quarta-feira, fevereiro 02, 2011

O vento e a mesma vidraça


A multidão costuma dizer que de amargo, já basta a vida e que melhor adoçante não há além de uma boa poesia, aquela capaz de consolar a todos e revelar pela milésima vez o mistério que teimamos em esquecer: a vida e sua beleza.

É disso que vivem os poetas. Aqui vai uma dessas que costumar tornar tudo tão mais doce:



Ar noturno (1919)



Tenho muito medo
destas folhas mortas
e medo dos prados
cheios de rocio

Vou adormecer;
se não me despertas
ao teu lado
deixo meu coração frio.


Que é isso que soa
tão longe?
Amor. O vento nas vidraças,
meu amor!

Eu te pus colares
com gemas de aurora.
Porque me abandonas

por este caminho?

Se vais muito longe,

meu pássaro chora
e o vento vinhedo

não dará seu vinho.

Que é isso que soa tão longe?
Amor. O vento nas vidraças, meu amor!

Não acabarás nunca,
esfinge de neve,
o muito que eu te houvera querido
essas madrugadas quando chove tanto
e no ramo seco se desfaz o ninho.

Que é isso que soa
tão longe?
Amor. O vento nas vidraças,
meu amor!


Federico García Lorca

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