terça-feira, agosto 04, 2009

Dos vinte e sete




Salve a poesia instantânea

filha dos meu vinte e sete anos

e rasteira como a primeira dos meus

quinze.


Salve a poesia instantânea

escrita com a pena do entusiasmo

do maior amor do mundo

que teima em aparecer e desaparecer

todas as vezes em que meus olhos teimam em fechar



Salve a poesia que é filha do amor

dos meus vinte e sete anos

que invade e anuncia

o velho amor dos meus pobres quinze anos.

segunda-feira, agosto 03, 2009

O menino do pijama listrado: Um ensaio sobre o mercado livre das relações humanas






Sem dúvida haveria diversas maneiras de abordar o filme The boy in the striped pyjamas ( baseado na obra homônima de John Boyne). Uma delas certamente seria discorrer sobre as mazelas causadas pelos nazistas ao povo judeu no século XIX, durante a Segunda Guerra. Outra, com certeza, poderia ser falar da infância e da inocência perdidas, tal como nos sugere a frase que inicia a narrativa, " A infância é medida por sons, aromas e visões, antes que o tempo obscuro da razão se expanda." , de Jonh Betjaman.


Eu quero ir por outro caminho, um caminho que nos fale sobre as diversas provações que passamos diante da trajetória que fazemos acima destes sete palmos que um dia nos servirão de teto. Quero dizer bem claramente que, para mim, o filme pode ser abordado a partir da noção de que se trata, mais do que de uma estória sobre o Holocausto - sabemos que a temática já foi explorada à exaustão por tantos filmes como A lista de Schindler, O julgamento de Nuremberg, e , mais recentemente, por outros como O homem bom, A vida dos Outros e O leitor, além de tantos que trazem o horror nazista como pano de fundo para contar estórias ordinárias, de pessoas simples, que, de alguma forma, foram afetadas pelo que se passava no mundo à època.

O menino do pijama listrado, título em português da obra inspirada no livro de John Boyne, para mim, fala de provas de amor.


Para deixar mais claro, mas sem por isso revelar o desfecho do filme, trata-se de uma estória contada por Bruno, um menino alemão de oito anos, filho de um soldado que faz parte do alto comando nazista. A narrativa é contada pelo ponto de vista dessa criança que é obrigada a deixar seu antigo lar para acompanhar sua família que se mudará para Auschwitz. A casa de Bruno ficava nas imediações do campo de concentração mais famoso por ter sido cenário de uma das maiores barbáries nazistas: o massacre do povo judeu.


Esse filme certamente, ao que tudo indica, poderia trazer cenas chocantes e de efeito - o efeito de nunca esquecermos o que foi feito em nome da primazia de uma raça sobre outras, realmente existem várias cenas difíceis, porém, a partir do relato de Bruno, uma criança que não entende o que se passa aos arredores de sua casa fria e sem vida, entendemos que por trás deste cenário existe a ruína de uma família, assim, simples, como a minha e a sua, "mamãe, papai, avô, titio", já diriam os Titãs.


Em suma, existe uma mãe, um pai, e duas crianças, Bruno e sua irmã Gretel que vêem suas vidas mudarem a partir de sua chegada ao campo de concentração. A mãe de Bruno, alheia em suas atividades de dona-de-casa e mãe em tempo integral, pouco percebe o tamanho da atrocidade que é cometida ali, praticamente no quintal de sua bela casa. A irmã de Bruno, Gretel, aos poucos vai assimilando a filosofia de Hitler e, aos poucos, começa a desenvolver uma postura mais adequada ao que se esperava de uma "juventude militante", sem dúvida, uma tentativa de fazer-se importante para seu pai, para quem as palavras de Hitler deveriam ser seguidas com obediência irrestrita.


Nesse pano de fundo, percebemos que a estória é mais uma estória de pessoas e as provas de amor que, constantemente, em diversas fases de nossa vida, vamos dando e recebendo. Se seguirmos o trilhamento do filme, vemos uma mulher que, ao perceber a tragédia que lhe cerca, implora ao marido para que lhê dê uma prova de amor saindo daquele lugar, e , assim, extirpando de suas almas qualquer resquício de culpa que poderia lhes acometer.
Esta prova, diga-se de passagem, não lhe foi dada pelo marido, o qual, por amor ao nazismo e ao que acreditava, continuava a contribuir com o regime totalitario responsável pelo maior genocídio do qual se tem notícia em todas as épocas da estória.


