segunda-feira, abril 20, 2009

Feminices e algo mais


" Eu só conheço mulher louca. Pense em qualquer uma que você conhece e me diga se ela não tem ao menos três destas qualificações: exagerada, dramática, verborrágica, maníaca, fantasiosa, apaixonada, delirante. Pois então, também é louca. E fascinante"


Martha Medeiros


Este é um trecho da crônica Doidas e Santas, do livro homônimo de Martha Medeiros. Engraçado. Eu sei que muitos nem conhecem Martha, nunca viram seus livros nas pratileiras de livrarias, a não ser agora que a globo filmes lançou Divã. Bem, irrelevâncias à parte, vou lhes dar bons motivos para conhecer melhor esta autora gaúcha que, se não é imortal, ao menos muito aprendeu com alguns deles, como Machado de Assis, por exemplo.

Os motivos para ler Martha são muitos e eu não serei presunçosa aqui de dizer que pretendo esgotá-los, tampouco pretendo convencer os mais céticos, os ditos "amantes da boa literatura".


Ora, o que faz uma literatura ser enquadrada na classse superior da " boa literatura"? Certamente alguns dirão que o conteúdo da obra - sem dúvida, isto é mais que essencial quando se pretende passar algumas horas virando páginas: é essencial que estas páginas valham o esforço muscular compreendido no virar das folhas. Outros, entretanto, dirão que uma boa literatura é feita de autores renomados. Não concordo. Há muitos desconhecidos que fazem boa literatura no quintal da casa deles, sem editora nem nada, e , mesmo assim, são ótima literatura.

Martha para mim é boa literatura. Mesmo que não entenda de psicanálise, isto ela até diz com todas as letras. Martha é boa naquilo em que todas nós, mulheres, achamos ser boas ou nos declaramos péssimas: ser mãe, ser esposa, namorada, mulher, profissional...e haja autocrítica!

É aquela coisa chamada "intuição". Alguns a reduzem e chamam de "intuição feminina". Eu , não querendo agradar nem a gregos nem a troianos, não digo "intuição" e também não particularizo com "intuição feminina".

Martha é boa em feminices. em Doidas e Santas (L & PM, 2009), o leitor vai se deparar com um compêndio de 100 crônicas que a autora publicou nos dois mais renomados jornais diários de Porto Alegre. Martha falará da necessidade imperativa de toda mulher em viver até a "última gota", de fazer todo o trajeto valer a pena, dedicando-se ao amor, às artes e em especial, a vida, em seu mistério.

Tudo bem, você pode pensar que muito já foi dito sobre o tema. Eu até concordo, afinal, feminices não é um tema nada original, no entanto, o que há em Martha de especial? Acredito que Martha tem uma sensibilidade aguçada capaz de fazer a leitora ( e agora me dirijo a elas) pensar: " - Mas é bem assim!". E isso é muita coisa.


Tal como Divã, estas crônicas de Martha, escritas no período compreendido entre 2005 e 2008, nos abrem os olhos sobre as pequenas artimanhas de ser mulher, sem , entretanto, incorrer em feminismos, em uma diferenciação que beira o radicalismo. Pelo contrário, homens também sentem suas masculinices, e como sentem! Porque todos temos nossas questões, e, o que Martha faz é falar direto a alma , ao coração, ao cérebro, enfim, ao órgão que você eleger, de quem busca um livro, assim, sem pretensão, esses que só são adquiridos para cumprir o dever com o hábito da leitura, assim, descompromissada.


Porém, que engano! São nas leituras que encontramos menos pretensão que podemos adquirir as maiores lições. Claro, existem exceções e digo mesmo que há muito livro de bolso por aí que não vale o bolso que lhe abriga. No caso de Doidas e Santas, o leitor e a leitora - aqui vamos dar vivas à igualdade entre os sexos - encontrarão uma grata surpresa de aprender, de se deixar tocar pela visão mezzo-irônica, mezzo-cética de Martha, que, afinal, deve existir em cada um que se presta a ler.


Doidas e Santas , apesar de tratar , em grande parte, de feminices, não se limita a elas, pois é, sobretudo, um livro sobre como lidar com o mistério da vida, esta que nós é dada de graça e que, nem por isso, deve ser vivida sem alguma responsabilidade.

Isso para mim já é motivo suficiente para fazer do livro de Martha uma boa literatura, ou não é a boa literatura aquela que , mesmo falando de outros, continua falando como se diretamente a nós?

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