segunda-feira, agosto 10, 2009

Ora bolas!


" A maior dor do mundo é pente com dor de dentes"


Mario Quintana



Era poesia sobre tudo...os famosos Quintanares, aclamados por gente como Manuel Bandeira e Érico Veríssimo, sem dúvida, estão para a história da poesia brasileira como Neruda está para história do Chile. Em Ora bolas: o humor de Mario Quintana ( L&PM Pocket, 2009), o jornalista Juarez Fonseca reúne 130 historinhas ou "causos" que, mais do que revelar o poeta Mario Quintana, nos apresenta a uma personalidade vivaz e irônica, por vezes cuel, facetas deste gênio das palavras em forma de versos.


O livro pode ser lido assim, em algumas horas de uma tarde chuvosa, em uma noite tediosa ou mesmo no meio de uma manhã meio preguiçosa. Nao importa: Quintana sempre será Quintana e o leitor será convidado a passear pelas agradáveis ruas da capital gaúcha, sentar em um banquinho da Praça da Alfândega ou saborear um café preto em qualquer bar na rua da Praia. Na verdade, o cenário pouco importa; se você não está em Porto Alegre, talvez comece a sentir, por correspondência, o clima aprazivel que gerou o poeta; se não conhece a capital gaúcha, certamente terá vontade de visitar todos os lugares que se tornaram cenário para as mais variadas historinhas que revelam o lado fanfarrão e zombeteiro de um poeta que não raramente é lembrado como uma personalidade doce, deveras doce.


No entanto, o que o leitor de Ora Bolas acabará inevitavelmente descobrindo é que por trás do poeta, do escritor de "Sapato Florido" , existia também uma veia cômica, um humor espontâneo, capaz de nascer das mais adversas situações, como exemplifica uma pequenina história contada por Juarez Fonseca:


" Na época em que trabalhava na Editora Globo, [ Mario Quintana] andava sempre duro. Como o salário terminava antes do fim do mês, vivia pedindo vales de adiantamento. Até que um dia o caixa chiou:


- Mas seu Mario, o senhor já tem um monte de vales!"

Quis saber, com aquele sorriso maroto:


- Afinal, são vales ou são montes?"



Era assim o tal Mario Quintana, poeta que não apreciava estar em meios intelectuais, que desdenhava da adoração de muitos que o procuravam para mostrar-lhe uns poemas, que nunca fora aceito pela Academia Brasileira de Letras. Vivia, tal como nos revela a historinha acima, na maior parte de seu tempo sem dinheiro, das suas finanças cuidava a sobrinha, Elena. No entanto, o que o leitor irá descobrir a cada virar de página é que o poeta não tinha nada de triste com essa situação, ao contrário: era capaz de fazer piada fosse qual fosse a situação.


O que todo leitor descobrirá, por si só, ao ler Ora Bolas é que Quintana, mais do que um ótimo poeta, era uma personalidade interessantíssima. Acho que muitos, inclusive, dariam um quinhão de seu salário -os que o recebem - para levar um fora - sempre elegante e inteligente - do célebre poeta que, apesar do talento, pouco ou nada fazia para exaltá-lo, como bem expressa a opinião de MonteiroLobato sobre o amigo gaúcho:


" Que coisa bonita o verdadeiro talento! Como vence, como se impõe - como se alastra por mais escondido que comece..."



Mais razões para passar umas horas agarrado à Ora Bolas? Não sei, as que tenho são essas, descubram outras por si mesmos, ora bolas - diria o poeta.

domingo, agosto 09, 2009

Não espere muito.


" Não devemos esperar muito dos outros ou do mundo exterior em geral. Aquilo que um homem pode ser para outro não é grande coisa"


Arthru Schopenhauer



Esse é um dos conhecidos aforismos de Schopenhauer, filósofo alemão do século XIX que hoje é citado na maioria dos livros de Filosofia, seu reconhecido talento para analisar e observar o comportamento do ser humano em sociedade é modelo de vida para alguns, mas, nem por isso, Schopenhauer é unanimidade, é , por assim dizer, um filósofo politicamente correto.


