terça-feira, julho 04, 2006

O dito e não dito

Já ao nascer o ser humano se depara com a inquestionável fragilidade de si perante o mundo que se descortina aos seus olhos. Tudo é diminuto e tão mole...A sensação é que podemos ser partidos ao meio, quebrar, assim, de uma hora pra outra. Somos, ainda na fase bebê, providos de sistemas fisiológicos complexos do qual nada sabemos, nem sequer podemos falar. Sim, somente sabemos nos expressar através de choro e grunhidos, os quais, felizmente, nossa mãe sabe traduzir.
Aos poucos, o ser humano vai fazendo parte do mundo simbólico, ele vai adquirindo espaço através da voz, da fala. A linguagem é um modo aperfeiçoado, através do qual podemos reivindicar, discutir, convencer, brigar, amar...Enfim, uma vez que nos foi dada – ou adquirida – a linguagem, nunca mais fomos os mesmos. Podemos falar e nos expressar e, presume-se, que, ao ouvir, todos os que nos cercam vão entender.
Apesar de ser uma aquisição bastante antiga, há um certo descompasso ao utilizar a linguagem – falo da fala. Há pessoas que crescem sem saber falar de si, sem saber falar do outro e, desse modo, não se fazem entender e tampouco estão preocupados em ouvir.
Há gente que paga para falar, indo a psicólogos, psiquiatras, psicanalistas, Há quem estude para calar e deixar o outro falar. Há quem prefira ir a um bar, pagar pra poder conseguir falar aquilo que não consegue calar internamente.
Há gente até que fala de graça diante de um padre. Há gente realmente problemática que não sabe falar e que não sabe ouvir. Há quem diga mais no silêncio do que com mil palavras recheando suas bocas.
Há gente que diz sem dizer, há quem fale de amor brigando aquilo que não consegue falar de amor amando. Enfim, é realmente um problema a aquisição da linguagem para alguns seres humanos.
Mas, o que realmente se quer dizer? O que é tão temível que cala a voz? Para responder a esta pergunta teríamos que olhar para dentro de nós mesmos e, individualmente, buscar nossas respostas. Acredito que nem todos possam fazer isso. O que não é dito, certamente já está dito internamente, num lugar onde somos, aonde não pensamos. No nosso inconsciente, no Acheronte nosso de cada dia.
Engraçado também é que, depois que colocados em palavras, alguns sentimentos parecem perder o brilho que têm quando sentidos. É, mais uma vez, a tentativa do se humano de definir, de problematizar tudo que vê pela frente. Pobre é aquele que aprende a palavra “saudade” através do dicionário.
Posto que “Saudade” não se define, mais aconselhável é senti-la, cada um, e defini-la dentro de si mesmo. Violência mesmo é o que fizeram com “eu te amo”. A sonora frase foi transformada em melodia, metida em sonetos, exposta aos olhos de todos, posta na boca de todos....Eis o “eu te amo” na mídia. Os ortodoxos sentimentalistas defendem que jamais se deve banalizar tal frase, outros, pouco preocupados com a forma e com o conteúdo da frase, saem entoando-a a torto e a direito.
Eu sou a favor da fala, da escuta , da análise do que falamos e do que escutamos do outro. Eu, especialmente, sou a favor que se diga, no silêncio ou na gritaria. Apenas que se diga e que se sinta pra dizer, pois, o que vale dizer sem sentir?