segunda-feira, abril 07, 2008

Woody Allen - neurótico ou perverso?



Woody Allen, sem dúvidas, é um dos maiores escritores americanos da atualidade. Quando se fala em Allen, não raramente se pensa num dia de inverno, casacos marrons e personagens neuróticos vivendo em Manhattan.

Gosto de Allen porque ele conseguiu, além de sublimar ( transformar seu sintoma em arte ) fazer sucesso com suas próprias neuroses. Isso eu chamo de pagar a conta do analista, só que, ao contrário de Cazuza, Woody quis saber quem ele era e transpôs isto para a folha de papel, para as telas de cinema.

Certamente a soma despendida pulando de divã para divã assegurou a Allen um patrimônio bastante razoável, diria eu mais que milionário, e , veja você, apenas sublimando, trazendo à tona todos os seus recalques em relação à religião, à sexualidade, à cultura, enfim e transformando isso em algo palatável, digerível e até recomendável.

Em "Adultérios", uma coleção de três peças em que a infidelidade é o tema central, Allen mostra todo o humor sarcástico comum somente àqueles que , de alguma forma, sente-se ou são marginalizados por um grupo, por uma maioria, por assim dizer.

Se pararmos para analisar Allen, o que vemos? um sujeito franzino, provavelmente motivo de chacota na escola, raquítico, baixo, muito feio. Esta aí então a "causa secreta"! o velho Alfred Adler tinha razão: era preciso compensar, em algum momento, tanta inaptidão para a beleza, tanta incompetência para se tornar popular.

Allen não nasceu para ser maioria nem muito menos para unanimidade, resultado, cachotas, timidez, introversão e junto a estes todos os outros ingredientes capazes de transformar um sujeito num verdadeiro neurótico. Prato cheio para analistas, sorte dos cinéfilos.

Todas as três estórias de "Adultérios" trazem personagens perturbados psicologicamente mas que, ao mesmo tempo em que são descompensados, possuem consciência da maioria de seus problemas e são familiarizados com o discurso psicológico-psicanalítico que se ouve, ou melhor, se fala em todo divã nova-iorquino.

Muita neurose e perversões aqui e acolá. São termos apropriados para definir "Adultérios". De personagens bipolares à personagens psicóticos, Allen traz toda uma fauna psicanálitica repleta de mulheres fálicas, histéricos , dominadores e masoquistas, em meio a tudo isso, apimente-se com um quê de vulgaridade sofisticada, geralmente imaginada e consumada ao som de Jazz, entremeada por comentários elegantes e irônicos acerca da situação política atual. Isto é Allen, o Allen que trouxe o divã para o set de filmagens e transformou seus sintomas mais inconfessáveis em obras de arte.

Vá lá, nem todos consideram o cinema de Allen uma grande coisa, mas eu falo pela importância de um "Noivo neurótico, noiva nervosa" , "Annie Hall", entre outros na história do cinema. Há quem ache os diálogos monótonos e sem graça, há os que acham que é doentio demais. No entanto, há que se concordar que Allen talvez seja o paciente mais bem sucedido da Psicanálise , pois, provavelmente não alcançou a cura (palavra que não deve ser pronunciada JAMAIS na frente de qualquer analista, por favor) mas logrou êxito em levar para a tela todos os seus recalques e , especialmente, fazer-nos ver que todos, sem exceção, somos neuróticos, assim dizia Freud.


Allen, queira você ou não, é um sucesso, sublima seus traumas e faz dinheiro na indústria cinematográgica, porém, como todo estudante de Psicologia sabe, a sublimação não traz satisfação total, visto ser apenas uma substituição mais "palatável" de um desejo que , em sua essência, não pôde ser realizado.

Assim, mesmo publicando, escrevendo e rodando filmes, Allen, como todo neurótico, sempre deixa para si aquela cotinha de neurose que não pôde ser sublimada...e ainda bem que nem tudo está nos filmes.

O problema não está aí, na verdade, o problema começa quando se percebe que a perversão - sintomatologia mais contemporânea - vem tomando o lugar do velho neurótico às voltas com a religião, a própria sexualidade e a pátria. Vide "Matchpoint", um filme de um Allen não mais novaiorquino, mas londrino, não tão neurótico, mas perverso. Crimes e passagem ao ato ao invés do discurso do cão atrás do próprio rabo.

Resta saber se o novo Allen perverso e criminoso compete com o velho Allen, fã de jazz e neurótico. Para tirar a dúvida basta ir ao cinema: Se as pessoas estiverem acordadas, isso quer dizer que não há mais espaço para nenhum neurótico se lamuriar nas telas dos cinemas desse vasto mundo que até ontém era só traumático, castrador.

Hoje negamos a castração, vamos ao cinema para rir, evitamos a dor, e é claro, basta de problemas, ninguém está interessado em saber porque diabos fulano não consegue se relacionar com nenhuma mulher que não sua mãe, tampouco estamos interessados em fixações orais, em complexos edípicos (não tão diretamente, friza-se).

Que Édipo que nada, eu quero ver é o circo pegar fogo e a perversão dar sinal!