piaget chamou de respeito. Sou do tempo de agora, mas bem que me agradaria esperar por um antigo Peugeot à meia-noite em Paris. </span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Por isso não peço desculpas por realmente constatar que o passado, sim, nem precisa ser aquele de Dali ou de Picasso, ali sim é que eram os tempos. Afinal, uma hora teremos que tomar partido, apesar desta sociedade politicamente correta que escorrega em tantas cascas de banana por amor à contemporaneidade. </span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Assistir a juventude aclamar Charlie Sheen como ídolo não por seu talento como artista, mas por sua vida desregrada, presenciar os supostos fãs de uma celebridade que vivia no terrível mundo das drogas deixarem bebidas álcoolicas em sua porta como uma bizarra homenagem não me deixa animada com os dias que virão e, provavelmente, todos estes fatos que assistimos diariamente me deixam mais saudosas do tempo não vivido, mas por mim internalizado, seja por sorte, seja por neurose.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Diante de tudo isto que vemos por aí é que não devemos nos encolher com medo dos olhos da crítica: a nostalgia é benéfica, talvez seja ela a única coisa que nos faz suportar o mundo. Bradem aos tempos da vóvó, estes sim!</span></div><br /><br /><div align="justify"><br /><br /></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-48884902269641213282011-06-09T20:56:00.005-03:002014-04-29T00:41:27.754-03:00Entre Plumas, paetês e lacanês<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvIW-qfpxg_RbCEmFa2EjIQMNs7Qa0CD983FsrLk_6LND_6If2DbKGgyfqAp0fFX-I8iy8171ABvAKdEDeKexKA7ZTA-0GMj7ctx2sMAAHoKEpNC3f3QlwIxwq3IAMPylpI4Mi/s1600/2282009-084102-palestrante-alexandre-garcia.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 150px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5616391295429691986" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjvIW-qfpxg_RbCEmFa2EjIQMNs7Qa0CD983FsrLk_6LND_6If2DbKGgyfqAp0fFX-I8iy8171ABvAKdEDeKexKA7ZTA-0GMj7ctx2sMAAHoKEpNC3f3QlwIxwq3IAMPylpI4Mi/s200/2282009-084102-palestrante-alexandre-garcia.jpg" /></a><br /><br /><br /><br /><div></div><br /><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">É certo que toda disciplina, todo campo de estudo deve promover eventos para que as ideias referentes a este circulem, ecoem por todos os lados e façam despertar em todos o desejo de prosseguir com a empresa dos pioneiros, daqueles que primeiro desbravaram o campo científico destinado à determinada área do conhecimento. Com a Psicanálise não é diferente: todos os anos pipocam eventos durante todos os meses com os mesmos objetivos: propagar a invenção freudiana, desenvolver temáticas que partam do pressuposto de que insistimos em algo que ainda faz sentido, apesar do centenário da ciência psicanalítica.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">O engraçado é que existe toda uma ciência oculta que envolve um evento científico do porte de um congresso ou seminário. Como minha experiência decorre de muita freqüencia nestes ambientes em que se propaga a Psicanálise - ou algo parecido com isto - foi interessante para mim, ao longo destes quase dez anos de trânsito nestes eventos, reunir alguns conhecimentos informais que me ajudaram a sobreviver em tais situações; isto é, procurei desenvolver determinadas capacidades para poder fazer parte do seleto grupo de conferecistas e ouvintes destes congressos que, se não logram êxito em propagar a invenção freudiana, são bem sucedidos em promover risos, gargalhadas e um texto irônico como este, ou que pelo menos pretende sê-lo.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Eis os motivos para tanto:</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Em toda a história dos congressos e seminários acadêmicos uma figura específica teima em aparecer, faça chuva ou faça sol, sempre existirá espaço , na plateia, para aquele ser que atrapalha o curso normal de uma palestra, de uma fala, geralmente de um palestrante-estrela, do qual falarei mais tarde. Esta figura, tal como um rato sorrateiro, chega antecipadamente ao evento, procura sentar-se nas primeiras cadeiras, frente ao conferecista (para que assim possa debater melhor com este a temática apresentada) e, não raramente, desperta ódio, desprezo e/ou raiva nos demais integrantes da plateia. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Pelo andar da carruagem, certamente o leitor deve ter adivinhado quem seria essa pessoa: o louco da palestra.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">O louco da palestra abusa da boa vontade ou da educação do conferencista, usualmente não se constrange em utilizar todo o tempo destinado às perguntas e reflexões para fazer uma espécie de "mini conferência", que, se não traz nenhuma contribuição para a temática ali proposta, também não pode ser vista como uma dúvida real: ninguém se engane: o louco da palestra gostaria mesmo é de estar ali, por entre arranjos florais, copos d´água e microfones, à frente, conferindo a palestra, e não na plateia, lugar do qual, incessamente, visa escapar com seus comentários equivocados, prolixos e desprezíveis os quais, muitas vezes devem ser entendidos como críticas agressivas diante do brilho do palestrante.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">O louco da palestra, apesar de sua agressividade nem sempre velada, faz irromper a criatividade do conferencista em dar-lhe uma espécie de "fora politicamente correto"; pois é notável que o louco visa tão somente o espetáculo, as luzes da ribalta; ele não visa saber, conhecer, inferir, ele visa mesmo é aquele tempinho em que fantasia rivalizar com o palestrante. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Geralmente o louco da palestra recebe respostas politicamente corretas dos palestrantes. Algo do tipo: "Agradeço sua atenção, de fato não tinha pensado neste tema desta maneira" ou "Agradeço sua contribuição, anotarei para que em outras oportunidades possa falar sobre isto". </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Uma ou outra a resposta politicamente correta poderia ser traduzida, em termos menos formais com um: "não me interessa o que você tem a dizer, certamente é uma besteira, mas para não ser mal educado, vou fingir que o que você falou tem alguma importância para mim". Este é o mundo: cruel e frio, não se engane, puro leitor (ui, minha veia machadiana agora grita).</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Como a idiotice não é privilégio do louco, cabe falar também do conferencista, ele mesmo idiota, tachado como a estrela do evento que muitas vezes confia tanto no seu próprio taco que não se dá ao trabalho de preparar, de fato, sua fala: recorre frequentemente a anotações esparsas, de cadernos amarelados e sai pinçando um trecho ou outro que foi capaz de produzir há cerca de 10 anos ou mais.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">O conferencista-estrela muitas vezes não se julga ao alcance da simplória plateia; não raramente começa sua fala com um: "Não sei se serei claro, mas se vocês não conseguirem alcançar, digam-me que eu tento falar de outra forma". Àquele que não é <em>habitué</em> destes eventos, certamente concordará com o conferencista-estrela; devido também à inexperiência, realmente pode pensar que está muito aquém daquele ser que surge à mesa e toma de assalto toda a plateia, uma mente brilhante que sequer consegue ser compreendida devido ao seu brilhantismo. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Quase sempre o palestrante-estrela usa de subterfúgios conhecidos do mais baixo idiota: começa sua fala com uma frase de efeito que pouco ou nada tem a ver com a temática que propõe. É prolixo, arrogante e isto se pode notar pelo número de bocejos por segundo observados na plateia.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Quando era estudante, não conto as vezes em que me rebaixei, com toda a neurose que Deus me deu, diante daqueles semi-deuses que para mim falavam tão mais bonito à medida que usam termos do tipo "o significante barrado" " a borda de Moebius", "lalangue", e tantas outras palavras deste idioma tão estranho que é o lacanês (uso inapropriado dos termos desenvolvidos pela teoria lacaniana pelo sujeito que, perversamente, não se contenta com o seu suposto saber e nega a possibilidade de, um dia, vir a tornar-se dejeto).