Em A cura de Schopenhauer ( Ediouro, 2006), Irvin Yalom nos apresenta a vida e a obra de Schopenhauer, como se estivesse dando um curso para leigos sobre o pensamento, as idéias e a vida polêmica do filósofo alemão. Claro que o livro nos conta também a estória de um grupo de pacientes em terapia, como estes vão se reconstruindo, construindo identidades e buscando novas verdades, tudo isso entremeado pelos breves capítulos em que o autor apresenta ao leitor a estória de vida de Schopenhauer.


Ao folhear de páginas, o autor encontrará, possivelmente, muitas características deste grande homem que, por sua crítica mordaz à sociedade de seu tempo, aos homens de "bem , foi, por muito, desconsiderado. Apesar de tudo, Schopenhauer nos mostra a vida por outras lentes, sem cores vivas, mas , nem por isso irreais, foi por isso que Yalom me conduziu a conhecer mais a obra de Schopenhauer . O que descobri? que ele não estava tão errado assim.


Em "Parerga e Paraliponema" ou " Aforismos para a sabedoria da vida", o leitor é apresentado a um Schopenhauer mais maduro - este foi seu último livro - mas ,nem por isso, dócil. Devotado a temas inéditos para muitos filósofos, Schopenhauer nos dá dicas sobre como conviver em sociedade - ja que seria impossível evitá-la, como se relacionar com os outros e, ainda além, como deveria ser a vida de um homem feliz.


Minha pretensão aqui não é esgotar essa obra, tampouco o pensamento do grande Schopenhauer, conhecido por seu mau humor e por comprar ingressos para duas pessoas aonde quer que fosse, somente para não ter o desprazer de ver alguém sentar-se a seu lado em alguma apresentação. Schopenhauer, no entanto, é mais que mau humor, é mais que pessimismo.


Como se pode perceber pela frase que escolhi para iniciar esse artigo, Schopenhauer não tinha muita fé no ser humano; considera-se , ele mesmo, como um ser genial, diferente dos outros a quem pouca ou nenhuma consideração deveria devotar. Também é de Schopenhauer a inspiração de uma frase que nós conhecemos bem, do senso comum: "Quanto mais conheço os homens, mais admiro meu cachorro".


Eu pergunto agora: Será que ele não está certo? Vejamos, claro que existe bondade e há quem diga - poetas e etc - a felicidade até existe, o amor, então...artigo por demais popular. Mas, e a sinceridade? E a gratidão?


Certamente aí temos um caso a se pensar: quanto mais nos damos, menos recebemos, quisera eu dizer o contrário ou quisera eu estar enganada. A Quem discorda e acha essa declaração completamente pessimista, dou um conselho: Tente ser bom, bom, assim, na acepção própria do termo, sem maldades, sem interesses levianos, sem pensar em vantagens de antemão. Faça o bem.


Exercício número dois: Perceba o que você receberá de volta. Algumas almas, certamente perceberão: "mas que pessoa boa". Porém, a maioria das reações a seus gestos nobres podem se resumir a uma palavra: Exploração.


As pessoas, em sua grande maioria, pensarão: De onde sai isto, poderá sair mais. O que se ver a seguir é uma criatura ser explorada até o seu âmago, até sua alma, por terceiros que visam algum tipo de vantagem.






É, Schopenhauer não estava errado, o homem é mesquinho, egoísta, vaidoso, repleto de vícios e que, ainda assim, colecionam de bom grado. Porém, como fugir dessa luta louca em que nos envolvemos no intervalo de nossa não-existência para nossa morte? Não há fuga possível, o que nos resta, portanto, é aprender, aprender com a experiência - isso é de Schopenhauer - porque só esta poderá salvar de interesses escusos, de explorações, de ingratidões. O grande filósofo não estava errado em nos dizer não esperar grande coisa dos nossos semelhantes.





Aí eu lembro de Millor, o nosso Millor..." Amar o meu semelhante? Sim, mas, aonde ele está?"





Por isso, aprendamos todos a lidar com esse mundo, com a mesquinharia, com a exploração e com tudo o mais que nos faz humanos , demasiadamente humanos. Conselho? Ouça Schopenhauer: Não vá esperando grande coisa, assim, a fortuna que receber será considerada uma grata surpresa.