quarta-feira, maio 07, 2008

O sujeito do inconsciente, a Ciência e a ignorância - Dá para juntá-los?


Em seu recente livro de artigos acerca da clínica psicanalítica contemporânea, Charles Melman aponta para uma questão que há muito foi trazida por Lacan. O que fazer com a dimensão do sujeito na Ciência?

Se toda ciência, como a conhecemos, pressupõe um sujeito cartesiano, há lugar para um sujeito do inconsciente? Acredito que "não" é uma resposta definitiva demais, acabada demais, logo, devemos desconfiar desta.

O sujeito na ciência cartesiana é aquele que metrifica, que quantifica, empírico por excelência: Vou fazer isso porque por A + B o resultado seria simetricamente quantificado como C. Não há lugar, portanto, para o inesperado, para o incalculável e nem para nada que exclua o palpável. No entanto, debates atuais acerca da "Fisica Quântica", questionamentos a partir de livros como "O segredo" e filmes como "Quem somos nós?" nos fazem compreender que há algo para além da metrificação e do cogito cartesiano: há um sujeito, por assim dizer, por trás de cada tabela, por trás de cada quantificação.

Este é o sujeito do qual fala a Psicanálise. Toda a "ciência" psicanalítica (coloco entre aspas porque não sei se a Psicanálise cabe na Ciência , assim como desconfio que a Ciência, como a conhecemos, não esteja adequada ao método freudiano) procura entender o discurso desse sujeito que sobra, que transborda no discurso científico, um sujeito, diria eu, que surpreende , estando em lugares os quais não imaginamos.

Tarefa árdua esta daquele que se dedica ao estudo da psicanálise: Buscar o discurso do sujeito nos locais mais inusitados. É isto. Parece uma boa definição: buscar o sujeito que pensa , exatamente aonde este não sabe pensar, não era isso que dizia Lacan? "Sou aonde não me penso"?

É o contraponto do sujeito cartesiano que buscamos, que incitamos, que promovemos. Acho que a palavra é essa, sem tirar nem por: Promovemos o inusitado do sujeito do inconsciente. A impressão que temos é que este está aí, perambulando, damos voz a este, na análise, damos ouvidos também (para os analistas). E a ciência? O que fazer com ela?

Aí está o calcanhar de Aquiles de Freud: A ciência e a pesquisa embasada em Psicanálise parecem algo difícil de lidar; como esmiuçar o sujeito , meté-lo uma metodologia, transformá-lo em artigo, em tese? Ele não pensa aonde não se espera? Então, parece, no mínimo, complicado meter uns ares cartesianos, de seriedade, num sujeito tão fluido e tão serelepe como este que vive nos porões aos quais damos o nome de inconsciente.


Ah , tão bela seria a vida se não viesse aquele neurologista austríaco falar de inconsciente, de coisas que jamais deveríamos supor existir dentro de nós! Seria tão mais fácil sermos as belas almas de Hegel! A ignorância é uma dádiva.


Porém, uma vez entrando nesses meandros, difícil se faz abandoná-los. Aí acaba a inocência: o sujeito do inconsciente reina, sem fazer alarde, calado, quase sem fazer barulho (ai de nós! Não sabemos o barulho imenso que este faz ali do canto dele, quase ignorado - quase) até mesmo quando desejamos que a Ciência e o sujeito do pensar (e apenas ele) reine.


Eu não sei se hoje, com a consciência (hehehe) que tenho se sou verdadeiramente orgulhosa de caminhar tanto por entre os "vales sombrios inconscientes". Acaba que todo aquele que o faz, inexplicavelmente, tem a tendência de achar pêlo em ovo e chifre em cabeça de cavalo. No entanto, não me cabe lamentar, apenas me enveredei, uma vez seguindo este rumo, difícil se faz alterá-lo, mudar de direção. E a Psicanálise será sempre o meu amor genuíno e o inconsciente a minha paixão duradoura.


A ignorância pode ser uma dádiva, mas prefiro o Acheronte.

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