</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">É um tal de "sujeito barrado" "letra", "significante Outro" "banda de Moebius", "cross cap", "lalangue", sem falar no uso inadvertido de termos em língua francesa para dar mais veracidade à encenação do suposto saber. Se você não é da área, não entende bulhufas de Psicanálise ou algo que a valha, ao menos entenderá que , no mundo acadêmico, para que você seja respeitado, muitas vezes é necessário recorrer a um jogo sedutor o qual se vence quanto mais palavras e termos estranhos usar: simples assim, quanto mais eloquente parecer, quanto mais ambíguo e obscuro for, maior a possibilidade de não entenderem, logo, serei o palestrante o qual a plateia não conseguirá alcançar. Este é o mundo: cruel e frio, inocente leitor.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Neste mundo imagético o qual habitamos, uma imagem e um lacanês vale mais do que qualquer entendimento real sobre o assunto.</span></div><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Há, entre a seara dos palestrantes, um tipo muito interessante, além do pedante que insiste no lacanês: o palestrante louco. Geralmente apresenta-se como um ser estranho, possivelmente mal amanhado (mal vestido e desgrenhado) como se isto fosse garantia de que, se aquele ser não tem tempo para pentear as madeixas, certamente isso se deve ao fato de estudar muito, mas muito mesmo, a ponto de desconhecer o objetivo de um pente. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Estes seres surgem e se proliferam nas palestras e seminários de Psicanálise; é o famoso estranho que mais parece perdido, como se um ser mítico, fosse, talvez advindo do distante mundo neozelandês dos <em>hobbits</em> (analogia que devo a uma querida professora) que veio ao seminário obrigado por deveres acadêmicos, pois é notória sua vontade de estar em casa, sem banho e sem pente, ensandecido diante de tantos compêndios, dicionários e livros técnicos.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">O palestrante louco não fala coisa com coisa; costuma apresentar-se de maneira histriônica e visa tamponar a própria vacuidade com termos em outras línguas para mostrar erudição. O ser mítico, como será perceptível ao longo de sua fala, não sabe mais do que ninguém da plateia, não sabe mais do que qualquer rato; seus textos são marcadamente desorganizados e não chegam a lugar algum. Não concluem o que não desenvolveram e nem sequer introduziram.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Neste ponto, alguém poderia perguntar: é fácil distinguir um palestrante de verdade de um engodo? Não, a resposta é não; é somente com muita experiência nestes ambientes e, sobretudo, com o crescente conhecimento que adquirimos ao longo da formação acadêmica que começamos a descobrir quem de fato sabe e quem de fato enrola, inventa, alucina.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Aqui cabe o conhecimento popular e um trechinho de "Canto de Ossanha", de Vinícius de Moraes: "O homem que diz sou, não é, porque quem é mesmo diz , não sou". Ou seja, em poucas palavras: humildade e sabedoria caminham juntos, e estes seres advindos de florestas longínquas, além de demonstrarem profundo mal gosto em sua apresentação pessoal, também demonstram que , não necessariamente você precisa se desgrenhar para ser, de fato, estudioso. Muitas vezes estas pessoas são apenas falácias, discurso vazio recoberto de uma arrogância sem limites.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Por último, mas não menos importante, não poderia encerrar este textículo sem mencionar uma das figuras das quais mais gosto, não pela eloquência e sabedoria, mas pelo que ela me suscita em sua essência. É o famoso palestrante-psicografista. Com frequência este palestrante surge e inicia sua fala com uma revelação: tem mantido contato com seres que passaram desta para melhor, tem conversado com grandes nomes da Psicanálise, como Freud, Lacan, Winnicott, Melanie Klein, enfim, todos os grandes nomes, numa espécie de mesa branca ou coisa que o valha e trazem os resultados disto na palestra. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">É comum que o palestrante-psicografista apresente textos conhecidos como "colcha de retalhos", nos quais não se sabe quem está falando, se o próprio ou a entidade invocada. Como se trata de Psicanálise lacaniana, sabe-se da importância da oralidade no discurso lacaniano, mas há gente que abusa, usam expressões como "Eu tenho pensado essa questão com Lacan" , "É o que penso com Freud", etc. Além destas citações que explicitam um contato íntimo com a entidade psicanalítica que parece estar sempre acessível ao mundo terreno. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Sempre que ouço alguém proferir algo do tipo: "Eu penso com Freud", ou "Venho desenvolvendo essa questão com Lacan", me vem à mente a situação de um bando de psicanalistas brincando da famigerada "brincadeira do copo" ou "tabuleiro ouija". Queria saber aonde acontece o tal encontro, como entrar em contato. Venho observando que Lacan vem se tornando uma entidade do porte de um Emmanuel e que os palestrantes não economizam em citações que indicam que existe, de fato, um contato íntimo com o pensador, muito disto se deve ao fato dos textos nem sempre obedecerem às mais simples regras metodológicas: se você vai citar alguém, anuncie-o antes, ou, invariavelmente, a plateia ficará confusa sem saber se tal trecho é seu, se é psicografado, se é do autor renomado, enfim, muitas questões que ultrapassam nossa vã filosofia, ultrapassam o entendimento que temos neste nosso pequeno mundo. </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Só não vou me admirar quando psicografarem uma obra de Lacan e se apresentarem como uma espécie de Doutor Fritz da Psicanálise. Há louco para tudo, mas há espertos para tudo também.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Ao longo deste texto também lembrei de outras situações, tais como o momento do coffee break em que as pessoas costumam se engalfinhar por um suco de cajá, ou mesmo o palestrante humilde que tudo que tem deve à Freud ou Lacan, aquele que inicia sua fala com expressões do tipo "estou aqui, na verdade, macaqueando Lacan, porque tudo ele já disse". Estes parecem ser os mais humildes, mas de uma humildade que beira à ignorância: Se Lacan disse tudo, porque você ainda está aqui? Vá embora, vá a piscina do hotel, deixe essa sala fria e vá descansar, porque Lacan já disse o que você diria, então, esqueça a possibilidade de falar algo novo, já o fizeram, a você cabe a cadeira do deck da piscina.</span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">São tantas as situações vividas em um congresso, certamente não abordei nem metade do que minha observação tem encontrado por aí, independente do estado, da região do país em que esteja. Apesar de tudo isto, dos loucos, dos hobbits, das estrelas, dos humildes, da plateia, eu gosto, não vou negar, gosto de observar, pois o que seria da Ciência se não fosse o compromisso de continuar o empreendimento ao qual tantos homens célebres dedicaram suas vidas? </span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Mentira, vou mesmo é para garantir meus pontos no currículo lattes e rir.</span></div><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;"></span></div><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;"></span></div><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;"><em>Ilustração: esta imagem foi buscada aleatoriamente através do Google images; achei que deveria manter no anonimato as figuras reais que inspiraram este texto.</em></span></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-13148504186601285662011-05-05T23:53:00.003-03:002014-04-29T00:42:08.962-03:00Ato de saudade.<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhD_q3YlwrGF8CFxWUkmltnKhWzdl_NMarNaDm5tgF8hiW-Gi1dmT5atFlDXWUDtXa-pjIagA7Qecilhqe7tEnnGDnzjGli-kX08wlcHTF-LpNooM5IEy_DUyV9tOSlhyphenhyphenubeECh/s1600/canstock5213756.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 122px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5603432815952879682" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhD_q3YlwrGF8CFxWUkmltnKhWzdl_NMarNaDm5tgF8hiW-Gi1dmT5atFlDXWUDtXa-pjIagA7Qecilhqe7tEnnGDnzjGli-kX08wlcHTF-LpNooM5IEy_DUyV9tOSlhyphenhyphenubeECh/s200/canstock5213756.jpg" /></a><br /><br /><div></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">Do doce amor agora me restam uns olhos</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">Esses olhos tão profundos que Deus te deu</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">Agora, quis a vida, que passassem dois dias assim, longe dos meus</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;"></span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">Do doce amor agora me restam uns olhos e uma boca</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">Do doce amor, agora, é a saudade</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">que invade e atesta</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">que, de fato, só o que