Qual seria a prova de amor de Gretel, a jovem irmã de Bruno, se não incutir em sua personalidade o rigor, a disciplina e o pensamento nazista segundo o qual os judeus deveriam ser punidos por serem pessoas inferiores? Devia isso ao pai, queria ser vista com orgulho, tanto é ue o filme deixa em suspenso uma certa admiração que a jovem nutria pelo belo tenente que servia em sua casa. Gretel, tal como toda criança, visava a atenção, o interesse do pai e um meio de fazê-lo seria engendrar em sua personalidade, ainda infantil, o discurso que agradaria a mentalidade paterna, isso não é novidade, é coisa da Psicanálise. (!!)


Para mim, uma das maiores provas de amor que vemos no filme vem da parte de Bruno, quem conta a estória. Bruno, em uma de suas explorações, faz amizade com o menino judeu Schmuel e logo toda a diferença existente entre eles e metaforizada pela cerca de Aschwitz que os separa passa a encantá-los e atraí-los. Vê-se bem que não seria uma cerca capaz de impedir que uma rápida amizade acontecesse entre os dois meninos da mesma idade mas de mundos tão diferentes.

O momento da prova de amor acontece quando Bruno, visando se desculpar com Schmuel decide empreender uma busca pelo pai do seu novo amigo. Aí é que começa o clímax da estória e eu não estragarei aqui. Poupo-lhes dos detalhes.


Trocando em miúdos, eu poderia ter visto o filme e ter falado aqui sobre o massacre dos judeus, sobre a servidão do povo alemão ao regime totalitário, sobre a ámizade de Bruno e Schmuel, enfim. No entanto, prefiro eu falar das provas de amor, que, para mim, movimentam a narrativa e se constituem em causa do clímax final.
Há muitas outras questões que podem ser aqui analisadas, como a difícil relação que o pai de Bruno nutre com sua própria mãe, personagem secundária sobre qual pouco se sabe, a não ser que não concordava com o trabalho do filho: em um dado momento, a mulher de Ralf, o pai do menino Bruno, comenta que nem sua mãe o amava, o que também nos faz pensar em provas de amor que Ralf não recebera, sobre sua personalidade, sobre o que lhe teria motivado a seguir os passos de Hitler, e enfim, constituir sua estória relacionando-a ao regime nazista.


Há várias e várias temáticas secundárias, relações a se estudar e , ainda assim, fico com a questão das provas de amor. Esquecendo um pouco o filme, podemos generalizar a questão: Por quantas provas de amor poderíamos medir nossas vidas? Será que não se trata sempre de dar e receber provas de amor? Uma outra maneira de dizer: Como nos doamos para as relações e para os objetos para os quais dirigimos nossa libido ( já utilizando o linguajar freudiano)?


Não é raro ouvirmos falar em aprendizado, conhecimento e sofrimento ao falarmos da vida, do caminho que percorremos. Dostoiévski uma vez já disse que feliz era aquele que conhecia o motivo de sua infelicidade e, diante disto, não serei eu aqui a primeira a falar de vida e relacioná-la com termos como "felicidade" e "infeliciade".


Portanto, prefiro falar das diversas provas de amor que a vida nos incumbe de dar e receber. Por elas é que vivemos nossa vida. Desde pequenos acostumamos a receber e é isto que nos faz transformar de um bebê para um sujeito, daí crescemos e aprendemos que também é possível dar provas de amor e que, justamente por dá-las é que podemos receber tantas outras.

Durante nosso caminho, no entanto, não é fácil ter consciência de que a vida é repleta e digo mesmo que somente feita de provas de amor: Por muito tempo podemos achar que não recebemos provas suficientes e que, por isso, o mundo terá culpa e será responsável pela transformação de um sujeito em um sujeito plenamente insatisfeito com o que recebeu e que, por isso, incapacita-se de dar estas provas a outrem.


Aí crescemos, mais e mais, e percebemos que mais importante do que choramingar as provas que não recebemos é quitar as dívidas dos outros e recomeçar do zero, dando tantas provas quantas nos couber. É isto, em suma, que corresponde ao sentido da vida: um mercado livre de troca de provas de amor, provas estas que permearam a estória de ruína de uma família em O menino do pijama listrado.


O interessante é notar que a família pode saltar da tela e se transformar na minha, na sua, na nossa. É muita prova de amor e por isso não raramente nos perguntamos...será que damos o suficiente? Será que recebemos o suficiente? Acredito que nunca chegaremos a estas respostas qe tantas vezes os mais sábios procuram na análise. No entanto, creio que somente em nos perguntar já estaremos lucrando e mais aptos para dar mais.


No fim do filme? No fim do filme você se compadece e percebe que dar acaba sendo sempre mais importante do que receber. É assim também na vida real.