sexta-feira, janeiro 18, 2008

Por que não arruma um emprego de verdade?

Quero fazer desse lugar uma apologia à pesquisa, seja ela qual for, seja você um estudioso em algas marinhas ou em glândulas cebáceas, o que é importante que você, pensador solitário, errante no caminho das metodologias da vida, consegue abstrair seu pensamento para ir além.
Falo com esse entusiasmo porque admiro aqueles que se dedicam pacientemente a estudar uma verminose ou a conhecer todos os efeitos produzidos pela mordida de uma jararaca, sabendo seus mais curiosos hábitos e o porque de tal mordida ter tal sintoma ou outro.
Quando se fala em pesquisa no Brasil muita gente torce o nariz, outras aplaudem, mas, na verdade, o que se sabe é que aquele que pensa é porcamente recompensado pelos préstimos que oferece à nação. Não quero dizer com isso que seja o trabalho mais importante do mundo, imprescindível, mas o único que permite a circulação e a produão do conhecimento.
Caso não o fosse, não se teria chegado ao coquetel de drogas oferecido aos portadores do HIV, não se ouviria falar do projeto Genoma, tampouco se saberia aonde se localiza o hipotálamo e o que acontece quando este sofre uma lesão.
Tudo bem, vá lá, vendo a situação por esse ângulo nota-se que há uma certa valorização pelo conhecimento adquirido através da atividade da pesquisa, mas, e os outros tipos de pesquisa, as não tão palpáveis, aquelas mesmas que são consideradas por muitos como “perda de tempo” ou “falta do que fazer”?
Sim, me sinto uma dessas. Apesar de saber que o que estudo é de suma importância para a compreensão dos relacionamentos entre homens e mulheres, para se entender a lógica feminina e o porquê de tantos embates e tantas polêmicas, sobretudo para se concluir que o mundo, de fato, hoje, é feminino.
Importância. Palavrinha escorregadia. Importância para quem? Como qualquer pesquisadora, eu poderia dizer que é de suma importância para mim, uma vez que já dedico 4 dos meus últimos anos debruçada sobre a temática e que, portanto, é impossível que não seja o mínimo instigadora para mim.
Claro, para mim é, pra você pode não ser, mas o que quero dizer é, esquecendo do meu caso particular, que a pesquisa faz o conhecimento saltar das páginas, tal como o bom livro, lembra? A pesquisa faz o pesquisador, autoriza o aluno e empolga o professor, em suma, a pesquisa mobiliza os pensadores e cria pensadores.
É uma pena que nós, aqueles devotados ao estudo de artigos científicos, freqüentadores assíduos das bases de periódicos Scielo e cia, pessoas que fazem de tudo por um ponto no famigerado Curriculum Lattes não possam contar com uma remuneração mais justa por simplesmente pensar e fazer (futuramente) pensar os nossos alunos.
Passamos boa parte de nossas vidas dedicados à obtenção de títulos, a publicações em revistas científicas, para chegarmos um dia a sermos considerados “professores”, professores mestres, professores doutores.
Para quê? Seria ridículo eu dizer que apenas seria em nome do compromisso que firmei com a nação uma vez que resolvi fazer circular o conhecimento, não, é utópico e presunçoso demais, o conhecimento não vai começar a circular ou mesmo circular melhor porque eu decidi ser pesquisadora. Acho mesmo que vai muito ego nisso tudo.
Muito simples essa questão de ego, enquanto uns o enaltece malhando o corpo, outros enaltecem colecionando namorados, e outros, bem, outros o enaltecem estudando para um dia chegarem a uma sala de aula e serem tratados como carrascos ou desagradarem meio mundo.
O pior de tudo: a recompensa. No Brasil, um professor doutor pode ganhar, no máximo, se tiver muita sorte, uns sete mil reais. Já um promotor, desembargador ou juiz pode ganhar o dobro, triplo, não entendo nada da esfera judicial.
Não quero com isso desmerecer o serviço dos juristas, dos advogados que tanto ego possuem e, além de tudo, são pagos para enaltecê-lo e mais, de brinde: porte de armas pra ameaçar geral e bradar alto mesmo quem manda aqui.
Ok, ressalvas à parte. O fato é que professores doutores não são reconhecidos nem um pouco e isso me deixa um tanto triste, porém, não desmotivada, visto que, alguém deve fazer o trabalho sujo.
Feito aqui o desabafo, reitero, nosso trabalho é útil sim, e mesmo que o conhecimento não ultrapasse todas as barreiras, malmente figura no Lattes de alguém, que nossas palestras estejam sempre vazias e levemos sempre para casa a voz perseguidora dos orientadores em nossa cabeça, o trabalho sujo vale a pena, enaltece e enriquece intelectualmente.
Fale você de serpentes, de coqueiros ou de mulheres, o trabalho intelectual é importante, sobretudo quando se tem amor pelo que se pesquisa e se consegue transmiti-lo da melhor forma possível para outras pessoas. O conhecimento então circula, e abunda, fertiliza.
Dedico esse texto a todos os mestrandos da Unisinos, que, por hora, encontram-se como eu, atordoados entre os prazos e a ansiedade da defesa da dissertação que, se não for a melhor produção de sua vida, é , neste momento, o ápice da sua vida.
Para todos desejo sorte, a mesma que desejo a mim mesma e que nossos caminhos não sejam jamais cruzados por alguns seres acéfalos, animais ruminantes ou qualquer ignorante que nos faça a terrível pergunta: “Vem cá, por que tu estuda isso? Por que não vai arrumar um emprego de verdade?”