resta</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">a uma namorada bem modesta</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">é uma meia dúzia de rimas </span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">é ser um tanto quanto brega</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;"></span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">e chorar a ausencia de quem</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">somente por dois dias</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">se ausenta</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;"></span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">Doces olhos, voltem</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">que dois dias é muita coisa</span></div><br /><br /><br /><div><span style="color:#666666;">pra quem te quer a vida inteira.</span></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-29883324.post-21934821888686039392011-05-05T00:39:00.006-03:002014-04-29T00:43:11.890-03:00Transferência: O difícil lugar por trás do véu rendado<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhILV2AC1Md1iyyGpHPnk2xJVPwwgv7UaMQk8sREc77q1jddBnDJN1-TGwwgu5SvMLTZF-N5Ft2ZlZQgIXWzI3kZI-AwyLzP2k6-T42E2cDkGAQjMgh05AY4tZk-T2O6rzQDr2c/s1600/veu.jpg"><img style="MARGIN: 0px 10px 10px 0px; WIDTH: 200px; FLOAT: left; HEIGHT: 150px; CURSOR: hand" id="BLOGGER_PHOTO_ID_5603079570589036834" border="0" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhILV2AC1Md1iyyGpHPnk2xJVPwwgv7UaMQk8sREc77q1jddBnDJN1-TGwwgu5SvMLTZF-N5Ft2ZlZQgIXWzI3kZI-AwyLzP2k6-T42E2cDkGAQjMgh05AY4tZk-T2O6rzQDr2c/s200/veu.jpg" /></a><br /><br /><br /><br /><div align="justify"><span style="color:#999999;">Em</span><span style="color:#666666;"> 1912, em um texto chamado "A dinâmica da transferência", Freud já evidenciava o caráter perigoso da transferência, talvez o conceito psicanalítico que mais suscita polêmicas nos mais variados âmbitos em que a invenção freudiana penetrou.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><span style="color:#666666;">No referido texto Freud indica, de saída, que a transferência é a arma mais forte de resistência, justamente por sua intensidade e por sua persistência. Em outras palavras, o autor chega a afirmar que a transferência consiste numa luta entre o racional e o instintual, entre a compreensão e a procura da ação entre médico ( na época não existia a função do psicanalista) e paciente. </span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><span style="color:#666666;">De tudo isto, podemos dizer que, em palavras menos rebuscadas, transferir é próprio do neurótico e, se aceitamos a assunção de Freud de que todos somos neuróticos - uns em alto nível, outros ainda engatinhando rumo à neurose - e a transferência, essa arma quase letal está presente em tantas outras situações que não necessariamente clínicas, entre médico- paciente.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><span style="color:#666666;">Existe transferência porque existe o bom neurótico que, devido a sua ambivalência típica, dirige sentimentos afetuosos positivos e negativos a uma figura que assume um lugar em seu desejo. Além de Freud, é interessante lembrar também de Racker , que vem nos ensinar que a transferência não se justifica pela pessoa do médico, nem por sua conduta. Ou seja, mais uma vez, simplificando: </span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">O lugar da transferência é um lugar de suplência: o sujeito alvo de transferência , seja ele médico, analista, psicólogo, professor e até amigo, nunca é ele mesmo quando revestido pelo belo véu da transferência aos olhos do outro, que fantasia, que o pinta com as cores mais bonitas, que tece o véu com as rendas mais esmeradas. O grande problema é que o véu é - e deve ser - rasgado, para que o sujeito volte a ser ele mesmo.</span></div><br /><div align="justify"><br /><span style="color:#666666;">Existe a ambivalência típica do neurótico embasando e dando forma ao véu da transferência, véu este do qual o sujeito nada sabe, posto que se situa por trás desta fina camada revestida de fantasias, tecida pela via do imaginário do Outro.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><span style="color:#666666;">Assim, entramos, não mais na discussão teórica acerca do conceito "Transferência", mas começamos a abordar os efeitos desta, efeitos do olhar do Outro, que me torna um Outro para ele também. Assim, somos alçados a um lugar de suplência, um lugar que o o Outro nos dá. Aos olhos do Outro não somos nós, somos Outro: mais belos, mais fortes, mais seguros e, também, menos belos, menos fortes, menos seguros.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Da tranferência, desta que acontece em todas as situações em que existam mais de um sujeito, só se sabe seus reflexos. Ninguém supõe o que representa para um Outro, mesmo que esse Outro nos coloque naquele lugar privilegiado para, depois , nos retirar a fantasia, nos desvelar. </span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Pelo que se nota, ocupar esse lugar requer sensibilidade e, diria eu, até humildade - claro que não estou falando aqui de um lugar teórico - estou falando, em geral, da humildade que se deve ter em se saber que se é tudo diante do Outro, menos si mesmo. Ao passo que um sujeito pode ser alçado às alturas por alguém, pode ser também destituído deste lugar, posto no lugar de dejeto ( não resisti e me remeti à Lacan) . </span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">O dejeto, este sim é um lugar que não desejamos ocupar. Mas ocupamos. Na situação clínica, já nos ensina Lacan, que este lugar é previsível, deve acontecer. Mas , e o narcisismo? Como fica diante de tudo isto, desta queda súbida das nuvens rumo ao chão? Resposta: Analise-se.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><span style="color:#666666;">Estou aqui pensando em transferência e escrevendo intento elaborar esse lugar de dejeto, coisa pouco confortável com a qual teremos que lidar. Professor, por natureza, é um sujeito que se coloca - e é colocado - em lugar de transferência. Não se pode saber o que um aluno pensa do professor, por sua didática, por sua técnica e por seu conhecimento, você poderá ser reconhecido, mas, repito o que já disse noutro momento, nem tudo é cognição neste mundo de meu Deus.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">A palavra aluno tem uma significação tão pejorativa mas deve ser trazido aqui à guisa de justificativa da temática escolhida. Aluno - A-luno, aquele que é desprovido de luz. Não concordo, mas , vejamos. Se é desprovido de luz, consegue, misteriosamente iluminar, por seus olhos, os olhos do Outro, este Outro que vem em suplência.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Aluno não é sem luz, mas , talvez pelo fato da transferência estar relacionada à saber - e este saber não quer dizer um saber intelectual, apenas - é importante que veja a luz no Outro, o professor. É aí que reside a luz do aluno: quando ele é capaz de dirigi-la ao professor, que, coitado dele, nada ou pouco sabe diante do desejo do outro, tal como o analista. Assim chegamos aos céus. Mas o tombo, o tombo é feio e previsível.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">O tombo vem no momento em que o sujeito assume suas cores reais, ele é aquilo e não mais é recoberto pelo véu imaginário repleto das rendas mais belas e feito no tecido mais delicado. Somos xingados, expurgados, criticados, imitados ( e se algum professor acha que nunca foi imitado, sinto dizer, não existe professor que não tenha sido, uma vez na vida, imitado por seus alunos, seus trejeitos são meticulosamente estudados, talvez mais até do que a teoria que você tente trabalhar) ejetados da cadeira do suposto saber. Eis o tombo.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Alguém poderia perguntar se é possível escapar desse lugar tão instável, escapar desse movimento que, ora lhe condecora, ora lhe condena. Não. A resposta é não. Porque um sujeito será um Outro para outro sujeito ( mesmo que eu tente, é difícil deixar Lacan) e este Outro é repleto de todos os materiais possiveis à sua construção, menos os reais). Não se escapa à transferência, e a ela se deve, no mínimo, a aprendizagem da humildade, na aceitação da função-dejeto.</span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;"></span></div><br /><div align="justify"><span style="color:#666666;">Nesse momento, lembro de Machado de Assis, que, se não nega a inevitabilidade do tombo, o minimiza em seu célebre aforismo: "Antes cair das nuvens, do que de um terceiro andar". </span></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify"><br /><br /><br /></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/02364613502204392033noreply@blogger.com0